Com regulamentação, valor que você paga à Uber e 99 vai financiar o transporte público e a bicicleta. O que você acha disso?
Não se sabe quanto seria esse valor, mas com certeza ele será alto devido à arrecadação das plataformas
Quando e se a regulamentação dos aplicativos de transporte privado individual de passageiros for colocada em prática no Recife, quem ganhará é a cidade. Pelo menos é o que promete a gestão municipal. Isso porque a arrecadação com possíveis multas e a taxa a ser paga pelas plataformas como Uber, 99 e InDrive pelo uso do sistema viário da capital, por exemplo, será destinada a investimentos no transporte público coletivo e na mobilidade ativa - bicicletas e caminhada. Irá para o Fundo de Gestão do Trânsito e Transporte Urbano - FGTTU, que, segundo garantiu a Autarquia de Trânsito e Transporte Urbano do Recife (CTTU), será aplicado em infraestrutura para esses modais.
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Pela Lei Municipal 18.528/2018, aprovada pela Câmara Municipal e sancionada pelo então prefeito Geraldo Julio (PSB), as plataformas serão taxadas pelo uso do sistema viário - no caso do Recife, de até 2% da arrecadação das empresas. Esse percentual oscila de acordo com a quantidade de motoristas parceiros cadastrados. Até 10 mil veículos, a taxa cobrada é de 1%. Entre 10 mil e 20 mil veículos, sobe para 1,5%. E acima de 20 mil chega a 2%. E essas taxas são computadas para o Recife, independentemente do domicílio do cadastramento do condutor. “Nós entendemos que a regulamentação é necessária e o município está recorrendo da decisão judicial que proibiu o processo. Mas quando isso for resolvido, os recursos do Fundo Municipal de Gestão do Trânsito e Transporte Urbano serão usados para a mobilidade das pessoas, como é marca da nossa gestão. Investiremos na mobilidade ativa e em Faixas Azuis para o transporte público”, garantiu a presidente da CTTU, Taciana Ferreira.
Não se sabe quanto seria esse valor, mas com certeza ele será alto devido à arrecadação das plataformas. Para se ter ideia, na cidade de São José dos Campos, em São Paulo, uma única plataforma de transporte privado individual de passageiros arrecadou, em um mês, a mesma quantia das três empresas de ônibus juntas.
Veja o trecho da Lei Municipal 18.528/2018 que fala da taxação:
Art. 5º Pela utilização intensiva da infraestrutura viária do Município do Recife para exploração econômica da atividade de Transporte Remunerado Privado Individual de Passageiros - TRPIP será cobrado percentual correspondente ao valor pago por cada deslocamento (viagem) iniciado no território municipal, de forma graduada de acordo com o número de veículos cadastrados em cada Operadora, na plataforma de comunicação em rede, na forma abaixo:
De 01 a 10.000 veículos cadastrados - 1%
De 10.001 a 20.000 veículos cadastrados - 1,5%
Acima de 20.000 veículos cadastrados - 2,0%
§ 1º A cobrança de que trata o caput se dará independentemente do domicílio do cadastramento do condutor.
§ 2º A responsabilidade pelo recolhimento dos valores devidos na forma prevista neste artigo é da operadora credenciada.
Art. 6º Os valores decorrentes da cobrança de que trata o art. 5º, multas e demais encargos constituirão receitas destinadas ao Fundo de Gestão do Trânsito e Transporte Urbano - FGTTU previsto na Lei Municipal nº 18.438/2017.
Parágrafo único. Para possibilitar o controle e a fiscalização a operadora disponibilizará ao Município, em sua plataforma digital, todos os dados e valores sobre cada deslocamento realizado, ressalvando o sigilo previsto na Lei nº 12.965/2014.
CONFIRA TODA A LEI MUNICIPAL 18.528/2018
REGRAS NO PAÍS
Todas as leis municipais criadas para regulamentar o serviço dos apps preveem a taxação das plataformas pelo uso do sistema viário. Em algumas cidades, inclusive, esse recurso já tem rubrica para ser utilizado a favor da mobilidade ativa (bicicleta e caminhada) e do transporte público coletivo - que deveriam receber uma atenção devida dos gestores públicos, já que respondem por até 85% dos deslocamentos urbanos.
Fortaleza, capital do Ceará, mais uma vez se destaca. Prevê que a plataforma pode optar por pagar o percentual - que na cidade é de 1% sobre cada viagem - ou executar ações mitigadoras revertidas para implantação de faixas exclusivas de ônibus, calçadas e ciclofaixas.
Confira as regras:
Taxação e investimentos em mobilidade
As empresas terão de cumprir certas contrapartidas como o pagamento de 1% do valor de cada viagem à prefeitura e a prestação de várias medidas mitigatórias de acordo com o número de veículos cadastrados na plataforma.
Entre elas, a implantação de 1 km de faixa exclusiva de ônibus por ano a cada 200 carros cadastrados, construção de 1.000 metros quadrados de calçada por ano e a implantação de 1 km de ciclofaixa por ano a cada 200 carros cadastrados. No caso de não serem cumpridas as medidas mitigatórias, as viagens serão taxadas com um preço público de 2% do total do valor.
REGULAMENTAÇÃO TRAVADA
Pelo menos no Recife, a fiscalização dos aplicativos de transporte remunerado individual de passageiros deveria estar acontecendo desde 2018, quando a Lei Municipal 18.528/2018 foi aprovada pela Câmara Municipal e sancionada pelo então prefeito Geraldo Julio. Não está vigorando devido a uma decisão judicial conquistada pela empresa 99. A Prefeitura do Recife vem tentando revertê-la porque impede o início da fiscalização dos aplicativos e entrou, ainda em junho, com recurso questionando a decisão da Justiça estadual que proibiu a Autarquia de Trânsito e Transporte Urbano do Recife (CTTU) de fiscalizar a empresa 99 e, assim, consequentemente, beneficiar as outras empresas que operam na capital.
O embargo declaratório, instrumento que questiona a decisão do juiz da 4° Vara da Fazenda Pública da Capital, Djalma Andrelino Nogueira Júnior - quem concedeu a liminar à 99 - foi negado. Agora, o município entrará com apelação para tentar modificar a sentença e aguarda o julgamento do recurso.
A 99 conseguiu uma liminar ainda em 2020 e teve a decisão confirmada em abril de 2021 pela 4ª Vara da Fazenda Pública da Capital. A decisão provisória foi dada pelo juiz às vésperas do Carnaval 2020. Assim como até hoje, a 99 não havia se cadastrado na CTTU e poderia ter problemas com a fiscalização.
Na decisão, o magistrado proibiu a CTTU de exigir credenciamento da 99 e dos motoristas cadastrados no aplicativo para atuação na cidade e de impor qualquer tipo de obstáculo, penalidade ou sanção à empresa e aos motoristas-parceiros durante o Carnaval. E ainda determinou multa diária de R$ 30 mil no caso de descumprimento da decisão. Em abril deste ano, ao proferir a sentença, a 4ª Vara manteve a lógica anterior.
Entendeu que a exigência de prévio credenciamento e compartilhamento de dados excedem a competência municipal. E que as questões relativas à eventual violação do direito usuário/consumidor já são objeto do Código Civil ou do Código de Defesa do Consumidor. “E a exigência quanto à regularidade dos veículos é de responsabilidade do condutor/proprietário”, diz a sentença.
E seguiu afirmando que nem mesmo a taxa pelo uso do sistema viário - que algumas cidades do País começam a usar para ampliar a infraestrutura para bicicletas ou financiar o transporte público coletivo - deve ser cobrada. “Também descabem as exigências de preço público, seja por desbordar da competência legislativa municipal, seja porque não há prestação de serviço de interesse público envolvido. A mesma sorte ocorre com a exigência de fixação de tarifa, também fora da competência municipal e contrária ao modelo de negócio de intermediação de transporte privado, cujo preço depende das condições de momento do mercado, configurando violação à livre iniciativa."
Em abril, diante da confirmação da sentença da 4ª Vara da Fazenda Pública da Capital, a Prefeitura do Recife confirmou estar de mãos atadas porque seria de difícil operacionalização fiscalizar os motoristas das empresas cadastradas e deixar de fora os da 99. “Momentaneamente, devido a questionamentos sobre o processo na esfera judicial, a fiscalização não pode ser colocada em prática, pois existe uma ação da empresa 99, cujo processo está em tramitação na Justiça. Com relação à cobrança da taxa pelo uso do sistema viário, a mesma não está sendo feita devido à indefinição judicial sobre o processo de regulamentação”, diz o posicionamento oficial da CTTU.