O Metrô do Recife, mesmo sendo um sistema gerido pelo governo federal, continua representando um dos desafios da gestão Raquel Lyra (PSDB) no governo de Pernambuco. Muito pouco se avançou em relação à recuperação do sistema, que só definhou em 2023. E que entra em 2024 sem garantias, apenas expectativas.
Gestos políticos e administrativos foram feitos, é fato, mas na prática nada mudou para o Metrô do Recife e seus passageiros, cada dia mais fugitivos devido aos intervalos de 20 minutos mesmo nos horários de pico - desproporcionais para um metrô urbano -, uma tarifa cara para a população (R$ 4,25) e trens quentes e lotados. É tanto que o metrô perdeu praticamente 50% de sua demanda desde a pandemia de covid-19, saindo de quase 400 mil para 180 mil passageiros diários.
Raquel Lyra fez promessas ainda na campanha de que iria agir para recuperar o metrô, fundamental para o Sistema de Transporte Público de Passageiros da Região Metropolitana do Recife (STPP/RMR). De fato, passou o ano de 2023 conversando com o governo federal e até incluiu um projeto de reestruturação da infraestrutura do metrô no valor de R$ 136 milhões no PAC Seleções.
Também já afirmou que irá, sim, após um investimento federal no sistema, estadualizá-lo e analisar uma possível concessão pública. Mas, na prática, o metrô passou 2023 mendigando orçamento até para o custeio básico da operação e, como informado pela atual superintendente do metrô, Marcela Campos, tem conseguido operar as duas linhas elétricas (Centro e Sul) porque a demanda reduziu.
Caso contrário, a quantidade de trens não daria conta. Sem investimentos, o metrô tem operado com apenas 16 trens (10 na Centro e 6 na Sul). O empenho pessoal e a habilidade técnica do quadro de funcionários do metrô, que já chegou a fazer cotas financeiras para comprar peças e garantir a operação dos trens, também têm sido fundamentais.
METRÔ DO RECIFE PRECISA DE R$ 2 BILHÕES PARA SE RECUPERAR
O desafio para recuperar o Metrô do Recife é enorme, mas, em termos financeiros, é menor do que o valor do investimento público estimado no projeto de concessão pública elaborado pela gestão passada do governo federal, via BNDES, com previsão de investimento público de R$ 3,8 bilhões.
Segundo Marcela Campos, o plano de reestruturação do sistema realizado pela equipe técnica do metrô prevê um investimento de R$ 1,7 bilhão. Esse valor recuperaria a rede elétrica e seria executado em quatro anos, entre 2024 e 2028.
Além disso, os quase R$ 2 bilhões seriam divididos em duas frentes: “R$ 866 milhões para tirar o sistema do sufoco, com investimentos na via permanente, recuperação da frota de trens comprada há 16 anos e que opera hoje, dando sobrevida com manutenção, recuperação das edificações (infraestrutura das estações) e da rede aérea”, explica Marcela Campos.
A segunda frente seria no valor de R$ 900 milhões e usada para a compra de uma nova frota de 23 trens para substituir os mais antigos (Santa Matilde), com 40 anos de operação. “Começaríamos a recuperação em 2024 e seguiríamos até 2028. Mas é fundamental que no próximo ano tenhamos R$ 245 milhões para iniciar o plano de investimentos de quatro anos e a definição com o start da compra dos novos trens, porque são equipamentos que levam pelo menos 24 meses para serem fabricados” alerta a superintendente.
PERSPECTIVAS PARA O METRÔ DO RECIFE
O Metrô do Recife, entretanto, ainda não tem nenhuma garantia de investimentos e até mesmo de orçamento para custeio. Tudo depende da aprovação do orçamento 2024, que só deverá acontecer em março de 2024.
“Temos nos articulado com diversos atores e tido muitos apoios, principalmente políticos. Conversamos com o governo de Pernambuco para a inclusão do projeto no PAC das Seleções, recebemos a frente parlamentar em visita ao sistema e, via administração central da CBTU, tivemos conversas frequentes com o Ministério das Cidades. Todos sabem da situação de urgência do Metrô do Recife”, garante Marcela Campos.
CUSTEIO DO SISTEMA AINDA SEM GARANTIAS
A mesma situação de indefinição cerca os valores referentes ao custeio do Metrô do Recife para 2024, ou seja, os recursos para garantir a operação básica anual do sistema.
Para o próximo ano, a superintendência diz que deverá pedir os mesmos R$ 300 milhões de 2023, mas com a expectativa de que o contigenciamento seja menor. O metrô vem perdendo 50% do orçamento de custeio anual.
Em 2023, começou recebendo R$ 120 milhões dos R$ 300 milhões pedidos, o que representou apenas 30% do orçamento. Durante o ano, conseguiu fechar os R$ 150 milhões.
“Nossa sorte é o comprometimento do corpo técnico, que faz milagres. É fundamental destacar isso. Temos reuniões de monitoramento semanalmente e estamos operando porque há segurança para rodar. Mas temos diversas restrições operacionais, como de velocidade e de equipamentos, o que gera intervalos de 20 minutos, por exemplo. Mas o governo sabe da gravidade porque não omitimos”, garante Marcela Campos.
Segundo a superintendência, o corpo técnico do metrô está otimista em relação à liberação de recursos em 2024. “Apresentamos e vamos voltar a apresentar, também, nossos projetos de expansão do metrô no Grande Recife, como as ligações entre o Cabo de Santo Agostinho e o Porto de Suape, com 16 quilômetros, e o modelo de VLT no Centro do Recife, como o VLT Carioca, no Rio de Janeiro, que circularia entre o Porto do Recife e o Forte do Brum”, destaca.
METRÔ PRECISA SER INSERIDO NO PLANEJAMENTO DO GRANDE RECIFE
O engenheiro civil e presidente da Associação Brasileira de Engenheiros Civis de Pernambuco (Abenc-PE), Stênio Cuentro, avalia que a gestão Raquel Lyra deve eleger como prioridade na mobilidade urbana a revisão do planejamento de transporte, dando protagonismo ao transporte sobre trilhos na Região Metropolitana do Recife. Algo que o governo não conseguiu fazer em 2023. Sequer iniciou.
“O planejamento da RMR foi pensado e idealizado para o transporte por ônibus, preso a terminais integrados. Agora, 40 anos depois, esse planejamento precisa ser refeito. As grandes cidades não funcionam mais dessa forma. É preciso priorizar o transporte coletivo de maior capacidade, que é o metrô”, defende.
Stênio Cuentro não vai longe para exemplificar a eficiência do transporte público sobre trilhos. “São Paulo é um excelente exemplo. Tem o metrô como modal principal e os ônibus como alimentadores, usando vias exclusivas”, exemplifica.