Celebrado nesta quarta-feira (29), o Dia Internacional da Dança acontece este ano sob um cenário de adversidade. Com o isolamento social provocado pela pandemia do novo coronavírus, artistas da área têm buscado soluções para enfrentar esse momento conturbado, que, com a paralisação das atividades, reforça as dificuldades históricas da área, como a falta de incentivo e de ações a longo prazo.
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Terreno fértil para a dança, Pernambuco é um dos estados culturalmente mais ricos do Brasil. Apesar dessa efervescência, alguns problemas crônicos criam entraves para que os artistas da área (e da cultura em geral) consigam desenvolver seus projetos e, principalmente, ter segurança para desenvolver seus projetos.
“Antes mesmo da pandemia, a dificuldade de ser artista em Pernambuco é sempre estar fazendo muita coisa e tendo pouco retorno financeiro, que é o que torna a vida possível no mundo capitalista que a gente construiu. Para conseguir ter visibilidade, não posso ficar só na dança; tenho que circular também no teatro, na música”, aponta o bailarino Orun Santana. “Sou professor e artista, mas minha principal fonte de renda é dar aula. É difícil se manter só como artista.”
Filho de artistas, referências no Daruê Malungo, instituição localizada em Chão de Estrelas, o artista aponta que a dança é um elemento essencial na sociedade e, como tal, precisa ser valorizada. Ele reforça a necessidade de pensar ações a longo prazo que possibilitem o desenvolvimento da cadeia produtiva.
“Há pouco espaços para a dança se inserir: os teatros estão sucateados e fora a UFPE, cada vez menos instituições são capazes de oferecer formação. Não há um plano de formação permanente na cidade. A gente não consegue ter uma estabilidade. Depois que a pessoa se forma faz o quê? Tem concurso para dança? É preciso criar esse ciclo de formação, fruição, com espaço cênico, direcionamento para professor. São vários desafios”, avalia.
Sua opinião é compartilhada por Alexsandra Carvalho, que mantém um espaço voltado para a dança na Rua da Aurora, no centro do Recife, e aponta os percalços enfrentados pelos artistas e alerta para o risco de fechamento de espaços alternativos.
“Muitos artistas se inscreveram no pedido do auxílio emergencial (que inclusive, em diversos casos ainda não foi pago). Estamos buscando ações individuais, coletivas, autônomas ou junto à partidos solidários à causa artística local, como é caso da Coletiva Juntas e o vereador Ivan Moraes (PSOL)”, pontua Alexsandra. “Quem faz gestão de espaço alternativo está dando aulas e cursos online. Cedendo descontos, fazendo pacotes, para possibilitar que as pessoas cheguem até nós e para seguir com quem estava. Estamos reinventando como professores e fazedores da Dança.”
A bailarina pernambucana Inaê Silva, que atualmente integra a Giro8 Cia de Dança, em Goiânia, conta que o grupo, que tinha circulações aprovadas no exterior e pelo estado de Goiás, precisou adaptar um dos editais para oferecer as atividades online. Ela aponta que, diante das previsões de que atividades culturais que reúnam um número expressivo de pessoas só voltem a acontecer a partir de setembro, é preciso fortalecer editais emergenciais.
“Nesse momento, decidi montar algumas turmas de dança e quero montar uma aula de experimentações poéticas do corpo, no lugar também de ressignificar a casa, como podemos dançar a casa, já que é o único lugar que a gente pode curtir agora”, explica. “A solução emergencial que alguns editais, como o Itaú, estão propondo, são interessantes para ajudar a gente nesse momento e pensar em criar trabalhos, obras, na estrutura que a gente tem da casa. O bailarino está precisando produzir, encarar os aplicativos, a escrita, para arranjar uma forma de sobreviver. É um período de muito aprendizado.”
Maria Paula Costa Rêgo, do Grupo Grial e assessora de Dança da Secult-PE, acredita que apesar das dificuldades, aos poucos a dança tem conseguido encontrar outros espaços junto ao poder público e reforça a importância da aproximação da sociedade civil na construção dessas propostas.
“É uma luta difícil, mas que vem ganhando espaços através do Festival de Inverno de Garanhuns, que vem apoiando ações de criação artística e pedagógica para além das apresentações; de participações da dança em projetos de outras linguagens (Outras Palavras e Festival de Cinema de Triunfo) e outras ações ainda por concretizar. O Prêmio Dança, por exemplo é uma demanda antiga, onde ficamos (eu e outras colegas anteriores a mim no cargo) alertas ao mínimo sinal de possibilidade”, afirma. “Chamo atenção para o delicado momento em que nossas organizações setoriais vêm passando (Setorial e Conselheiro de Dança) e o quanto é importante estarmos juntos na construção de uma demanda fortalecida por mais ações para a linguagem da Dança.”