Músicos pernambucanos lamentam a morte do colega Hugo Carranca

Baterista falecido nesta segunda-feira (17) devido a um câncer, deixou sua marca indelével na cena pernambucana
José Teles
Publicado em 18/08/2020 às 18:55
Hugo Carranca era dono de uma linguagem única no instrumento Foto: REPRODUÇÃO/FACEBOOK


As mídias sociais tanto podem ser um vetor por onde se destilam ódios, disseminam-se fake news, como também afeto, apreço e solidariedade. Foi o que aconteceu em relação ao músico pernambucano Hugo Carranca, falecido nessa segunda-feira (17), no Recife, aos 42 anos, em consequência de um câncer.

>> Morre, aos 42 anos, Hugo Carranca, baterista do cantor Otto

>> Velório do músico Hugo Carranca acontece no Palácio dos Governadores, em Olinda

Quando a doença recrudesceu, os amigos e parentes criaram uma vaquinha virtual (#RecuperaCarranca), a fim de bancar uma cirurgia em São Paulo. A mobilização espalhou-se pelas mídias sociais e o que foi arrecadado, num tempo de pandemia e grana curta, chegou perto da meta estabelecida.

O velório aconteceu durante a manhã desta terça-feira (18), no Palácio dos Governadores, atual sede da Prefeitura de Olinda, e o corpo seguiu para sepultamento no Cemitério do Guadalupe, no mesmo município. Os músicos que conviveram com Hugo Carranca estavam ainda perplexos.

Otto, em cuja banda Carranca tocava desde a década passada, ao comentar sobre a morte do amigo, expressou sua consternação na primeira frase: "Eu estou devastado. A Jambro Band é uma família, a gente está há muito tempo juntos. Como em toda família acontecem coisa boas e coisas duras. A passagem de Carranca pela banda foi bonita. Perdi dois amigos em três anos (referindo-se também ao músico Marcos Axé, falecido em 2018). Axé estava na banda há 20 anos, Carranca há uns doze. Um cara que alegrava a gente. Mas a música vai continuar, com a alegria de ter conhecido Carranca, que foi do Sheik Tosado, fruto do mangue. Um cara que sai de Olinda e vai para o mundo", diz Otto, sem conter as lágrimas.

Juliano Holanda, músico e compositor, conheceu Hugo Carranca na adolescência, mas só se aproximaram alguns anos depois, pela música. Participaram da banda que acompanhava Erasto Vasconcelos (falecido em 2016). Ele e Juliano tinham combinado de se encontrar em janeiro para um tributo a Erasto, mas o encontro não aconteceu: "Desde a banda de Erasto éramos muitos próximos, gravei com a Guardaloop, uma banda de que ele participava", comenta Juliano Holanda.

Para ele, Carranca vai fazer bastante falta à música pernambucana: "O cara tinha uma linguagem única no instrumento, o que você pode chamar hoje em dia de rítmica pernambucana moderna atual passa por Carranca. Um dos criadores que desenvolveram um tipo de sonoridade que temos como marca da música feita em Pernambuco, um músico muito importante para a nossa identidade".

"SALVE SIMPATIA"

A carreira de Hugo Carranca como músico profissional começou no fim dos anos 90, com a Sheik Tosado, um dos últimos grupos surgidos da cena mangue e também das últimas bandas a chegar numa gravadora do Sudeste, A Trama. No Sheik Tosado, Carranca tocava contrabaixo.

O músico e apresentador de TV, China, vocalista do grupo relembrou o amigo: "Eu e Carranca começamos a carreira juntos no Sheik Tosado, e mesmo depois do fim da banda nos encontramos várias vezes nos palcos. Um cara muito divertido, querido por todos, e que deixa sua marca em vários discos. Carranca conseguiu um feito que só os grandes músicos conseguem, que só de ouvir uma gravação você já sabe que é ele na bateria, um estilo inconfundível. É só ouvir as gravações do Sheik Tosado, Erasto Vasconcelos, Otto e diversos outros, que está lá a marca dele".

O apelido de Hugo Carranca bem que poderia ser "Salve Simpatia". Todos que falam sobre ele ressaltam o quanto ele foi querido, e como animava o ambiente onde tocava. Entre esses nomes está o de Lira (do Cordel do Fogo Encantado), com quem Carranca participou de turnês durantes dois anos, no Brasil e Europa: "Grande músico, muito seguro ritmicamente, e conhecedor das tradições percussivas de Pernambuco. E ele aplicava isso de uma forma espontânea e muito bem humorada. Mas o conteúdo artístico era da mais profunda seriedade".

No início do século 21, surgiram domingueiras musicais olindenses, com os músicos revezando-se, tocando rock e ritmos pernambucanos, uma síntese desta coisa foi o álbum Original Olinda Style, da Eddie (de 2003).

Claro que Hugo Carranca participava ativamente dessas rodas musicais. Fábio Trummer, da Eddie, se dizia ontem muito impactado, e confessava que ainda não tinha digerido a notícia: "Um tempo muito difícil. Acabei de perder um irmão, e agora um grande amigo e parceiro. Estou numa fase da vida em que a gente começa a perder. Já passamos do cume da montanha, agora é descida, e a gente começa a perder pessoas que estão ao nosso redor, é muito difícil. Fica o legado dele, a história, a musicalidade dele. Um amigo pra gente carregar com a gente até chegar nossa hora".

Hugo Carranca foi unanimidade, como é explícito na frase de hoje no perfil do Recupera Carranca no Instagram: "Todos os aplausos para Hugo Carranca".

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