As narrativas sobre a comunidade trans no audiovisual têm passado por um gradual processo de transformação, especialmente nos últimos anos. Essas mudanças passam, principalmente, pela ocupação de espaços, em frente ou por trás das câmeras, por artistas e criadores que imprimem nessas obras seus corpos e suas histórias, historicamente apagados pelo sistema excludente da cisgeneridade. Um bom exemplo dessa safra de produções que retratam a multiplicidade das experiências de pessoas trans é a série Manhãs de Setembro, produção original do Amazon Prime Video que estreia nesta sexta-feira (25).
A obra conta, em cinco episódios de 30 minutos, a história de Cassandra. Interpretada pela cantora e atriz Liniker (que é uma mulher trans), ela vive um de seus melhores momentos: além de conseguir alugar um apartamento próprio pela primeira vez, vive uma relação marcada pelo amor e companheirismo com Ivaldo (o pernambucano Thomás Aquino) e trabalha como entregadora no centro de São Paulo. Sua vida sofre uma guinada quando Leide (Karine Teles), com quem ela teve um envolvimento no passado, surge com Gersinho (Gustavo Coelho), que ela diz ser filho de Cassandra.
Com direção de Luis Pinheiro e Dainara Toffoli e roteiro de Josefina Trotta, Alice Marcone e Marcelo Montenegro, a série se destaca pelo cuidado na abordagem dos personagens, especialmente Cassandra, garantindo à personagem uma complexidade que, infelizmente, ainda é exceção em relação às narrativas sobre pessoas trans.
"O que mais me atraiu no roteiro foi a possibilidade de criar um imaginário real sobre uma pessoa trans, tendo em vista o País e a sociedade em que a gente vive e todas as formas de violência que pessoas trans e pretas passam. Então, construir e criar uma personagem a partir do afeto e da rede de afeto que ela tem foi uma das coisas que mais me emocionou quando peguei o roteiro pela primeira vez. Poder criar uma personagem que tinha relação humana e relação social; que a Cassandra não estava nesse lugar encaixotado, engavetado que muitas narrativas e olhares cinematográficos e de audiovisual colocam as pessoas trans, que é sempre à margem, sobre situação de perigo, violência, de um olhar muito marginalizado. A gente poder ver uma personagem que tem uma casa e uma travesti, já significa muito. Fora todas as situações de afeto e ser humana", reforçou Liniker durante coletiva de imprensa da série.
Sensível, bem escrita e dirigida, Manhãs de Setembro é uma obra que emociona por sua sinceridade. O elenco é outro destaque do projeto. Além de Liniker, Thomás e Karine, há participações luminosas de Paulo Miklos, Isa Ordoñez, Clodd Dias, Gero Camilo e da cantora Linn da Quebrada, em uma participação especial.