Feições, texturas e tons retintos de personagens reais da periferia do Recife, criados pelo traço inventivo do artista visual pernambucano Jeff Alan, ocupam o coração da capital até o dia 28 de janeiro. A exposição individual "Comigo Ninguém Pode - A Pintura de Jeff Alan" teve inauguração na última terça-feira (7) e segue em cartaz na Caixa Cultural Recife, no Recife Antigo, com 57 obras, muitas delas inéditas.
O argumento da exposição é trazer pessoas pretas com um protagonismo que lhes foi negado, contrariando os registros históricos que trazem esses corpos em situações de subalternidade e/ou violência. Esse traço político fundamenta a trajetória artística de Jeff.
Essa mostra já esteve na Casa Estação da Luz, em Olinda, com sucesso de público. Agora, ela chega ampliada com 18 novas obras, com patrocínio da CAIXA e do Governo Federal. A curadoria é de Bruno Albertim.
Os trabalhos figurativos presentes na exposição apresentam dimensões diversas, em acrílica sobre tela e desenho sobre papel. Eles retratam o cotidiano e um certo "movimentar das ruas" por onde passam personagens que protagonizam as obras.
"Jeff Alan tem em sua arte, com habilidade incomum numa época ainda de desmaterialidades, um vetor de sensibilidade aguda para o preenchimento de não-lugares da memória social de uma urbanidade recifense precariamente construída sob o amargo da cana de açúcar", comenta o curador.
O artista
Jeff Alan é daltônico e pinta desde a infância motivado pela sua mãe, Lucilene Mendes. Ele encontra o seu material poético em bairros como o Barro, onde vive e mantém seu ateliê, na Zona Oeste do Recife, além de outras comunidades periféricas. A dedicação em usar seus pincéis evidencia os traços estéticos das gentes simples que compõem o tecido urbano de áreas vulnerabilizadas.
O artista já teve obras expostas em países como França e Inglaterra e conquista cada vez mais atenção do público e crítica, despontando como um dos principais nomes das artes visuais do Estado e do mercado de arte contemporânea.
"Eu sou um artista de periferia. Nasci e me criei nas quebradas. É onde eu quero viver, respirar e vivenciar, é de onde vem minhas referências, onde meu coração pulsa mais forte. Eu preciso estar nos lugares onde vivem famílias pretas. Eu sou muito influenciado por esse contexto que eu nunca vi representado nos museus. Foram lugares negados para o nosso povo", declara o artista, que acaba de retornar de uma residência artística em Portugal.
A escolha dos profissionais que atuam no projeto, a seleção da monitoria da exposição, assim como a programação cultural paralela têm como protagonistas pessoas negras. A exposição contará, ainda, com legendas em braile e QR code com a audiodescrição das peças, que destacam os traços e biotipos de crianças, jovens e adultos negros que entrecruzam o caminho do artista.
Agenda
No sábado (11), às 16h, acontece o "Diálogo e Encontro Intercultural e Valorização das Comunidades Quilombolas", que reunirá Jeff Alan e Bruno Albertim para uma conversa mediada pela artista e historiadora Rebecca França. O debate visa a evidenciar os pontos de ligação entre a ancestralidade e a prática artística.
O projeto traz, ainda, uma série de atividades que abarcam outras linguagens e manifestações artísticas da cultura negra, como dança, literatura, teatro, capoeira e hip-hop, além de visitas guiadas com o artista e curador.
Nomes como a poeta e cantora Bione, Grupo Legado Capoeira, do Barro, Balé da Cultura Negra do Recife e o núcleo de pesquisa teatral O Postinho fazem parte da programação paralela. Veja as datas e horários no site da CAIXA Cultural.