Acervo de Naná Vasconcelos começa a ser conservado, mas futuro segue incerto
Parte do acervo, como instrumentos e fotos, está com o Muafro até a criação de projetos definitivos; Viúva Patrícia Vasconcelos busca novos diálogos

O acervo do percussionista Naná Vasconcelos (1944-2016), por quase uma década sem destino definido e sob risco de deterioração, agora tem um espaço de guarda temporária enquanto não surgem projetos mais amplos.
Parte significativa do legado do músico — instrumentos, vestuário, fotografias e prêmios — agora está sob os cuidados de uma equipe no Museu de Artes Afro-Brasil Rolando Toro (Muafro), no Bairro do Recife.
Naná foi ganhador de oito Grammys, sendo o brasileiro mais premiado, e eleito oito vezes o melhor percussionista do mundo pela "Down Beat", revista de jazz norte-americana.
O impasse sobre o destino desse acervo veio à tona em janeiro de 2022, quando o JC publicou o apelo de Patrícia Vasconcelos, viúva de Naná, que havia retornado de Nova York para retirar os pertences do artista de uma casa na Zona Norte e transferi-los para um depósito na Imbiribeira, Zona Sul.
Invasão reforça importância de conservação

Desde essa denúncia, parlamentares e gestores públicos passaram a dialogar com Patrícia, principal defensora do legado de Naná, resultando na emenda parlamentar do deputado estadual João Paulo (PT), que viabilizou a conservação e a catalogação dos itens.
A verba está pagando o trabalho de uma equipe com 15 pessoas. Os objetos que estão na Ocupação Naná, no MAMAM, incluindo o principal berimbau do músico, também irão para essa conservação no Muafro.
A urgência de um local adequado para o acervo se tornou ainda mais evidente após a invasão da antiga casa do casal, no Rosarinho, na madrugada da quinta-feira (20). Nenhum item de valor histórico ou cultural foi levado, apenas uma mesa de som do estúdio.
Conservação exige mais aportes

Patrícia já teve diálogos com a Prefeitura do Recife para viabilizar um possível espaço cultural temático no Bairro do Recife. Até agora, no entanto, nada foi concretizado, e os recursos disponíveis permanecem limitados.
"No momento, o que precisamos é de mais aporte para que esse acervo físico de Naná continue seguro", afirma Patrícia, ao JC. "Estou preservando esse legado há nove anos. Paguei depósitos, mantive a casa vazia na esperança de que um memorial fosse criado ali, mas já perdi as esperanças nesta ideia. No entanto, o acervo precisa de um novo espaço definitivo".
Patrícia permanecerá no Recife por uma temporada para acompanhar de perto o processo de catalogação e retomar conversas com o poder público e a iniciativa privada.
"O acervo de Naná é um patrimônio do mundo. Não posso cuidar dele sozinha. Vim para enfatizar esse discurso, visitar pessoas que podem me ajudar com isso. Não é uma ajuda para mim, é para alguém que fez história na música mundial", pontua.
Acervo deve continuar crescendo

Amaro Filho, coordenador executivo do projeto, destaca que a cada dia novas descobertas são feitas, como pequenos textos e instrumentos. Por isso, ainda não é possível determinar um número exato de itens.
Há expectativa de que novos objetos e registros cheguem por meio de doações de diversas partes do mundo, já que Naná se tornou um cidadão global em vida. "É uma obra em constante movimento, sempre respirando, que não para. Todo esse material também será inventariado", afirma Amaro Filho.
O projeto também possui um caráter formativo. "A emenda parlamentar que recebemos é voltada para a área de formação, por isso, vamos ensinar os maracatus a preservar seus instrumentos com base no que estamos fazendo com o acervo de Naná. Ele sempre valorizou a educação, especialmente com as crianças", explica o coordenador.
Ação de conservação
Célia Salsa, integrante da equipe de restauração, explica como está sendo conduzida a ação de "conservação curadora". "Estamos inventariando cada peça individualmente, com fichas que detalham suas características e incluem fotos para facilitar a identificação. Também estamos acondicionando instrumentos, quadros, banners e outros objetos." A atual fase do trabalho deve durar de dois a três meses, com atividades diárias.