Ao cineteatro onde, criança, assistiu ao primeiro filme de sua vida, Martins estará de volta, nestes sábado (5) e domingo (6), para quatro apresentações. O jovem compositor, cantor e músico ocupará o Teatro do Parque, no bairro da Boa Vista, Centro do Recife, com sessões — que estão quase esgotadas, se não já — de um despretensioso show, segundo ele, feito de versões e de diversões de/com músicas dele e dos outros.
Esta é a segunda vez em que Martins fará da plateia de sua infância um dos palcos de sua arte. Em novembro passado, quase um ano depois da reabertura do Teatro do Parque, ele se apresentou no cineteatro junto com Almério. O show "Almério & Martins" — que havia estreado no Janeiro de Grandes Espetáculos de 2020 e viajou ao Rio em setembro de 2021 — foi gravado e deverá ser lançado em disco no mês que vem.
Na vez de agora, Martins estará na companhia dos músicos Gabriel Melo, na guitarra, e Rodrigo Samico, no violão. Preparou arranjos novos para canções já bem conhecidas do seu público, e que estão no seu único disco, "Martins" (Deck, 2019); acrescentou algumas próprias recentes, fora releituras, de Caetano e de outros que não revelou. Surpresas.
As recentes, talvez até inéditas em palco, são da safra do isolamento social na pandemia, quando foi fazendo da casa palco, dividindo o que criava, em lives quase diárias, sem anunciá-las, mas que fluíam. Este show, "Versões" - realizado com recurso da Lei Aldir Blanc pelo Edital Joel Datz, do Recife - é uma continuidade dessa experiência:
"Em casa, às vezes, eu pego e posto na rede social uma versão de uma música, e as pessoas interagem, gostam, comentam. Eu pensei em fazer um show como se estivesse na sala de casa, cantando coisas que eu gosto de cantar e coisas que as pessoas me pedem pra cantar. Então, é um show de versões e de diversões — é, sobretudo, pra se divertir."
TRAJETÓRIA
Recifense da Iputinga, Zona Oeste da capital pernambucana, Martins tem seu nome associado a uma novíssima cena da música pernambucana, formada por artistas que foram surgindo a partir da segunda metade da década de 2010. Parte dessa cena é identificada por uma música embebida de poesia; ou por poemas musicados; ou músicas em que a palavra, o verbo, tem força além ou paralela à da sonoridade.
No caso de Martins, comprovando a impressão que a gente tem, seu trabalho artístico começou na poesia. Depois saltou para a composição, e só daí chegou à voz e ao instrumento.
"Minha história na arte começa pela literatura. Foi, primeiro, escrevendo, e só depois eu enveredei pela música", conta ele, que, aos 17 anos, participou do festival Recitata — escreveu um poema, recitou e venceu. "Fiquei fascinado com a possibilidade de estar no palco, de falar para o povo. Nesse momento, eu vislumbrei a possibilidade de uma vida de artista", continua. "A música me veio por causa da literatura."
Se continua escrevendo poesia para cantar e tocar, ele não tem como afirmar: "Eu digo que é letra de música, porque pra mim é uma responsabilidade muito grande dizer que é poesia". Sua relação maior, diz, é com a poesia popular: "[Ela] é uma bandeira que eu carrego para o resto da vida — o lance do repente, dos cantadores de viola, dos emboladores. Isso é a referência total para a forma como eu desenvolvo a minha música".
Na música propriamente, estreou na banda Sagaranna, tocando rabeca ("tem muito o universo da Zona da Mata, na poesia, na linguagem, e também do Sertão, porque eu tenho uma relação com essas duas regiões, por causa da minha família"); em seguida, formou com amigos a Marsa ("mais urbana, mais Recife, uma poesia mais livre"). "A minha carreira solo vem de um lugar de querer falar coisas que, nos outros projetos, não conseguia colocar da forma como eu queria. Mas, amo todos os projetos de que participei", fala ele, que prepara seu segundo disco solo, com previsão de lançamento no segundo semestre — e, até lá, um single.
NEY MATOGROSSO
A continuidade da carreira de Martins, de alguma forma, recebeu uma chancela importantíssima do fim do ano passado para cá, quando Ney Matogrosso gravou os versos "Eu cravaria meus dentes na tua garganta/ Pra te morder as mentiras que saem da boca". São de "Estranha Toada", composição dele com o também pernambucano PC Silva, que abre o disco de 2019 e está no álbum "Nu com a Minha Música", lançado por Ney para comemorar seus 80 anos de vida.
"Quando ele me perguntou se poderia gravar uma canção, eu fiquei louco, porque imagina: Ney, para mim, é uma das referências mais lindas da música brasileira, um grande intérprete, um sujeito que tem uma postura tão importante até hoje; com 80 anos e permanecendo uma pessoa coerente, uma pessoa que abriu portas pra tantos artistas. Para mim é um presente, uma coisa linda, acho que zerei."
Serviço
Show Versões. Sábado (5), às 18h e às 20h30, e domingo (6), às 16h e às 19h. Ingressos custam R$ 50 (inteira) e R$ 25 (meia), à venda na Sympla.