NEGÓCIO DE JOVEM

Jovens abrem o próprio negócio e provam que empreender não é 'cringe'

Com determinação e planejamento, jovens mostram que dá para abrir o próprio negócio em qualquer idade

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Marcelo Aprígio

Publicado em 08/08/2021 às 8:00
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Nos últimos tempos, uma nova crise existencial tomou conta de quem nasceu antes de 1995. Isso porque diversos internautas têm feito para si a seguinte pergunta: “eu sou ‘cringe’?” Ou, principalmente, “o que é ‘cringe’?”. O termo tem origem em um verbo inglês e ganhou o submundo da internet, onde virou gíria.

Segundo o dicionário informal das redes sociais, significa algo como “mico” ou “vergonha alheia”. No Brasil, tornou-se um adjetivo que, entre outras coisas, define muito do que a geração Z (os nascidos entre 1995 e 2010) acha do comportamento das pessoas mais velhas.

Diante disso, poderíamos dizer que empreender é “cringe”, visto que, de acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), a idade média do empreendedor brasileiro é de 44,7 anos. No entanto, a experiência de pessoas que decidiram abrir o próprio negócio ainda cedo, mostra que não há nada de “cringe” em empreender. Pelo contrário, é “based”.

Um desses exemplos é Rayssa Neves. Aos 24 anos, a jovem está realizando um sonho de criança: ter uma confeitaria. Após ser demitida da empresa onde trabalhava, ela se inspirou na mãe e na tia e decidiu fazer bolos e outros doces na cozinha de casa para vendê-los por meio do seu perfil no Instagram (@rayssaaneves), que hoje reúne mais de 36 mil seguidores. “No começo, por eu ser nova, as pessoas diziam que empreender era apenas uma atitude desesperada de se encontrar. Mas aquilo era, na realidade, a minha maior paixão e ambição profissional. Por isso, com altos e baixos sigo firme com a minha paixão”, afirma a promissora confeiteira.

BOBBY FABISAK/JC IMAGEM
Rayssa Neces, abriu uma loja de bolos. Dia da Juventude. Jovens Empreendedores. - BOBBY FABISAK/JC IMAGEM

Quem também decidiu se lançar com tudo no empreendedorismo, foi Eduarda Silva. Tudo começou há 10 anos, quando ela já revendia trufas de chocolate na escola para ter renda própria. Hoje, com 25 anos, comanda o próprio negócio de papelaria criativa. “Sempre gostei de canetas diferentes e papéis. Quando saí do emprego, uma amiga comentou: ‘você precisa abrir alguma coisa sua’. E agora estou investindo”, diz a jovem, que tem uma loja virtual batizada no Instagram de ShopLiviaa (@shopliviaa).

Assim como elas, cada vez mais jovens têm apostado no empreendedorismo como opção de carreira ou, diante da crise, como solução para o desemprego. De acordo com o Sebrae, entre os empreendimentos nascentes de 2020, 21,2% são comandados por pessoas com idade entre 18 e 24 anos. Por outro lado, essa mesma faixa etária representa apenas 5,1% dos empreendedores estabelecidos, que têm negócios com mais de três anos e meio de existência. Ou seja, os jovens sofrem para estabelecer o negócio.

SE PLANEJAR E SE CAPACITAR

Para especialistas, as dificuldades dos jovens em consolidar os novos negócios passam pela falta de planejamento. “O jovem gestor, geralmente, não se planeja. Ele continua crescendo e funciona na base do impulso”, diz o economista e professor do Unit-PE, Werson Kaval. “Muitas vezes o que dá certo no começo tende a não funcionar quando o negócio fica mais estruturado.”

Outro problema está em não fazer uma pesquisa de mercado antes de oferecer um produto. Para a analista do Sebrae-PE Conceição Moraes, os empreendedores não avaliam a demanda pelo produto ou serviço no mercado ao montar o próprio negócio. “É preciso saber se há uma demanda não atendida que eu possa facilmente atrair”, explica Moraes. “Caso contrário, vou ter de brigar com quem está no mercado e estarei entrando para atender uma demanda que já está sendo atendida”, completa.

 

Além do planejamento no começo do negócio, para chegar onde está atualmente, Rayssa Neves se preparou com ajuda de cursos oferecidos por profissionais que já estavam consolidados no mercado. “No começo, meu esposo pagou meu primeiro curso. Mas depois que tudo começou a dar certo, fiz outros cursos para me aperfeiçoar”, conta, que hoje repassa o conhecimento para quem deseja ingressar no mercado dos doces. “Faz três anos que dou aula. Já acumulo mais de 1 mil alunos, entre aulas presenciais e on-line”, diz a jovem.

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Eduarda Lívia abriu uma papelaria. Dia da Juventude. Jovens Empreendedores. - BOBBY FABISAK/JC IMAGEM

Já Eduarda Silva faz parte do grupo Jovens Empreendedores, um projeto do Instituto JCPM de Compromisso Social, no qual são passadas orientações para criar e manter um negócio. “Antes, mesmo pesquisando na internet, eu tinha pouca noção sobre empreendedorismo, agora, com a ajuda de profissionais qualificados, as coisas estão amadurecendo e ganhando uma amplitude melhor”, conta Eduarda, afirmando que já sente os efeitos do aprendizado no seu negócio.

Kaval aconselha que outros jovens sigam o exemplo delas e se aperfeiçoem constantemente. Segundo ele, é natural que o empreendedor nesta etapa da vida tenha menos experiência no mundo dos negócios. Para driblar essa dificuldade, é necessário se capacitar. “Independente se ele é pequeno, médio ou grande empreendedor, hoje nós temos a obrigação de estar sempre nos qualificando. E existem muitas oportunidades gratuitas que realmente suprem a demanda de qualificação necessária para o empreendedor”, avalia.

Essa qualificação deve incluir educação financeira, recomenda Matheus Calado, diretor jurídico da Associação de Jovens Empresários do Recife (AJE). “Temos de formar empreendedores e ajudar o empreendedor a fazer esse percurso enquanto é jovem”, afirma. “Todos nós temos uma relação difícil e distante com o dinheiro. Isso tem muito a ver com a base familiar e a criação em que somos inseridos. Deveria haver disciplinas sobre o assunto nas instituições de ensino”, reforça Calado, citando o cálculo do tempo de retorno do investimento aplicado no negócio como exemplo da necessidade desse aprendizado.

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JOVENS EMPREENDEDORES - Matheus Calado, diretor jurídico da Associação de Jovens Empresários do Recife (AJE) - ACERVO PESSOAL

Além da falta de educação empreendedora, as barreiras para acessar crédito são grandes dificultadoras para jovens que querem começar um negócio para chamar de seu. É o que afirma Tatiana Garcia, da Aliança Empreendedora, entidade que orienta jovens de baixa renda. Segundo ela, em tese, existem bancos que oferecem microcrédito para empreendedores de baixa renda, mas a prática é outra. “O nível de burocracia que esse jovem enfrenta para conseguir pegar um empréstimo com uma taxa justa é quase proibitivo”, pontua. “Para empreender no Brasil, você tem que ser resiliente. A resiliência é muito necessária, assim como a vontade de fazer as coisas acontecerem”, ela diz.

VANTAGEM ONLINE

Se há uma vantagem competitiva entre os jovens empreendedores, certamente ela está nas redes sociais, que têm se tornado aliadas para pequenos empreendimentos, especialmente o Instagram. De acordo com Werson Kaval, essas plataformas são uma ótima oportunidade para conquistar clientes e alcançar visibilidade no mercado com um custo quase zero. “Quando você tem uma loja online, conta com uma vitrine funcionando 24 horas por dia. É uma ferramenta importante para quem quer conhecer seus clientes e interagir com seu público”, afirma.

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PRODUTIVIDADE | Werson Kaval, consultor, professor da Unit-PE e especialista em qualidade e produtividade - ACERVO PESSOAL

Apesar de toda essa visibilidade que as redes sociais oferecem, os pequenos empreendedores precisam planejar a forma como apresentam a empresa na internet. Além de se portar de forma profissional, Conceição Moraes, do Sebrae, recomenda conteúdos que sejam relevantes ao público e garantam engajamento.

“Por isso, é interessante o empreendedor aprimorar o seu conhecimento sobre as redes sociais para se diferenciar da concorrência e utilizar todo o potencial dessas ferramentas”, aconselha. “O sucesso é para todos, mas tem um preço: o estudo, a dedicação, a persistência, o aprender com os erros e a experiência. Ele não virá do dia para a noite, e está tudo bem”, conclui.

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