Especialistas ouvidos pela Rádio Jornal, na manhã desta sexta-feira (10), apontam que as missões americanas no Afeganistão, que tiveram início após os ataques sem precedentes do 11 de setembro, trouxeram mais problemas do que soluções aos Estados Unidos. Prejuízo aos cofres públicos, medo para a população de novos ataques e um Talibã reforçado são algumas das consequências enfrentadas ao longo dos últimos 20 anos.
O Talibã voltou, em 15 de agosto deste ano, à capital do Afeganistão, Cabul, 20 após ser expulso pelas tropas dos Estados Unidos. A retomada da cidade ocorreu em meio à retirada dos militares americanos do país. Em 2001, os norte-americanos agiram contra o Talibã em reação aos ataques de 11 de setembro, se juntando à Aliança do Norte, uma organização desenvolvida pelo Afeganistão para unir a população e combater o grupo extremista.
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Coordenador do curso de Ciência Política da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), Thales Castro ressalta que este sábado, 11, quando chegamos a 20 anos do ataque ao World Trade Center, em Nova York, será um dia de dor aos americanos. "É momento de pesar aos Estados Unidos, um momento duro".
O professor ressaltou que nesse período bilhões de dólares foram "drenados" dos cofres americanos para tentar controlar a região do Afeganistão, mas sem trazer soluções para a crise, o que gera revolta da população. Além disso, Thales Castro ressalta que o Talibã retoma o poder com sentimento de vingança após ser expulso pelos Estados Unidos. "O Talibã volta mais forte, melhor armado e mais sangrento do que nunca, com sentimento de anti-ocidente, anti-Estados Unidos", comentou.
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"A mídia disse que seria pacífica a transição, mas é um equívoco brutal, é uma perda sociopolítica grande ao ocidente e aos Estados Unidos e a fatura cai no colo de quem está na Casa Branca nesse momento", disse Thales em referência ao presidente Joe Biden.
O que aconteceu no 11 de setembro de 2001?
Em 11 de setembro de 2001, os ataques terroristas nos Estados Unidos mataram quase 3 mil pessoas. Na época, aeronaves comerciais, utilizadas como mísseis terroristas, detonaram as Torres Gêmeas e parte do Pentágono, em Washington DC, deixando uma cicatriz incurável para a humanidade. Osama Bin Laden, o chefe do grupo extremista al-Qaeda, foi rapidamente identificado como responsável pelos atentados.
O Talibã , grupo islâmico radical que governava o Afeganistão na época, decidiu proteger Bin Laden e se recusou a entregá-lo ao governo americano. Então, um mês depois dos atentados de 11 de setembro, os Estados Unidos lançaram ataques aéreos contra o país. Outras nações entraram na guerra em apoio aos EUA, e o Talibã rapidamente removido do poder. Todavia, o grupo não desapareceu e sua influência voltou a crescer nos últimos anos.
O cientista político Antônio Henrique Lucena, que participou do debate, explica que inicialmente o objetivo era prender Osama e desmontar a al-Qaeda, mas que em seguida houve a tentativa de empoderamento do governo Afegão, algo que o governo americanos não conseguiu alcançar. "Com o passar do tempo perceberam desvio de recursos com corrupção, obras feitas ne região que não tiveram o impacto desejado, a população enxergava com maus olhos o governo do Afeganistão", destacou.
Lucena ressalta, ainda, um dos motivos de insatisfação da população local. "Ainda no governo de Barack Obama tentaram derrotar militarmente o Talibã, tentando levar cada vez mais tropas, mas não conseguiram. Com isso, houve emprego maciço de drones para atacar o grupo e muitos civis morreram e influenciou parte da população a apoiar o talibã, foi um efeito colateral. Já Donald Trump deu legitimidade ao Talibã em ao trazê-los à mesa para negociação. Foi um erro, empoderou o grupo, que não atacou forças americanas, mas atacou forças afegãs", destacou.
O especialista foi questionado sobre como o grupo se mantém financeiramente e destacou a atuação como forma de milícia. "É muito discutido essa questão de quem financia o Talibã. hoje, pessoas ricas simpáticas ao movimento financiam. Há colaboração e eles conseguem recursos em mesquitas radicalizadas, também por meio de coação à população local arrecadando recursos. Outro fator é que o Talibã tem característica de milícia, como há aqui no Rio de Janeiro. Se você precisa ter um serviço, paga ao Talibã para ter, eles vendem proteção. Há notícias de que países patrocinaram, com recursos do Catar, da Arábia Saudita", destacou Lucena, que ainda citou a tomada de refinarias e controle de áreas de cultivo de papoula, para extração do ópio, do qual se deriva a cocaína, como outras fontes de renda do grupo.
Estados Unidos
Correspondente da Rádio Jornal nos EUA, a jornalista e especialista em Ciência Política Fabíola Góis trouxe um olhar de como os americanos enxergam o impacto da guerra. "Soldados perderam a vida, muitos jovens, eles perderam a guerra. Além disso, o cenário econômico mudou depois dessa guerra, os EUA patrocinaram medidas de consumo, baixaram juros, compraram muito da China que começou a vender produto tecnológico e hoje a China é o que é", disse.
Morando em Washington, Fabíola comentou, ainda, o sentimento de eterna vigilância dos americanos após os atentados terroristas. "A sensação é de que estou vigiada o tempo inteiro, seja por interceptação telefônica ou câmeras em todos os lugares. Há um excesso em relação ao medo de ataque, principalmente, depois do 11 de setembro. Então, os Estados Unidos reforçaram a segurança e percebemos esse medo, entre aspas, pois me sinto segura, mas tem regiões não tão seguras assim. Vejo que a população tem medo e sabendo da retirada das tropas EUA temem novos ataques", destacou a jornalista ao contar que em museus as bolsas são abertas para verificação de segurança e a fiscalização em ônibus, aeroportos está atenta.
O professor Antônio Henrique Lucena afirmou que as cicatrizes permanecerão. "O Onze de Setembro moldou a nova era da vigilância, da preocupação com o terrorismo para evitar novos ataques e isso chegou para ficar. Você é revistado antes de entrar no avião, tem de tirar tênis, não pode levar gilete, tesourinha de unha. Os terroristas não tinham armas de fogo a bordo, eles usaram estiletes. Então, hoje, a porta das cabines é reforçada, é difícil invadir e qualquer avião que relata sequestro é seguido por caças. Além disso, há a vigilância nas redes sociais, monitoramento da deep web, mecanismos para aumentar a vigilância", concluiu o professor.