Atualizada às 18h39
Com Estadão Conteúdo
Em coletiva de imprensa na tarde desta sexta-feira (24), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou que Sergio Moro, então ministro da Justiça e Segurança Pública, disse a ele que aceitaria a saída de Maurício Valeixo do cargo de diretor-geral da Polícia Federal, mas só em novembro, depois de ser indicado para uma vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
>> Moro rebate Bolsonaro e diz que Valeixo nunca foi moeda de troca para indicação ao STF
>> Ao sair do Ministério, Moro disse que Bolsonaro quis interferir politicamente na PF
>> Veja trajetória de Moro: da ascensão na Lava Jato à saída do governo Bolsonaro
Valeixo foi exonerado nesta sexta-feira (24), levando Moro a pedir demissão e acusar Bolsonaro de tentar interferir politicamente no comando da Polícia Federal para obter acesso a informações sigilosas e relatórios de inteligência. Moro era um dos cotados para vaga no STF, indicação que cabe ao presidente da República.
De acordo com Bolsonaro, Moro afirmou o seguinte: "Você pode trocar o Valeixo, mas em novembro, quando me indicar para o Supremo Tribunal Federal"
"Me desculpa, mas não é por aí", declarou Bolsonaro no Palácio do Planalto ao relatar o suposto pedido de Moro. "Reconheço as suas qualidades em chegando lá, se um dia chegar, pode fazer um bom trabalho, mas eu não troco. E, outra coisa, é desmoralizante para um presidente ouvir isso."
Pelo Twitter, Moro rebateu a acusação de Bolsonaro, dizendo que nunca cobrou indicação ao STF.
"A permanência do Diretor Geral da PF, Maurício Valeixo, nunca foi utilizada como moeda de troca para minha nomeação para o STF. Aliás, se fosse esse o meu objetivo, teria concordado ontem com a substituição do Diretor Geral da PF", disse o ex-ministro.
"De fato, Maurício Valeixo estava cansado de ser assediado desde agosto do ano passado pelo presidente para ser substituído. Mas, ontem, não houve qualquer pedido de demissão, nem o decreto de exoneração passou por mim ou me foi informado", acrescentou.
O presidente negou que tenha pedido informações sobre processos em investigação da Polícia Federal. A acusação de interferência foi feita mais cedo pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, ao anunciar sua demissão do governo.
"Nunca pedi para ele o andamento de qualquer processo até porque a inteligência com ele perdeu espaço na Justiça", declarou Bolsonaro em discurso no Palácio do Planalto.
Ao ler uma carta direcionada ao ex-juiz da Lava Jato no discurso, Bolsonaro disse estar "decepcionado e surpreso" com o comportamento de Moro. O chefe do Planalto classificou as declarações do ministro como infundadas. "Não são verdades as insinuações que eu desejaria saber sobre investigações em andamento."
"Desculpa, senhor ministro, o senhor não vai me chamar de mentiroso", declarou Jair Bolsonaro ao contestar Moro.
Bolsonaro negou que tenha pedido para Moro blindá-lo na Polícia Federal ou proteger alguém da sua família, mas deixou claro que apelou para o chefe da pasta agir no órgão para investigar alguns casos, como o atentado da facada na campanha eleitoral e o porteiro que citou o presidente no assassinato da vereadora do Rio Marielle Franco.
Ao anunciar a saída do cargo, Moro acusou nesta sexta-feira (24) o presidente de tentar interferir politicamente no comando da Polícia Federal para obter acesso a informações sigilosas e relatórios de inteligência. "O presidente me quer fora do cargo", disse Moro, ao deixar claro que a saída foi motivada por decisão do presidente.
"O presidente me disse que queria ter uma pessoa do contato pessoal dele, que ele pudesse colher informações, relatórios de inteligência. A interferência política pode levar a relações impróprias entre o diretor da PF e o presidente da República. Não posso concordar", disse Moro, ao comentar as pressões de Bolsonaro para a troca no comando da PF. "O presidente me quer fora do cargo."
Moro falou com a imprensa após Bolsonaro formalizar o desligamento de Maurício Valeixo do cargo de diretor-geral da Polícia Federal - o ministro frisou que não assinou a exoneração, publicada no Diário Oficial da União. O ex-juiz federal da Lava Jato lembrou que, em novembro de 2018, logo após as eleições presidenciais, Jair Bolsonaro lhe disse que ele teria "carta branca" para comandar a pasta, o que acabou não ocorrendo. "Ele (Moro) vai abrir mão da carreira dele. É um soldado que está indo à guerra sem medo de morrer", disse o presidente na ocasião.
De acordo com Moro, a partir do segundo semestre do ano passado, "passou a haver uma insistência do presidente com a troca do comando da Polícia Federal". "O presidente passou a insistir também na troca do diretor-geral. Eu disse 'Não tenho nenhum problema em trocar o diretor-geral, mas eu preciso de uma causa' (…) Estaria claro que haveria interferência política na PF'. O problema é: por que trocar? Por que alguém entra? As investigações têm de ser preservadas", disse.
Ao falar do governo Dilma Rousseff, o ministro observou que "é certo que o governo da época tinha muitos defeitos, mas foi fundamental a autonomia da PF". "Foi garantida a autonomia da Polícia Federal durante os trabalhos. O governo da época tinha inúmeros defeitos, crimes de corrupção, mas foi fundamental a manutenção da autonomia da PF para que fosse realizado o trabalho. Isso permitiu que os resultados fossem alcançados."
Derrotas
Desde que abandonou 22 anos de magistratura para entrar no governo, Sergio Moro tem acumulado uma série de derrotas. O pacote anticrime formulado por ele, por exemplo, foi desidratado pelo Congresso. Recentemente, Bolsonaro também tentou esvaziar dividir o Ministério da Justiça, retirando de Moro a parte reservada ao combate à criminalidade, justamente uma das áreas que apresentava melhor resultado até aqui. O plano do presidente era entregar a área que cuida da Polícia Federal para o ex-deputado Alberto Fraga (DEM), amigo pessoal de Bolsonaro.
STF
Segundo Moro, ao aceitar o convite para comandar a Justiça, nunca houve a condição para que ele depois assumisse uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF). "O compromisso (ao assumir ministério) era aprofundar combate à corrupção", afirmou.
"Busquei ao máximo evitar que isso (a minha saída) acontecesse, mas foi inevitável", disse Moro. "Não foi por minha opção."
Sucessão
O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), já articula para emplacar o secretário de Segurança do DF, Anderson Torres, no lugar de Moro. Crítico do ex-juiz, Ibaneis disse que Torres, que é amigo de Bolsonaro, seria um ministro "100 vezes melhor" que Moro.