Dois dias depois do primeiro turno, a candidata a prefeita do Recife Marília Arraes (PT) vem reunindo uma série de apoios ao seu nome por lideranças que até então apoiavam seus adversários no pleito. A lista conta com o Podemos, o ex-senador Armando Monteiro (PTB) e o prefeito reeleito de Jaboatão dos Guararapes, Anderson Ferreira (PL). A negociação de um eventual apoio de Daniel Coelho, presidente estadual do Cidadania, também está em jogo.
Especialistas ouvidos pelo JC não acreditam em uma transferência significativa de votos para a petista por conta desses apoios. Mas reconhecem a importância deles na busca da candidata de conquistar, ao menos uma parte, da soma de 42,87 % dos votos nos candidatos que saíram derrotados no primeiro turno, considerando o fato de que o seu adversário, João Campos, comanda uma frente ampla de 12 partidos, contando com o PSB, que elegeu 25 vereadores.
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Para a cientista política e professora da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda (Facho) Priscila Lapa, essas declarações de apoio impactam mais o ambiente político do que propriamente a decisão do eleitor. "O quanto isso interfere na eleição é muito mais aqueles correligionários mais próximos daquele ator político que declarou apoio acompanharem ele, mas é aquela base ali que está próxima à pessoa, não necessariamente o conjunto do eleitorado que vai acompanhar esse gesto. Mas obviamente que o candidato que estruturar um palanque mais competitivo teoricamente, ele está estruturando uma base política para a disputa deste mandato", argumenta.
O cientista político Arthur Leandro avalia que o eleitor está cansado do mecanismo de polarização da política, que ficou mais evidenciado nas eleições de 2018. "O partido tem mais importância dentro da arena parlamentar e no momento de definição e lançamento das chapas, então o partido é uma instituição que conta mais para o político do que para o eleitor", afirmou.
O Podemos e o PTB figuram em um espectro político oposto ao do PT no âmbito nacional. O PTB inclusive tem uma resolução proibindo alianças com PT, PSOL, PDT, PCdoB, REDE, PSB, PCB, PSTU e PCO. O presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, é aliado de primeira hora do presidente Jair Messias Bolsonaro (sem partido).
Mas o que une Armando Monteiro e Ricardo Teobaldo, presidente estadual do Podemos, é o papel de oposição ao PSB em Pernambuco desempenhado por ambos. Ao declararem o seu apoio, eles minimizaram o fato de Marília ser filiada ao PT, e apontaram ela como um "quadro de renovação", no caso de Teobaldo e com "capacidade de falar além do PT" no caso de Armando.
A própria aproximação com o PT não é uma movimentação inédita para eles. O PTB e o Podemos integraram a chapa de João Paulo para a Prefeitura do Recife na eleição de 2016. Armando foi ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior do governo Dilma Rousseff e votou contra o impeachment dela no Senado Federal.
"Ricardo Teobaldo enfrentou e ganhou do PSB na cidade dele (Limoeiro, onde Orlando Jorge, do Podemos, foi eleito). É natural que ele queira manter uma simetria, apoiando Marília de quem ele é colega na câmara federal. Em relação a Armando Monteiro, vamos nos lembrar da importância de Armando durante o impeachment. Nós apoiamos Armando (em 2014) e mesmo ele derrotado por Paulo Câmara manteve todo o apoio a Dilma no segundo turno. Eu acho que é uma coisa natural, o afastamento de Armando do PSB não é de hoje, vem desde 2014", relembra a deputada estadual Teresa Leitão, aliada de primeira hora de Marília.
Teresa afirma que "não houve nenhuma exigência ideológica" por parte desses novos nomes que chegam para apoiar Marília. "Todo mundo conhece nossas propostas, todo mundo sabe da presença de lula na campanha. Estão querendo vir nós não vamos desdenhar.
A própria Marília já vinha abordando essa questão ao longo da campanha, e no dia do primeiro turno, foi taxativa: "Apoio é uma coisa flexibilização do projeto, das ideias é outra. E isso nós não flexibilizamos", disse.
Priscila Lapa classifica o eleitor recifense como um "clássico eleitor brasileiro", alheio à direcionamentos ideológicos. "O máximo que esse eleitor tem é uma discussão que o PT é associado à corrupção, essa imagem negativa do PT, que pode ser neutralizada com outros argumentos de campanha. a estraégia eleitoral pode ajudar a reduzir isso ai ampliando para a perceoção do eleitor a desvantagem que pode ser o projeto do PSB", projeta a especialista.
Já o cientista político Arthur Leandro acredita que um apoio de Daniel Coelho a Marília pode acabar prejudicando ele mais do que poderia ajudar Marília. "O apoio de Daniel Coelho pode ser um apoio importante no sentido de conquistar alguns votos para Marília. Também pode ser uma manobra desinteressante para ele. Daniel Coelho já foi na disputa contra o PT, contra o PSB e movimentar-se ao lado do PT contra uma reeleição do PSB pode ser lida pelo eleitor como casuísmo", disse.
A coligação de Marília, Recife Cidade da Gente, é formada por quatro partidos, que conseguiram eleger cinco parlamentares: Liana Cirne (PT), Jairo Britto (PT), Osmar Ricardo (PT), Ivan Moraes (PSOL) e Dani Portela (PSOL) essa última a mais votada nesta eleição.
Vereadores eleitos e candidatos do PT que concorreram nesta eleição reuniram-se nesta terça-feira (17) no comitê de Marília Arraes para tratar sobre a estratégia do partido para alavancar a candidatura de Marília no segundo turno.
Para Liana Cirne, a vinda desses apoios significa um reconhecimento do programa de governo proposto pela candidatura de Marília. "É necessário fazer essa ampliação, porque Marília vai ser eleita prefeita da cidade, dos recifenses. Acho que também há um desejo de renovação, há um profundo desgaste em relação ao PSB, Marília passa a imagem de uma mulher muito corajosa, firme, que tem força para fazer as mudanças que a gente quer, que a gente precisa", disse a vereadora eleita.
Nesta quarta-feira (18), é a vez do PSOL se reunir. "A gente vai fazer uma plenária para definir o encaminhamento, a linha política (para o segundo turno), mas a gente teve muita convicção na composição dessa aliança", resumiu Dani Portela.
Ela ressalta que o PSOL historicamente não compõe alianças amplas, mas desde 2019 um novo posicionamento do partido no âmbito nacional encorajou coligações com forças da esquerda para combater o bolsonarismo. A sigla, segundo ela, não abre mão do conteúdo programático, que ajudou a compor o programa de governo de Marília. "agora as declarações de apoio podem declarar apoio mas isso não significa debater programa com a gente, compor uma aliança. Para mim o essencial é a gente se manter firme e quando Marília for eleita chegar junto para uma composição que faça uma gestão mais participativa, horizontal", disse Dani.
A participação do ex-presidente Lula na campanha de forma presencial chegou a ser especulada, mas não confirmada até então pela campanha da candidata. Na live em que participou com Marília na última sexta-feira (13), ele levantou essa possibilidade, mas no domingo (15), Marília fez novamente a ponderação de que o ex-presidente integra o grupo de risco da covid-19, o que dificultaria uma viagem ao Recife.
Lula vem participando ativamente da campanha e chegou a gravar junto com Marília, em São Paulo, vídeos para o guia eleitoral da candidata. Recife e Vitória, no Espírito Santo, com João Coser (PT), são os únicos municípios do País em que o PT vai disputará o segundo turno.
O senador Humberto levantou nesta terça (17), durante participação na Rádio Jornal, a possibilidade do ex-prefeito de São Paulo e ex-candidato à Presidência da República Fernando Haddad No entanto vir ao Recife para participar da campanha. "Haddad talvez venha, chegou a ir a Fortaleza, ao Rio de Janeiro e pode vir até aqui em Pernambuco, também", afirmou Humberto.
Durante agenda nesta terça (17) no Alto Santa Terezinha, Zona Norte do Recife, Marília detalhou uma propostas dentro do Programa Revitalizar, previsto no seu programa de governo: Colocar corrimão em 100% das escadarias dos morros da capital pernambucana. O Programa Revitalizar também prevê obras estruturais, monitoramento permanente dos pontos de risco e extinção de um terço deles nos dois primeiros anos de gestão, caso seja eleita.
"Serão ações permanentes e eficientes para levar segurança, dignidade, cidadania para uma população de 500 mil pessoas que mora nos morros", disse. "Não tem essa história de quem vai receber corrimão ou não. Iremos recuperar todas as escadarias, implantando corrimão em 100% delas, assim como a instalação da iluminação de LED", completou.
A candidata questiona a dificuldade de conseguir informações sobre o número e escadarias registradas e corrimões do Recife. "Como a Prefeitura faz um plano de mobilidade e não tem um número oficial de escadarias disponíveis? Escadaria e corrimão são equipamentos de mobilidade", pontuou Marília. "É preciso lembrar que a escadaria é a rua de muita gente. As pessoas precisam andar nesses lugares sem estrutura nenhuma, sem iluminação, com esgoto exposto, para ir até uma parada de ônibus, por exemplo. Não se pode brincar com a vida e a esperança das pessoas", finalizou a candidata.