COVID-19

Um dia após anuncio de quarentena, vereadores do Recife discutem uso de tratamento sem comprovação contra covid-19

A vereadora Michelle Collins (PP) fez um apelo ao prefeito do Recife, João Campos (PSB), para que a população tenha acesso gratuitamente ao uso de medicamentos, como a ivermectina, para o tratamento precoce da covid-19

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Publicado em 16/03/2021 às 19:27
YACY RIBEIRO/ JC IMAGEM
Tratamento precoce contra covid-19 foi debatido na Câmara de Vereadores do Recife - FOTO: YACY RIBEIRO/ JC IMAGEM
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Um dia após o governador Paulo Câmara (PSB) anunciar o período de quarentena mais rígida em todo o Estado, diante do agravamento nos casos da pandemia da covid-19, o uso de medicamentos sem eficácia comprovada para o tratamento precoce da doença, foi debatido na Câmara de Vereadores do Recife. Durante a sessão remota, realizada nesta terça-feira (16), a vereadora Michele Collins (PP) defendeu o acesso da população a tratamentos com a prescrição de medicamentos como a ivermectina para a fase inicial da doença.

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Ainda segundo a parlamentar, o que vem ocorrendo desde o ano passado é a politização acerca da discussão sobre o tratamento precoce. “Estamos em uma guerra e precisamos estar todos de mãos dadas: a ciência, a medicina, os poderes públicos e a sociedade”, declarou. “Não estou aqui para dizer que essa é a única solução, mas que o tratamento precoce faz com que os casos diminuam sim, a intensidade dos casos diminuem, sim. Isso é comprovado por diversos médicos e especialistas em Pernambuco, de todo o Brasil e de outros países também”, afirmou Michele, citando a França, Índia e Itália, que teriam apresentado bons resultados sobre o uso. 

“Sabemos de casos em que as pessoas vão à unidade de saúde e saem de lá apenas com paracetamol e água. Mas, existem medicações que podem ser usadas profilaticamente, sim, que tem comprovação científica”, declarou. Durante o expediente, Michele leu um manifesto do movimento Médicos pela Vida e fez um apelo ao prefeito João Campos (PSB), para que forneça kits de medicamentos que tenham o objetivo de tratar a doença de forma precoce, nos postos de saúde. 

No entanto, essa tese foi rebatida pela vereadora Liana Cirne (PT), afirmando que essa discussão teria sido superada já que não há eficácia comprovada do uso de ivermectina e de outros medicamentos como a cloroquina e a hidroxicloroquina. “Me preocupa que um debate científico ocupe as tribunas de casas legislativas com viés político. Nós estamos na fase em que foi comprovada a ineficácia do uso destes medicamentos contra a covid-19. O Instituto de Química da Unicamp, após analisar pesquisas recentes, já afirmou que o uso destes medicamentos não são favoráveis para a Sars-Cov-2”, declarou a parlamentar.

“É bom para a lombriga, para vermes, mas não é bom para o tratamento precoce. O que é bom é o isolamento social, o uso de máscara, o uso de álcool em gel e a vacinação em massa. Esse é o tratamento do coronavírus e não é o debate em que possamos nos dar o luxo de ideologizar”, completou Liana, que também fez diversas críticas ao presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), sobre a condução do governo federal no enfrentamento da pandemia.

A vereadora Dani Portela (PSOL) também usou sua fala para criticar a propagação de medicamentos sem eficácia comprovada. “Tratamento precoce para covid-19 é a vacinação em massa, o isolamento social atendendo a garantia de condições mínimas materiais para o conjunto da sociedade. Estudos mostram que o uso de medicações como ivermectina, hidroxicloroquina, elas têm eficácia paliativas para efeitos de quem já está com doença. Não existe tratamento precoce comprovado, a Fiocruz já demonstrou que as pessoas que usaram o tratamento precoce ocupam 90% dos leitos da UTI”, relatou a parlamentar.

Ela também citou a movimentação em torno da quarta troca de comando do Ministério da Saúde, durante a pandemia. A médica cardiologista, Ludhmila Hajjar, recusou o convite para assumir o posto por divergências técnicas, ela inclusive já criticou o uso da cloroquina para tratamento da doença.

No aparte, o vereador Marco Aurélio Filho (PRTB), trouxe o seu relato pessoal explicando que já fez uso da ivermectina e defendeu o tema proposta por Michele Collins, afirmando que a parlamentar teria dados científicos. "Acho que é preciso fazer o bom debate. A vereadora trouxe dados científicos acerca do uso destes medicamentos como preventivos no início da doença, e nisto não há negação da ciência”. afirmou. 

“Todos nós fomos pegos de surpresa. Nós pensávamos que o covid-19 era uma coisa, mas já há mutação. Os próprios profissionais da saúde tem uns que defendem um método de tratamento e outros que defendem outras questões”, pontuou Marco Aurélio Filho. Ele reconheceu que o presidente Bolsonaro agiu erroneamente em relação ao distanciamento social e o não uso obrigatório das máscaras, e citou uma fala do próprio vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB), que aponta as falhas do governo federal sobre a falta de orientação para a população a respeito do uso das máscaras, higienização das mãos e do distanciamento social.

Para Ivan Moraes (PSOL), os dados trazidos pela vereadora do PP, não se tratam de dados científicos, mas da opinião de médicos. O parlamentar lembra que o próprio fabricante da ivermectina não considera que o uso do medicamento possa trazer benefícios contra a covid-19. “Quando dizemos que Bolsonaro é genocida é porque incita a tratamentos não reconhecidos, nega o distanciamento social e o uso de máscaras “.

Em junho de 2020, o Projeto Comprova, coalizão de verificação da qual o JC faz parte, mostrou que a ivermectina está registrada como medicamento contra infecções causadas por parasitas e todos os estudos sobre seu uso para tratamento da covid-19, estavam em fase inicial na época. Passado um ano da pandemia, o medicamento não tem eficácia comprovada e não é reconhecido pela Anvisa para o tratamento da doença. Na época, chegou a circular vários vídeos apontando que a ivermectina poderia curar o coronavírus.

O vereador e médico Tadeu Calheiros (Podemos), fez uma ressalva quanto às experiências de pessoas que fizeram uso destes medicamentos como tratamento preventivo da covid-19. “Me preocupa, tomar para si suas próprias experiências e colocar como verdade absolutas. Tem pessoas do interior que tomam mel com limão a vida inteira e acreditam que cura até câncer. Porque aquela pessoa não teve câncer, não quer dizer que aquele mel com limão cura ou evita o câncer. O efeito placebo, é verdade, funciona em muitos casos, mas não quer dizer que deve ser indicado para o uso”, declarou o parlamentar.

“Propagar isto como medida salvadora e que deveria estar sendo usada como política de estado, dá a falsa sensação de segurança”, complementou.

FUNCIONAMENTO

Em virtude da quarentena decretada pelo Governo do Estado, a Câmara do Recife suspenderá totalmente as atividades presenciais entre os dias 18 e 28 de março, funcionando apenas de maneira virtual. Desde o dia 2 de março, a Casa já tinha limitado o acesso, estabelecendo a presença de até 30% do quadro de funcionários de cada departamento e gabinete.

“Atingimos quase 100% de ocupação nos leitos hospitalares e as medidas de quarentena têm como principal objetivo reduzir essa pressão na rede de saúde. Sabemos que são decisões duras, mas necessárias para que possamos ter menos gente contaminada, controlando as internações e atendimentos. Não há economia sem segurança sanitária para a população”, afirma o vereador Romerinho Jatobá, presidente da Casa.

O vereador Eriberto Rafael, primeiro-secretário da Câmara, destaca que a implantação do sistema de reuniões virtuais e da assinatura digital permite o funcionamento da Casa remotamente, com a tramitação de matérias legislativas e documentos internos pela internet. “As sessões plenárias, reuniões das Comissões e audiências públicas continuam acontecendo virtualmente. A tramitação das matérias legislativas também está garantida com segurança e agilidade”, finaliza.

As reuniões da Casa podem ser acompanhadas por qualquer pessoa em tempo real pelo site da Câmara e pelo canal oficial do YouTube.

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