Com base no estudo “Sob pressão: a liderança das mulheres durante a crise da covid-19”, do economista do Insper Raphael Bruce, realizado em mais de cinco mil municípios que aponta que cidades governadas por mulheres tiveram 43% menos mortes e 30% menos internações por covid-19, o Instituto Alziras lança o programa pluripartidário chamado GPúblicas, no próximo dia 31 de agosto. A ideia é abordar políticas públicas que levam em conta o impacto da pandemia nos municípios brasileiros com olhar transversal sobre os marcadores de gênero e raça.
“Nós tivemos nesse momento de pandemia, os efeitos negativos multiplicados nas populações mais vulneráveis, o que ressalta a importância da administração pública ser cada vez mais inclusiva e diversa. Os governos precisam ser julgados e avaliados pela sua capacidade de resposta a toda essa crise e só vão conseguir se incorporarem os atores - meninas, mulheres, mulheres negras - que enfrentam as maiores formas de discriminação”, afirma Marina Barros, diretora e co-fundadora do Instituto Alziras .
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Entre os recortes analisados pelo estudo nas cidades de pequeno e médio porte, foi possível identificar que as prefeitas tomaram mais medidas não farmacológicas, com a proibição de aglomerações, obrigatoriedade do uso de máscaras, exigência dos acórdãos sanitários nos estabelecimentos, além de limitar o funcionamento dos serviços não essenciais. Apesar de a pesquisa não trazer uma explicação central sobre quais fatores são determinantes para esse tipo de fenômeno, ela abre uma série de reflexões que perpassam pelo papel da mulher na política e nos cargos de poder.
Um levantamento feito pelo Instituto Alziras, sobre o perfil das prefeitas (2017-2020), mostra que as mulheres representam 51% da população brasileira, mas apenas 12% estão à frente das prefeituras. Quando esse recorte analisa as mulheres negras, a situação da representatividade é ainda mais desigual - as mulheres negras são 27% da população, mas governam apenas 3% das prefeituras.
O aumento de 50% da sobrecarga das mulheres neste período de pandemia, somado à falta de investimento dos próprios partidos políticos na formação de programas voltados para suas candidatas - (tanto na esfera executiva quanto na legislativa -, são algumas das barreiras que implicam numa maior representatividade feminina nesses espaços.
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“A violência política de gênero é outro grande obstáculo a ser enfrentado. As mulheres têm suas falas diminuídas, a imprensa olha mais a sua aparência e o aspecto de vida pessoal, deixando de lado os aspectos da vida profissional, e isso é o mais leve do que acontece no Brasil. Muitas prefeitas e parlamentares relataram ameaças de morte”, declara Marina.
Prefeitas no GPúblicas
Segundo Marina Barros, o programa GPúblicas ao partir do olhar transversal dos marcadores de gênero e raça avaliou como alguns municípios tomaram iniciativas cujo foco central foi superar a crise sanitária, econômica e social diante do cenário epidêmico. “Nós fizemos uma seleção de prefeitas e prezamos pelo pluripartidarismo e pela composição regional. Cada cidade e região enfrentam uma realidade diferente. Queremos trazer as especificidades dos municípios de pequeno e médio porte e ouvir essas gestoras”, declara a diretora da Alziras.
Neste primeiro webinário, que terá como tema “Enfrentamento ao Covid-19: práticas exitosas em municípios governados por mulheres”, participam as prefeitas Fátima Pacheco (DEM), de Quissamã (RJ); Marcia Conrado (PT), de Serra Talhada (PE); Eliene Liberato (PSB), de Cáceres (MT); e Francinete Carvalho (PSDB), de Abaetetuba (PA).
No caso do município pernambucano, o Instituto Alziras avaliou os destaques com relação às transparências das informações atualizadas no site específico para vacinação (vacinaserratalhada.com.br). Já foram vacinadas com a primeira dose 53.614 pessoas e com a segunda dose do imunizante contra a covid-19, 22.681 pessoas. Para Marcia Conrado, que está em seu primeiro mandato como prefeita, houve uma série de iniciativas que ajudaram a conter os avanços da doença no município.
“Monitoramos as entradas e saídas de carros em nossa cidade, instalando pontos de barreiras sanitárias. Também implementamos um laboratório municipal para que desse assistência à população quanto às testagens e fomos às ruas, com todo cuidado necessário, para conscientizar a população quanto ao uso de máscaras, álcool e manutenção do distanciamento social”, explica a gestora.
Entretanto, o maior desafio tem sido fazer com que a população entenda a gravidade da pandemia. “Muitos não aceitam a vacinação, não entendem a importância do imunizante”, ressalta Marcia. Ela também defende que as ações de enfrentamento não devem ser fragmentadas, ou seja, as políticas públicas precisam olhar o indivíduo de forma interligada. De acordo com o boletim divulgado pela Secretaria Estadual de Saúde (SES), desta sexta-feira (27), Serra Talhada tem o total de 10761 casos confirmados da doença e 180 óbitos.
Webinário
O programa GPúblicas é uma co-realização do Instituto Alziras, da Fundação Konrad Adenauer e da Porticus em parceria com a Rede de Mulheres Cientistas, Associação do Especialistas em Políticas públicas e Gestão Governamental (ANESP), Confederação Nacional de Municípios (CNM), Associação Brasileira de Municípios (ABM), Frente Nacional de Prefeitos (FNP), Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) e assessoria técnica da Travessia Políticas Públicas.
Três ciclos de formação estão previstos pelo GPúblicas para os meses de agosto, setembro e outubro: combate ao Covid-19, orçamento e finanças municipais, e transparência e governo aberto.
Os ciclos de formação contam com webinários, com a presença de gestoras e especialistas em políticas públicas; laboratórios de soluções, para intercâmbio de experiências e sistematização de boas práticas, com equipes de técnicos das prefeituras; e desenvolvimento e disseminação de cartilhas e demais materiais formativos. As atividades serão totalmente online, por meio das plataformas Zoom e YouTube.
Também estarão presentes neste primeiro encontro virtual, os especialistas Raphael Bruce, autor do estudo que identificou que cidades governadas por mulheres tiveram 43% menos mortes em decorrência da Covid-19; e Edna Maria de Araújo, docente do programa de pós-graduação em saúde coletiva na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e coordenadora do grupo de trabalho sobre racismo e saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO)