A Folha de S. Paulo revelou que o presidente Jair Bolsonaro (PL) revogou pelo menos 25 decretos de pesar pela morte de grandes personalidades brasileiras, como ao ex-governador de Pernambuco, Miguel Arraes (1909-1999), e ao bispo católico Dom Hélder Câmara (1909-1999). O atual governo declarou luto apenas em dois momentos, ao escritor bolsonarista Olavo de Carvalho (1947-2022), nesta semana, e ao ex-vice-presidente pernambucano Marco Maciel (1940-2021), no ano passado.
A medida está inclusa no programa chamado "revogaço", tratado pelo Executivo como uma forma de “desburocratização”. À Folha, a Secretaria-Geral da Presidência informou que tratam-se de decretos "já exauridos, que tiveram efeitos por determinado período [de luto]". De acordo com o governo, a cada 100 dias o governo assina norma que cancela os efeitos de outras assinadas por ex-presidentes. Mais 5.400 decretos perderam validade desde 2019, com o objetivo de "organização e racionalização normativa”.
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"Portanto outras triagens continuam sendo feitas e, consequentemente, outros decretos de mesma temática serão incluídos em futuros projetos de consolidação por revogação de atos que já exauriram seus efeitos", disse a pasta do governo.
O luto oficial é um ato simbólico determinado a partir da morte de personalidades que tiveram uma ação significativa para um país ou para homenagear as vítimas de catástrofes, podendo ter efeito durante até 7 dias. Neste período, a bandeira nacional fica a meio mastro em todo o país.
A cientista política Priscila Lapa explica que a medida não tem uma consequência prática, mas serve para “alimentar narrativas ideológicas”. “Essa geração de factoides é o que alimenta, em grande parte, a base bolsonarista. Não tem ganho com essa revogação, mas ele desagrada quem não o apoia e anima os apoiadores, ganhando comoção do grupo bolsonarista, dizendo por um gesto simbólico quem ele acredita ser importante para o Brasil e quem não”, afirmou.
Ao JC, o secretário da Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara e ex-presidente da Ordem de Advogados do Brasil em Pernambuco (OAB-PE), Henrique Mariano, comentou a retirada da homenagem também ao Frei Damião e afirmou considerar a medida um “ato de profunda ignorância”. “Dom Helder era um líder religioso de grande renome no Brasil e na comunidade internacional, como o Frei Damião. Foram duas pessoas com grande relevância que ao falecerem foram devidamente homenageados pelos presidentes da época. Hoje o presidente Bolsonaro promove esse ato que é um verdadeiro escárnio e de violência com a história do Brasil”, disse.
Lista de decretos revogados
- 14.out.1992 – Severo Fagundes Gomes, política e Conselheiro da República;
- 13.nov.1992 – João Leitão de Abreu, jurista e ex-ministro do STF;
- 5.ago.1993 – Rei Balduíno I da Bélgica;
- 18.set.1995 – Antônio Marques da Silva Mariz, governador do Estado da Paraíba;
- 6.nov.1995 – Yitzhak Rabin, primeiro ministro de Israel;
- 12.fev.1997 – Mário Henrique Simonsen, economista e ex-ministro da Fazenda;
- 18.fev.1997 – Darcy Ribeiro, ex-senador, historiador e cientista político;
- 2.jun.1997 – Pio Gianotti (Frei Damião de Bozzano);
- 20.abr.1998 – Sérgio Roberto Vieira Da Motta, ministro de Estado das Comunicações;
- 22.abr.1998 – Luís Eduardo Magalhães, ex-presidente da Câmara;
- 8.fev.1999 – Hussein Bin Talal , Rei do Reino Hachemita da Jordânia;
- 16.jul.1999 – André Franco Montoro, ex-governador de São Paulo;
- 30.ago.1999 – Bispo Dom Helder Câmara;
- 16.jul.2000 – Barbosa Lima Sobrinho, ex-governador de Pernambuco;
- 10.out.2001 – Roberto Campos, ex-ministro do Planejamento de JK e ex-presidente do BNDES’
- 6.ago.2003 – Roberto Marinho, jornalista e empresário do Grupo Globo;
- 19.ago.2003 – Sérgio Vieira de Mello, ex-representante Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas para o Iraque’
- 20.nov.2004 – Celso Furtado, economista e ex-ministro de Estado;
- 13.ago.2005 – Miguel Arraes, ex-governador de Pernambuco;
- 2.out.2006 – vítimas de acidente do voo 1907, da Gol;
- 30.abr.2007 – Octavio Frias, empresário do Grupo Folha;
- 17.jul.2007 – vítimas do acidente do voo 3054, da TAM;
- 20.jul.2007– Antônio Carlos Magalhães, Júlio César Redecker e Nélio Silveira Dias, ex-senador e ex-deputados federais, respectivamente;
- 11.dez.2007 – Ottomar Pinto, ex-governador de Roraima.