Nascido sob o signo das águas, o Recife ironicamente chegou perto de desaparecer sob elas. No próximo mês de julho completam-se 40 anos da maior tragédia natural da história da cidade: a enchente que varreu 80% de seu território, matando 104 pessoas, deixando 350 mil desabrigados e um prejuízo estimado, à época, em 1,5 bilhão de cruzeiros.
A famosa cheia de 1975 colocou o Recife de joelhos. Foram 31 bairros e 370 ruas atingidos pelo transbordamento do Rio Capibaribe, por conta das fortes chuvas. Não à toa, os bairros que ficam na bacia do curso-d’água – Caxangá, Iputinga, Cordeiro, Casa Forte, Afogados, Madalena entre outros – foram os mais atingidos. Ruas inteiras ficaram embaixo d’água, houve desabamentos, milhares de flagelados, e o pior: vidas, de todas as classes sociais, foram interrompidas.
Os laudos do Instituto de Medicina Legal (IML), que estão sendo digitalizados e organizados pela equipe do Arquivo Público, ajudam a reconstruir o drama e a contar histórias sobre as fatídicas horas de fúria do rio, entre a madrugada do dia 17 e o início da tarde do dia 18 de julho daquele ano.
A temível enchente matou de várias formas. Foram identificados 32 afogamentos, 13 casos de morte súbita – a maioria por ataque cardíaco – 28 mortes naturais (muitas por doenças gastro-intestinais, causadas pelo consumo de água contaminada) e até mesmo quatro suicídios, possivelmente motivados pelo pânico de ver a cidade sob as águas.