A morte voltou a assombrar as madrugadas chuvosas nos morros do Grande Recife. Enterrou nesta segunda-feira (30), sob escombros, quatro vidas: duas mulheres e duas crianças. Uma contabilidade cruel que, faz tempo, precisava já ter sido estancada. Foi, mais uma vez, a face mais dolorosa de um temporal que fez a metrópole parar. As seis horas de chuva ininterruptas que castigaram, principalmente, as vizinhas Recife e Olinda (onde as mortes foram registradas), reproduziram as cenas caóticas de sempre: carros submersos, ruas alagadas, casas inundadas, moradores desabrigados, medo, descaso, revolta.
Os conhecidos engarrafamentos aconteceram só nas primeiras horas da manhã, quando motoristas desavisados ainda se arriscaram a enfrentar ruas transformadas em rios. Como um toque de recolher, o temporal foi, aos poucos, esvaziando a cidade. Escolas e universidades cancelaram aulas, repartições encerraram expediente, uma ordem silenciosa parecia determinar: ninguém sai de casa. E, ao final de mais um dia de desalento, uma população cansada de chorar seus mortos e reviver velhas tragédias se perguntava: até quando?
Não é uma conta fácil de lidar. Só no Recife, nos últimos 16 anos, deslizamentos de barreiras em áreas de risco sentenciaram à morte 40 pessoas. Essa é uma guerra antiga de quem vive nos morros da capital. Os anos 90, os mais trágicos, foram registradas inacreditáveis 88 mortes. Aconteciam às dezenas. Num arrastão de barro e descaso que parece não ter fim. Da década de 80 para cá, só por três vezes este ciclo perverso foi interrompido: entre os anos de 2001 e 2002, no ano de 2007 e, mais recentemente, entre 2012 e 2014. No ano passado, foi necessário chorar novamente. Três mortes assustaram os moradores da Bomba do Hemetério e do Ibura, nas Zonas Norte e Sul da cidade.
Tem pouco mais de um mês, o Recife enterrou a primeira vítima de deslizamento deste ano. Agora, é uma garota de apenas 4 anos que perde a vida, soterrada pela irresponsabilidade de uma construção irregular. Em Olinda, onde os estragos foram ainda maiores, a dor destroçou uma família inteira: morreram mãe, filho e sobrinha. Outras três pessoas ficaram feridas.