Turistas em Uber são ameaçados por taxistas e perdem voo no Recife

"Você não está chamando um Uber, não é? Sabia que é um transporte clandestino? Você pode ser agredido." Foi o que o turista mineiro Felipe Ferreira, 32 anos, ouviu de um taxista no início da tarde desta quarta-feira (27), enquanto aguardava um carro chamado pelo aplicativo para ir ao aeroporto com a esposa para ir a Fernando de Noronha, onde comemorariam o aniversário dela, nesta sexta (29). O casal foi perseguido pelo taxista e perdeu o horário do voo.

O turista, que é advogado, contou que estava esperando o motorista do Uber em frente ao Hotel Jangadeiro, na Avenida Boa Viagem, na Zona Sul do Recife, onde ficou hospedado essa noite, quando foi abordado pelo taxista, que questionou se ele estava usando o aplicativo. Felipe é usuário do serviço em Belo Horizonte, onde mora, e respondeu que sim. Começaram, então, as ameaças. "Enquanto colocava as malas no carro, o taxista ficou tirando fotos. Falei até para o motorista do Uber que ele daria problemas", relatou.

O casal deixou o hotel para o aeroporto, um percurso de cerca de cinco quilômetros. O carro seguiu pela Rua Antônio Falcão e pela Simone Rosa para pegar a Ribeiro de Brito e o Viaduto Tancredo Neves. Porém, foi seguido pelo taxista durante todo o percurso. "Ele ficava freando em cima, fazendo manobras arriscadas, xingando e chamando outros taxistas para a perseguição também", contou o motorista Rodrigo Pedrosa. O Uber, decidiu, por isso, retornar pela Rua Ernesto de Paula Santos.

"Em certo momento, ele chegou a dar ré em um ponto muito movimentado e quase bateu em duas motos. O tempo inteiro ficava falando em direção ao nosso carro e gesticulando em tom de ameaça. Ficavam gritando: A gente vai pegar você, já estão esperando no aeroporto!", afirmou o turista. "Nunca esperava isso", lamentou.

Temendo agressões, o motorista do Uber parou em frente à Delegacia de Boa Viagem. O taxista parou de ameaçá-lo e seguiu em frente. O cliente desceu e tentou pegar outro carro do Uber para ir ao aeroporto, mas já eram 13h40 e o check-in para o voo que sairia meia hora depois havia sido encerrado.

Tanto o motorista do Uber quanto o turista estiveram registraram o Boletim de Ocorrência por causa da ameaça e do constrangimento. O advogado pretende entrar na Justiça contra o taxista devido aos prejuízos - incluindo novas passagens para Noronha, as taxas de não comparecimento para o voo desta quarta-feira, mais uma noite no Recife e a diária na pousada na ilha, que já havia sido paga. O casal vai a Noronha nesta quinta (28) e, de novo, vai pedir um Uber. "Nunca mais pego um táxi, não tenho confiança", disse Felipe. O mineiro já esteve no Recife duas vezes só este ano e havia usado o Uber aqui, mas sem nenhum problema até então. "Acho o serviço mais voltado ao cliente. Além da facilidade, tem o conforto e o bom atendimento. Os carros são melhores e os motoristas, mais bem preparados."

O turista voltou do aeroporto para a delegacia de Uber e, conversando com o motorista, contou o que havia acontecido e informou a placa do táxi. Minutos depois, enquanto Felipe prestava queixa, o Uber Múcio Herbert viu o veículo na Rua dos Navegantes. O taxista conversava com outros três profissionais. "Isso é o que eles sempre fazem."

O JC Trânsito procurou a associação e o sindicato que representam os taxistas, mas os presidentes das duas entidades, Sandro Cavalcanti e Everaldo Menezes, respectivamente, estavam em São Paulo para acompanhar a votação do projeto de lei sobre o funcionamento do Uber lá e não ficaram sabendo sobre o ocorrido no Recife.

OUTROS CASOS - Essa não foi a primeira denúncia de confusão entre taxistas e Ubers no Recife, às vezes envolvendo até passageiros. No último fim de semana, um estudante que não faz parte do aplicativo foi confundido com um motorista do serviço e agredido por taxistas no bairro da Torre, na Zona Oeste da cidade. O promotor Humberto Graça, à frente da promotoria de Transporte, afirmou que o Ministério Público de Pernambuco (MPPE) vai pedir cassação da licença dos taxistas que se envolverem em confusão.

Dono de um carro de modelo Dodge, não muito adotado no Recife, o motorista Rodrigo Pedrosa ainda não havia sofrido represálias de taxistas por ser Uber. "Agora vou ter que ter cuidado redobrado. Meu carro começou a ser visado, ele (o taxista) anotou a placa. Vou até refletir se vale a pena continuar trabalhando", disse.

Para a Prefeitura do Recife, o aplicativo é considerado ilegal. Em outubro do ano passado, foi sancionada uma lei municipal que restringe o uso de aplicativos de táxi e proíbe a atuação de motoristas e veículos que não atendam à lei federal 12.468/2011, que regulamenta a profissão de taxista.

É a mesma legislação usada pela Uber como defesa da atividade da empresa, pois só serviria para taxistas e não se aplicaria aos parceiros da empresa. As divergências de interpretações da lei dão espaço para que a empresa atue no Recife – onde, inclusive, tem CNPJ e paga Imposto Sobre Serviço (ISS), tributo que aplicativos como EasyTaxi e 99Taxis não recolhem aqui.