O Brasil que Jorge Amado escreveu

Estereótipos que o escritor baiano ajudou a perpetuar continuam formando a imagem rasa de Brasil que se tem no exterior
Renato Contente
Publicado em 04/08/2012 às 3:53
Estereótipos que o escritor baiano ajudou a perpetuar continuam formando a imagem rasa de Brasil que se tem no exterior Foto: NE10


Um rápido exercício sociológico pode ser feito na ferramenta de imagens do Google. Ainda que de maneira – perigosamente – superficial, a associação de nomes a imagens traçada pelo site nos traz um panorama geral de como uma nação é percebida por olhos estrangeiros. A busca pelo termo “Brazilian people”, por exemplo, traz à tela uma uma profusão de rostos sorridentes – alguns na praia, outros em ambientes de aparência humilde, todos sorrindo. Trocando por “Brazilian girls”, as opções se restringem a mulheres que exalam uma sensualidade cor de bronze em biquínis diminutos. Em algumas centenas de fotos, eis o resumo visual do “Brazil”.

Buscas virtuais à parte, a essência destas imagens habitam o imaginário gringo sobre o País desde o início de sua formação. Parte relevante da produção cultural brasileira – consequentemente exportada como cartão de visitas dos trópicos – reitera a representação de um País virtuoso, repleto de confete, cordialidade e mulatas exuberantes. Jorge Amado, na posição de um dos escritores brasileiros mais lidos do mundo, foi um dos perpetuadores recentes desta versão compactada de Brasil/Bahia. Da brejeira e sensual Gabriela ao malandro Vadinho, o baiano materializou personagens memoráveis que levam consigo, aonde quer que sejam lidos, o Brasil visto aos olhos de seu criador

“Em suas obras, Jorge Amado tende a transformar a diversidade em um estereótipo, sobretudo nas personagens femininas. A mulher brasileira, representada pela mulata, é reduzida a um arquétipo, fácil de ser assimilado por outras culturas”, reflete Lourival Holanda, professor de letras da UFPE. “Em romances como Gabriela..., apesar de haver personagens femininas fortes e decididas – até mais do que os homens –, não há reinvidicação do discurso feminino”, explica.

A representação exótica que se tem da mulata ronda o imaginário coletivo desde a época em que o Brasil foi colônia portuguesa. Em Casa-grande e senzala, um dos provérbios evocados por Gilberto Freyre traduz esse sentimento: “A negra no fogão, a mulata na cama e a branca no altar”. Os homens brancos, para preservar a castidade das mulheres livres e sem apelar ao encanto das escravas, não resistiam às mulatas, união das características já familiares da mulher europeia com a suposta “lascívia” do sangue negro. Assim, para se ausentar de culpa, o novo habitante do País vai justificar suas pulsões extraconjugais através da “imoralidade e irresistível atrativo das mulheres de cor”. Ligando extremos como o Brasil Colônia e as imagens do Google, conseguimos ver as inúmeras conexões que podem ser feitas dentro do amplo universo de Jorge Amado.

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