Um pouco de sardinha e uma panela de feijão foi o almoço, na última quarta-feira, de ex-trabalhadores da Alusa alojados em Gaibu, no Cabo de Santo Agostinho. A comida no prato naquele dia foi garantida pela generosidade da arrumadeira Silvinha. Contratada de uma empresa de limpeza, que atende às repúblicas, não aguentou ver a situação de penúria “dos meninos”. Os homens de farda, que ajudaram a erguer a Refinaria Abreu e Lima, agora vivem de caridade. Sem receber salários desde setembro, esperam pela intervenção da Justiça para voltar a seus Estados de origem ou retomar suas vidas por aqui.
Desde o dia 6 de novembro, a Alusa Engenharia saiu da obra da Petrobras, alegando falta de pagamento do contrato e deixando uma dívida trabalhista calculada em R$ 137 milhões com 4.700 funcionários. O valor inclui salários, rescisões e repasses de FGTS e INSS. Desse total, R$ 60 milhões foram depositados em juízo pela Petrobras, dentro de um processo movido pelo Sindicato dos Trabalhadores na Construção Pesada em Pernambuco (Sintepav). Ontem, representantes do sindicato e um advogado da Alusa participaram de reunião no Ministério Público do Trabalho (MPT), mas sem boas notícias para os operários.
“Como a Alusa não demitiu os funcionários, o Sintepav pediu que fosse reconhecida uma rescisão indireta, numa tentativa de garantir a baixa nas carteiras de trabalho e o saque do FGTS. Mas a Alusa alegou que só vai reconhecer a rescisão se a Petrobras reconhecer que deve a ela”, explica a assessoria jurídica do Sintepav. Na prática, isso quer dizer que nem os R$ 60 milhões assegurados no processos poderão ser pagos para amenizar a situação dos operários.
“Na verdade eles (Petrobras e Alusa) estão fazendo um jogo de empurra-empurra. Enquanto estiver vigorando a liminar que desbloqueou o dinheiro da estatal, eles não vão se mexer para pagar nada”, acredita a procuradora do trabalho, Débora Tito. No último dia 28, o juiz Hélio Galvão, do Tribunal Regional da 6ª Região (TRT/6ª), desbloqueou R$ 126,6 milhões que haviam sido retidos das contas da Petrobras por determinação da juíza Josimar Mendes, da 1ª Vara do Trabalho de Ipojuca.
Na última terça-feira, o jurídico do Sintepav ingressou com um pedido de revogação da liminar do juiz Hélio Galvão. Ao longo da semana, os trabalhadores realizaram protestos em Suape e em frente à sede da Petrobras, em Boa Viagem. Na quarta-feira, a Justiça determinou que os operários não poderão fazer novas manifestações no prédio local da petrolífera, sob pena de pagamento de multa pelo sindicato da categoria. No ato da segunda-feira, até o Batalhão de Choque da Polícia Militar se compadeceu da situação dos trabalhadores e recuou quando ia desmobilizar o grupo.
DESESPERO
“Eles nos roubaram nosso sorriso, nossa alegria de viver. Ao invés de estar aqui com a família precisei mandar minha mulher e meus dois filhos para junto dos pais dela em Maraial (Zona da Mata de Pernambuco). Devolvi a casa porque já estava com dois meses de aluguel atrasado e vim pra esse alojamento em Gaibu. Estávamos felizes porque a juíza tinha bloqueado o dinheiro e agora voltamos a ficar sem nada. O que esse juiz (Hélio Galvão) tem na cabeça? Nossos filhos são inocentes e não merecem passar fome”, diz, às lágrimas, o lixador Samuel de Lima Silva, 24 anos. O operário paulista desembarcou em Pernambuco em 2008 e já trabalhou no Estaleiro Atlântico Sul e na PetroquímicaSuape.
O mecânico-montador maranhense, José de Ribamar, 27, reclama das condições nos alojamentos. “Fomos abandonados aqui. Há um mês a empresa responsável pela administração (Cambraia) não compra material de limpeza e suprimentos. Estamos dependendo da caridade das pessoas para comer. Engenheiros e técnicos da Alusa estiveram aqui e trouxeram quentinhas, garrafões de água mineral e cesta básica. Mas a comida acaba e não temos o que fazer. O sindicato também tem passado por aqui e deixado alguns mantimentos”, diz.
O mineiro France Saturno conta que está faltando até água mineral nos alojamentos. Estamos tomando água da torneira. Não estamos pedindo nada a ninguém. Só queremos nosso dinheiro para voltar para casa. Pai de cinco filhos, o baiano Fernando Santos, 36, diz não entender “como a Justiça abandona o trabalhador”. “Esse juiz não teve coração. Estou comendo graças à ajuda dos vizinhos, que me dão um prato de comida”, revolta-se.
* Colaborou Leonardo Spinelli