“Eis a verdade, amigos: desde 50 que o nosso futebol tem pudor de acreditar em si mesmo”. O escritor, dramaturgo e jornalista pernambucano Nelson Rodrigues batizava o pessimismo da população brasileira com a seleção de “Complexo de vira-lata”. Tal sentimento derivava do trauma da derrota para o Uruguai no jogo decisivo de 1950, o famoso Maracanazo, e da eliminação para a Hungria nas quartas de final do Mundial de 1954 na Suíça. Foi assim, buscando afirmação perante a torcida e adversários, que a Canarinho desembarcava na Suécia para a Copa de 1958. “Se o Brasil vence na Suécia, se volta campeão do mundo! Ah, a fé que escondemos, a fé que negamos, rebentaria todas as comportas e 60 milhões de brasileiros iam acabar no hospício”, disse ainda Nelson Rodrigues.
Na luta pelo primeiro título mundial, o Brasil caiu no chamado “grupo da morte”, junto com União Soviética, Inglaterra e Áustria. A equipe conseguiu quebrar a desconfiança e seguiu para as partidas eliminatórias sem levar um gol e como líder do Grupo 4. Venceu os austríacos por 3x0, ficou no 0x0 com os ingleses e derrotou os soviéticos por 2x0. Daí em diante, a magia do futebol de Pelé, Garrincha e companhia começou a desfilar nos gramados. Ao lado da dupla, nomes como Zagallo, Didi e o pernambucano Vavá foram determinantes na campanha. Nas quartas, vitória sobre País de Gales com gol do rei, o primeiro dele em Copas. Já na semifinal, uma apresentação de gala. Com três de Pelé, o Brasil goleou a França por 5x2, no estádio Rasunda. O placar e o local do jogo deram sorte, tanto que na final o mesmo resultado levou ao título contra os suecos, donos da casa, com dois gols de Pelé, dois de Vavá e outro de Zagallo. O escrete nacional, enfim, conquistava a Copa do Mundo.
Após a alegria de vencer de forma inédita uma Copa, a seleção foi para um novo desafio, dessa vez no Chile e sob o comando de Aymoré Moreira no lugar de Vicente Feola. E se a equipe montada em 1958 deu certo, por que não repeti-la? Com a filosofia de “time que ganha, não se mexe”, a base foi mantida e seguiu para a estreia diante do México, derrotado por 2x0, gols de Zagallo e Pelé.
Mas, dessa vez, o roteiro teve algumas armadilhas. Logo na segunda partida da fase de grupos, Pelé sofreu um estiramento na virilha no empate por 0x0 contra a Checoslováquia e foi desfalque até a decisão. Porém, a saída do rei não tirou o brilho de um grupo recheado de estrelas. Liderados por Garrincha, Amarildo e Djalma Santos, o time fechou a primeira fase na liderança do Grupo 3.
Em seguida, despachou os ingleses nas quartas de final por 3x1, com show de Garrincha e os anfitriões chilenos por 4x2 na semifinal. Afiados na hora de colocar a bola na rede, Vavá e Garrincha anotaram todos os gols dessas duas fases, feito que os ajudou na briga pela artilharia do torneio.
Na final, um adversário já conhecido reapareceu. Únicos que conseguiram conter o ataque brasileiro, os checos surgiram na final após eliminarem Hungria e Iugoslávia. No início do jogo, a taça parecia escapar das mãos da equipe verde-amarela quando o meia Masopust marcou aos 15 minutos. Substituto imediato de Pelé, Amarildo (o “Possesso) aproveitou o momento para marcar seu nome na história e empatar dois minutos depois. No segundo tempo, Zito e Vavá aumentaram o placar para 3x1 e trazer a Jules Rimet de volta ao país. Com o bicampeonato, o Brasil empatava em números de Copas com Itália e Uruguai.
Inventores do futebol, os ingleses receberam uma Copa do Mundo pela primeira e até hoje única vez em 1966. Para os brasileiros, empolgados após o bi, foi uma reunião dos consagrados campeões de 1958 e 1962 com jovens promissores como Tostão e Jairzinho. Porém, a seleção sentiu o gosto amargo de uma eliminação na fase de grupos, com vitória apenas na estreia sobre a Bulgária. Na sequência, derrota por 3x1 contra a Hungria na despedida de Garrincha. Diante de Portugal, Pelé foi caçado em campo e o desfecho foi melancólico. O craque saiu se contorcendo de dor e levou junto com ele as esperanças da equipe. Eusébio, que viria a ser o artilheiro da Copa, fez dois e deu números finais à partida: 3x1.
A final, disputada por Inglaterra e Alemanha Ocidental ficou famosa por ser um dos jogos mais polêmicos da história. Ao fim dos 90 minutos, o placar mostrava 2x2 e as equipes seguiram para a prorrogação. Ainda na primeira etapa, Hurst chutou no travessão e a bola quicou perto da linha. O árbitro validou o gol que deixou os anfitriões na frente. Empurrados por quase 97 mil pessoas em Wembley, os ingleses fizeram o quarto e sagraram-se campeões, para delírio da sua torcida.