Chegou por uma amiga a última mensagem enviada por Jander Andrade Maciel ao irmão mais novo Janderlan. Chorando, o mais velho pediu, no domingo passado, que tomasse conta da mãe e mandasse abraços a parentes que há tempos não falava. Preso há um ano no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), Maciel pressentiu a eclosão da briga que estava por vir, mas não conseguiu escapar. Foi umas das 56 vítimas.
Na tarde dessa quarta-feira (4) Janderlan embargava a voz quando indagado sobre o horário do sepultamento do irmão. Poderia chegar a qualquer momento.
Para ele, a memória permanecerá fresca: há dois anos trabalhando no Cemitério Nossa Senhora Aparecida, no bairro Tarumã, zona oeste de Manaus, o jovem não pretende deixar o local. Aguardando notícias sobre a chegada corpo do irmão, ele continuava vendendo banana frita em uma grande bacia metálica sobre a sua cabeça.
"O meu ponto de trabalho agora é uma recordação", disse à reportagem na tarde de ontem. Para ele, a condenação por estupro que manteve exato um ano o irmão na cadeia era uma "farsa". "Ele nunca teve envolvimento com facção nem nada. Não era esse tipo de pessoa de crime também", completou. Para ele, mesmo sabendo que a briga iria estourar, não havia como Maciel escapar. "Se falasse, corria o risco de morrer antes mesmo", disse o jovem. Janderlan sustenta, no entanto, que "o governo estadual poderia ter evitado tudo isso", se tivesse provido uma melhor segurança no sistema carcerário.
O local de trabalho se transformou em reduto de tristeza também para a dona Jessi, funcionária da limpeza do cemitério, que sepultou na tarde desta quarta-feira (5) o filho Errailson Ramos de Miranda, preso desde 2009 sob acusação de estuprar e matar uma criança. O enterro no fim da tarde foi marcado pela comoção de amigos e familiares que vestiam uma camisa relembrando a paixão de Miranda pelo Flamengo - o time carioca que conta com ampla torcida na capital e nas principais cidades amazonenses.
Durante todo o dia de ontem, ao menos oito vítimas do massacre foram sepultadas no cemitério público de Tarumã, um dos maiores da cidade. Seis enterros ocorreram na parte da manhã, sob uma leve chuva. À tarde, outros dois ocorreram sob um sol intenso. As cerimônias de despedida demoravam em média 20 minutos e eram marcadas pelo silêncio, em sua maioria. Sobre as covas das vítimas do massacre, uma coroa de flores com uma faixa onde se lia "homenagem do governo do Estado do Amazonas".
No fim da tarde, subiu para 14 o número de corpos liberados pelo Instituto Médico-Legal (IML) para retirada das famílias. No total, 39 já foram identificados e passam por finalização de exames no local para serem velados e sepultados.
Do Compaj, além de Errailson, já foram liberados: Arthur Gomes Peres Júnior, Dheick da Silva Castro, Francisco Pereira Pessoa Filho, Magaiwer Vieira Rodrigues, Rafael Brasão Gonçalves, Raijean da Encarnação Medeiros, Felipe de Oliveira Carneiro, Rômulo Harley da Silva e Edney Gomes Ferreira. De Puraquequara: Andrei Chaves de Moura Castro, Kevin Klive Silva Ramos, Paulo Henrique Santos