O Conselho de Ética da Câmara abriu nesta terça-feira (16) processo de quebra de decoro parlamentar contra o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) por sua declaração, no plenário da Câmara, de que não estupraria a colega Maria do Rosário (PT-RS) porque ela não merecia.
Como o Congresso entra em recesso na próxima semana, a continuidade do pedido de cassação será definida pelo comando da Câmara.
O presidente do conselho, Ricardo Izar (PSD-SP), encaminhou um questionamento ao presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), solicitando uma definição sobre o andamento da representação.
A dúvida é se o processo será arquivado com o fim deste mandato ou se ele será retomado volta dos trabalhos do Congresso, a partir de fevereiro. Não houve uma posição da cúpula da Câmara.
Na sessão, o órgão disciplinar sorteou os deputados Marcos Rogério (PDT-RO), Ronaldo Benedet (PMDB-SC) e Rosane Ferreira (PV-PR) como possíveis relatores. O conselho definirá nos próximos dias quem ficará com o processo.
O pedido de cassação de Bolsonaro foi protocolado por PT, PC do B, PSB e PSOL. Os partidos alegam que ele deve perder o mandato por ter quebrado o decoro ao agredir a colega incentivando o estupro.
Bolsonaro atacou a petista ao rebater discurso feito por Rosário na semana passada, no qual defendeu a Comissão da Verdade e as investigações de crimes da ditadura militar. Ele reeditou uma fala que disparou em 2003 contra Maria do Rosário, durante uma entrevista no Salão Verde, quando discutia a redução da maioridade penal.
Ele reagiu dizendo que não a estupraria porque ela não merecia. Irritado, o deputado chamou a colega de "mentirosa, deslavada e covarde". A declaração de Bolsonaro provocou fortes reações na Casa, sobretudo na bancada feminina.
Para os partidos que assinam a representação, Bolsonaro tem sido "extremamente misógino, preconceituoso, sexista e homofóbico, no exercício do seu mandato parlamentar" e, com isso, "desrespeita a Constituição, o Código de Ética e Decoro Parlamentar e o regimento interno da Câmara", quebrando o decoro parlamentar.
DEFESA - Bolsonaro apresentou nesta terça sua defesa preliminar ao conselho. No texto de sete páginas, o deputado defende o arquivamento da representação. Ele alega que não cometeu irregularidades, que tem a imunidade parlamentar garantida aos congressistas em plenário e que virou alvo de partidos aliados da presidente Dilma Rousseff que querem utilizar o caso para desviar o foco das denúncias de irregularidades contra a Petrobras.
Durante sua participação na sessão, ele destacou que o "Congresso não é um convento". Ele argumenta que não poderia ser julgado duas vezes pelo mesmo episódio, sendo que em 2003 a Mesa Diretora da Câmara arquivou representação pela discussão com a deputada.
"Ela interferiu numa entrevista e acabou se vitimizando",disse.
O deputado minimizou o fato de o Ministério Público Federal o ter denunciado ao STF (Supremo Tribunal Federal) pelo caso ao incitar estupro. "A procuradoria não julga, ela denuncia", disse.
"Eu falei que não merece [ser estuprada] e vocês estão me crucificando. Se eu falasse que ela merece eu seria linchado. A campanha dela [Maria do Rosário] há poucos meses era "Eu não mereço ser estuprada". Ela usou a frase que usei", disse.
CONFUSÃO - Em 11 de novembro de 2003, Bolsonaro e Maria do Rosário tiveram um bate-boca semelhante no Salão Verde da Câmara. Após o deputado conceder entrevista defendendo a redução da maioridade penal, a petista, contrária à proposta, o interpelou. "Se a senhora é contra a redução da maioridade, pega aquele estuprador de São Paulo (que matou um casal de estudantes) e leva para a sua casa", disse Bolsonaro.
Nisso, Maria do Rosário disse que "O senhor é que promove o estupro". O deputado rebateu, dizendo que ela o acusou de ser estuprador e disse a frase repetida 11 anos depois: "Jamais iria estuprar você porque você não merece". Depois, ele a empurrou e chamou de "vagabunda". A discussão terminou com Maria do Rosário em lágrimas.
Houve representação contra Bolsonaro, arquivada pela Mesa. O deputado teve inúmeras representações semelhantes arquivadas por suas declarações polêmicas --ele é abertamente homofóbico, já chamou a mesma Maria do Rosário de "vagabunda" quando ela era ministra dos Direitos Humanos em 2008, insinuou que a presidente Dilma Rousseff é homossexual e fez ataques diversos a integrantes dos governos petistas.
Dois casos chegaram ao Conselho de Ética, mas foram arquivados.
Bolsonaro segue com suas polêmicas porque o artigo 53 da Constituição define parlamentares em exercício do mandato "invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos". Assim, é praticamente impossível cassá-lo.