Comissão da Verdade analisa documentos inéditos durante sessão sobre Operação Cacau

Ação promovida a partir de 1973 aconteceu de forma simultânea em três Estados Brasileiros
Mariana Mesquita
Publicado em 23/07/2015 às 21:49
Ação promovida a partir de 1973 aconteceu de forma simultânea em três Estados Brasileiros Foto: Foto: Mariana Mesquita/JC Imagem


Documentos inéditos da “Operação Cacau”, promovida por agentes da ditadura militar simultaneamente na Bahia, São Paulo e Pernambuco, foram entregues hoje (23/07) a sobreviventes de tortura e familiares de dois militantes da Ação Popular Marxista-Leninista (APML), assassinados em 1973. As mortes estão ligadas a outros assassinatos em cadeia a partir de junho daquele ano, inclusive aos dos desaparecidos políticos pernambucanos Eduardo Collier, Humberto Câmara Neto e Fernando Santa Cruz. 

Na ocasião, a Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara (CEMVDHC) colheu os depoimentos dos jornalistas Oldack Miranda, testemunha das torturas aplicadas a Gildo Macedo Lacerda, e Mariluce Moura, viúva de Gildo, que estava grávida da filha Tessa ao ser detida junto com o marido. Marília, irmã de José Carlos Novaes da Mata Machado, também esteve presente na audiência pública, em que recordaram a farsa do chamado “Teatro da Caxangá” e cobraram do governo brasileiro explicações sobre o paradeiro dos corpos desaparecidos. Até hoje, apenas José Carlos foi localizado. 

José Carlos foi preso em São Paulo, em 19 de outubro de 1973, e Gildo, em Salvador, no dia 22. Segundo o relato explicitado à imprensa, os dois já tinham sido mortos quando o chefe do Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) do então IV Exército, Antônio Cúrcio Neto, utilizou um estratagema para justificar o fato de terem sido transferidos de outras cidades para o Recife. Numa prática relativamente comum na época, no dia 31 os agentes simularam um tiroteio com mortes, no cruzamento da avenida Caxangá com a avenida Polidoro, forjando também uma situação comprometedora para os envolvidos. A nota oficial, divulgada na época nos jornais e na televisão, dizia que os dois estavam indo se encontrar com um terceiro “subversivo” de codinome Antônio, que “abriu fogo contra os companheiros, acusando-os de traidores”. Antônio, cujos restos mortais também não foram encontrados, ao que tudo indica seria o político Paulo Stuart Wright, que havia sido sequestrado dias antes, num caso que gerou repercussão internacional.

“A Operação Cacau buscava desmontar a antiga APML e promoveu prisões e assassinatos de forma simultânea. Sempre se questionou a razão pela qual essas pessoas tinham sido trazidas para o Recife, mas isso se explica pelo fato de que a coordenação do IV Exército ficava aqui, onde havia inclusive um aparato permanente e sofisticado para promover torturas. A Comissão de Pernambuco tem a competência para investigar casos de pernambucanos ou de outras pessoas que foram mortas neste Estado, o que sem dúvida nenhuma foi o caso de Gildo e José Carlos”, explicou o secretário geral da CEMVDHC, Henrique Mariano. Ele frisou ainda que “o sistema de repressão era totalmente interligado e ligado diretamente à Presidência da República, através do Sistema Nacional de Informação. De certa forma, estamos fazendo também um trabalho em rede. As várias comissões trabalham em regime de cooperação e isso tem dado um resultado bastante eficiente. É um grande quebra-cabeça que está sendo montado aos poucos, e ouvir atores da época, como fizemos hoje, é fundamental para este processo”.


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