Temer tem bom senso e vai se afastar de quem defende impeachment, prevê Pezão

O governador, aliado de longa data da presidente, disse não crer em uma ruptura entre ela e o vice, e afirmou ainda que Temer não trabalha para assumir o lugar de Dilma
Do Estadão Conteúdo
Publicado em 08/12/2015 às 12:00
O governador, aliado de longa data da presidente, disse não crer em uma ruptura entre ela e o vice, e afirmou ainda que Temer não trabalha para assumir o lugar de Dilma Foto: Foto Carlos Magno GERJ


No dia seguinte à divulgação da carta enviada pelo vice-presidente Michel Temer (PMDB) à presidente Dilma Rousseff com queixas à forma como é tratado no governo, o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) disse nesta terça-feira (8) que Temer é "uma das pessoas com mais bom senso no País" e que acredita que o vice vá se afastar dos peemedebistas que trabalham pelo impeachment de Dilma.

"Uma certa hora ele (Temer) vai ver que muitos dos que estão no ouvido dele soprando pela divisão, pela intriga, fazem um desserviço ao País", declarou Pezão, depois de participar da abertura de um seminário na Fundação Getulio Vargas.

O governador, aliado de longa data da presidente, disse não crer em uma ruptura entre ela e o vice, e afirmou ainda que Temer não trabalha para assumir o lugar de Dilma: "Vice é para ajudar a governabilidade, ajudar a presidente a governar." 

Pezão defendeu que o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) se afaste do cargo de presidente da Câmara para se defender da acusação de ter contas bancárias na Suíça não declaradas à Receita Federal. "Sou favorável que ele (Cunha) se afaste da presidência (da Câmara) e tenha direito de se defender. Ele não pode usar o cargo para ficar adiando as votações. O cargo de presidente da Câmara, do Senado, é de todo mundo. Não pode usar o cargo, tem que pensar no País", afirmou Pezão.

 

Leia a carta na íntegra:

Senhora Presidente,

"Verba volant, scripta manent".

 

Por isso lhe escrevo. Muito a propósito do intenso noticiário destes últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas no Palácio. Esta é uma carta pessoal. É um desabafo que já deveria ter feito há muito tempo.

Desde logo lhe digo que não é preciso alardear publicamente a necessidade da minha lealdade. Tenho-a revelado ao longo destes cinco anos. Lealdade institucional pautada pelo art. 79 da Constituição Federal. Sei quais são as funções do vice. À minha natural discrição conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.

Entretanto, sempre tive ciência da absoluta desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB. Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e partidário ao seu governo.

Basta ressaltar que, na última convenção, apenas 59,9% votaram pela aliança. E só o fizeram, ouso registrar, porque era eu o candidato à reeleição a vice.

Tenho mantido a unidade do PMDB apoiando seu governo, usando o prestígio político que tenho advindo da credibilidade e do respeito que granjeei no partido.

Isso tudo não gerou confiança em mim. Gera desconfiança e menosprezo do governo.

 

Vamos aos fatos. Exemplifico alguns deles.

 

1. Passei os quatro primeiros anos de governo como vice decorativo. A senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo político que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas.

2. Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios, secundários, subsidiários.

3. A senhora, no segundo mandato, à última hora, não renovou o Ministério da Aviação Civil, onde o Moreira Franco fez belíssimo trabalho, elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar este fato no dia seguinte, ao telefone.

4. No episódio Eliseu Padilha, mais recente, ele deixou o Ministério em razão de muitas "desfeitas", culminando com o que o governo fez a ele, ministro, retirando, sem nenhum aviso prévio, nome com perfil técnico que ele, ministro da área, indicara para a ANAC. Alardeou-se a) que fora retaliação a mim; b) e que ele saiu porque faz parte de uma suposta "conspiração".

5. Quando a senhora fez um apelo para que eu assumisse a coordenação política, no momento em que o governo estava muito desprestigiado, atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste fiscal. Tema difícil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empresários. Não titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o ajuste, nada mais do que fazíamos tinha sequência no governo. Os acordos assumidos no Parlamento não foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuniões de líderes e bancadas ao longo do tempo, solicitando apoio com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela coordenação.

6. De qualquer forma, sou presidente do PMDB e a senhora resolveu ignorar-me, chamando o líder Picciani e seu pai para fazer um acordo sem nenhuma comunicação ao seu vice e presidente do partido. Os dois ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora não teve a menor preocupação em eliminar do governo o deputado Edinho Araújo, deputado de São Paulo e a mim ligado.

7. Democrata que sou, converso, sim, senhora presidente, com a oposição. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no Parlamento. Aliás, a primeira medida provisória do ajuste foi aprovada graças aos 8 (oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa visão equivocada do nosso sistema. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que deveríamos reunificar o pais. O Palácio resolveu difundir e criticar

8. Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve reunião de duas horas com o vice-presidente Joe Biden - com quem construí boa amizade - sem convidar-me, o que gerou em seus assessores a pergunta: o que é que houve que numa reunião com o vice-presidente dos Estados Unidos, o do Brasil não se faz presente? Antes, no episódio da "espionagem" americana, quando as conversas começaram a ser retomadas, a senhora mandava o Ministro da Justiça para conversar com o vice-presidente dos Estados Unidos. Tudo isso tem significado absoluta falta de confiança.

9. Mais recentemente, conversa nossa (das duas maiores autoridades do país) foi divulgada e de maneira inverídica, sem nenhuma conexão com o teor da conversa.

 

10. Até o programa "Uma Ponte para o Futuro", aplaudido pela sociedade, cujas propostas poderiam ser utilizadas para recuperar a economia e resgatar a confiança, foi tido como manobra desleal.

11. O PMDB tem ciência de que o governo busca promover a sua divisão, o que já tentou no passado, sem sucesso. A senhora sabe que, como presidente do PMDB, devo manter cauteloso silêncio com o objetivo de procurar o que sempre fiz: a unidade partidária.

Passados estes momentos críticos, tenho certeza de que o país terá tranquilidade para crescer e consolidar as conquistas sociais.

Finalmente, sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã.

Lamento, mas esta é a minha convicção.

 

Respeitosamente,

À Sua Excelência a Senhora

 

Doutora DILMA ROUSSEFF

Presidente da República do Brasil

Palácio do Planalto

Brasília, D.F.

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