Doze anos depois do surgimento da primeira norma proibindo o nepostismo no serviço público - a resolução 7/2005 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) -, a prática ainda é motivo de preocupação para órgãos de controle da gestão pública. Tanto que o Ministério Público de Pernambuco (MPPE) emite, a cada período de início de novas gestões municipais, uma série de recomendações para que os novos prefeitos e presidentes de Câmaras de Vereadores não nomeiem parentes para cargos de direção e assessoramento no órgão sob seu comando. Este ano não está sendo diferente.
Mesmo assim, é possível identificar em alguns pontos do Estado casos em que as relações familiares e a gestão pública sem misturam. Em Orobó (Agreste), o prefeito Cléber Aguiar Chaparral (PSD) nomeou a prima Fátima Gabrielle para a Secretaria de Saúde. Na gestão passada (Cléber foi reeleito em 2016), a esposa Juliana Aguiar foi secretária de Assistência Social. Um fato curioso na cidade é que a mãe do prefeito, Maria do Carmo Aguiar (PDT), é presidente da Câmara de Vereadores - ou seja, mãe e filho comandam os dois poderes municipais.
No Cabo de Santo Agostinho, cidade da Região Metropolitana governada por Lula Cabral (PSB), Daniel Antônio dos Santos, cunhado do prefeito, é controlador-geral do município. Sabrina Cássia da Silva Rocha, prima do socialista, foi nomeada secretária do gabinete do prefeito. Na Câmara de Vereadores estão dois parentes de Lula Cabral: o filho Bruno Cesar de Oliveira tem um cargo de assessor especial da presidência e o sobrinho Filipe Luiz Cabral da Rocha é assistente jurídico da Casa.
No município vizinho, Jaboatão dos Guararapes, os casos de parentesco estão relacionados aos secretários. José Alexandro Gomes é secretário executivo de projetos especiais e a mãe dele, Maria de Fátima Gomes da Silva, foi nomeada superintendente do gabinete do prefeito. O secretário-executivo de Desenvolvimento Econômico e Turismo, Marlus Costa, tinha a mãe, Marcia Esmeraldo Araujo Martins, o irmão Maxwell de Araújo Costa, o cunhado Messias Sobreira dos Santos e a sogra Maria do Rosario Sobreira Silva todos na pasta de projetos especiais. Os familiares de Marlus Costa foram exonerados no dia seguinte à nomeação.
O nepotismo não foi normatizado na Constituição Federal. A partir de 2008, a Súmula Vinculante 13 do Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu o nepotismo nas três esferas do poder público, acompanhando a resolução 7/2005 do CNJ. As dúvidas, no entanto, prosseguiram. A súmula diz que viola a Constituição a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, da autoridade nomeante da administração pública direta e indireta do Estado, União ou município. Não faz referência aos cargos políticos do primeiro escalão, como secretários e ministros, por exemplo. E isso faz com que a vedação ao nepotismo não alcance esses cargos.
A relação familiar na política não é nova. Vem desde a época em que o Brasil era Império, quando títulos nobres eram dados a famílias para se perpetuarem no poder. Após séculos, a prática segue. Para o doutor em ciências políticas e coordenador do curso de administração pública da Asces, de Caruaru, Vanuccio Pimentel, o problema está nas consequências políticas e administrativas. "Uma mesma família pode controlar recursos, que vai se transformar em capital político e que pode desequilibrar um processo eleitoral", disse.
Na opinião de Pimentel, o debate vai além do que é legal e do que é moral. "Coloco que é um bom negócio. Não existe nenhuma atividade econômica privada numa cidade pequena que possa competir com os salários de uma prefeitura. Não estou levando em conta possível corrupção, mas a capacidade de autorremuneração", disse.