Heróis caídos que se levantam rendem bons roteiros de cinema.
A "volta por cima" é muito apreciada também na hora do voto, no marketing político.
Lula (PT), por exemplo, tem uma lista de "voltas por cima" no currículo, para usar dependendo da ocasião, desde "carregava lata de água na cabeça e enfrentou uma viagem num pau de arara até São Paulo", passando por "três eleições perdidas até sair vitorioso" e chegando em "preso injustamente por Sergio Moro para ser solto depois e tentar virar presidente".
Moro já pode construir sua "volta por cima".
O ex-juiz, herói do combate à corrupção, acreditou na conversa de engana bobo de Bolsonaro (junto com 57 milhões de pessoas, vale lembrar) e desistiu da magistratura achando que faria mais sendo ministro da Justiça.
É difícil conceber que alguém faria isso estando em preservado estado de saúde mental. É de uma ingenuidade absurda.
Mas, acontece.
A ida de Moro para o governo Bolsonaro foi um abraço dele, e da Lava Jato, na política. Ele não entendeu assim. Talvez por ilusão ou por necessidade de fingir que nunca teve qualquer aspiração que não fosse a jurídica, Moro acreditou que poderia trabalhar com política sem mergulhar nela.
Novo capítulo de extrema ingenuidade na vida do ex-juiz.
Quando pediu demissão, o fez com barulho, acreditando que o Brasil entraria em convulsão pelas denúncias que fez, sobre Bolsonaro ter tentando interferir na Polícia Federal.
Ingenuidade, outra vez.
O Brasil, e talvez Moro não tenha percebido onde estava, é um país no qual usar poder político e financeiro para interferir naquilo que bem entende quase faz parte da missa, de tão rotineiro.
Por pior que fosse a interferência, num ambiente em que isso é rotina, a denúncia que inicialmente causa olhares de surpresa e indignação, perde-se na cumplicidade do "deixa para lá".
Moro pode mostrar que, depois de tantas escolhas erradas, agora sabe onde está pisando e pode contribuir para o país, usando o espectro do que já foi sua imagem.
A história mostra que muitos presidentes são feitos após "voltas por cima".
Mas, tem algo que nenhum deles pode ser e esse é o problema para o ex-juiz que vai se filiar ao Podemos esta semana.
Nunca existiu presidente da República ingênuo.