Fechamos uma semana agitada, com mais um aumento nas passagens de ônibus, dessa vez de 14,26%. Um percentual alto para quem paga, baixo para quem recebe. Muito ou pouco, essa não é a questão. O que todos nós precisamos entender (principalmente os gestores e políticos) é que transporte coletivo precisa de subsídio.
Enquanto ele for financiado, em grande ou pequena quantidade, pela tarifa, não vai dar certo. A receita nunca será suficiente para cobrir o custo de uma operação de qualidade. E não é porque os empresários de ônibus são mercenários e têm lucros estratosféricos – como muita gente acredita e divulga. É porque o custo é alto e transporte coletivo bom custa caro. É fato que a iniciativa privada não está aí para brincar de “ônibusinho”.
“Em 2007 , o governo já adotou o reajuste apenas anual e pelo IPCA. Depois, gradativamente, começou a assumir custos que antes eram cobertos apenas pela tarifa. É o caso da remuneração pelos serviços técnicos do GRCT, chamada de RST, o valor da operação e manutenção dos terminais integrados e estações de BRT, e a isenção de 100% do ICMS sobre o óleo diesel e dos veículos novos. Por isso temos a tarifa mais barata do País” André Melibeu, diretor de operações do GRCT
São empresários e, logicamente, buscam lucros. Isso não é segredo para ninguém. Mas o momento é outro. No lugar de ficarmos, como fazemos há anos e anos, defendendo uma teoria da conspiração, é chegada a hora de exigir mais subsídios para o transporte coletivo de massa.
Fazer com que ele passe a ser, de fato, um direito social, sendo equiparado à saúde, educação e segurança pública. Afinal, sem transporte não vamos a lugar nenhum: não chegamos ao médico nem à escola, não temos lazer nem trabalho.
A questão é quem deve subsidiar esse sistema? Esta mais do que na hora de governos e sociedade entenderem que o transporte motorizado individual, ou seja, o carro e a moto, deve assumir esse papel. Opções não faltam.
Que tal começarmos com a taxação de estacionamentos rotativos, como a Zona Azul que, desde 1998, quando foi instituída no Recife, custa R$ 1 por duas ou cinco horas? E que só na sexta-feira (13/1) foi reajustada pela prefeitura.
Apesar de o percentual de reajuste impressionar - 200% -, na prática a taxa do estacionamento rotativo pulou de R$ R$ 1 para R$ 3 (tanto por duas ou cinco horas). Mesmo com o aumento, não é um valor muito baixo para ser cobrado pelo uso do espaço público por um automóvel? Ainda mais por horas? Se a boa operação e qualidade do transporte público fossem prioridade nos governos deveríamos já ter promovido esse aumento há mais tempo e transferir parte desse valor para o sistema de transporte como subsídio.
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A CTTU argumenta ser impossível essa iniciativa porque, além de não ter nenhum tipo de estudo sobre o tema em andamento, o reajuste vai servir para cobrir os custos da operacionalização do estacionamento rotativo, ou seja, os gastos que o município tem com viaturas, agentes e sinalização para fiscalizar a Zona Azul. Até agora, considerando o valor de R$ 1, a prefeitura arrecadava R$ 230 mil por mês com as três mil vagas disponíveis basicamente na área central da capital.
E, segundo a CTTU, gastava R$ 400 mil para garantir a operacionalização. Com o aumento para R$ 3, por exemplo, seria três vezes o valor atual: R$ 690 mil. Que tal essa quantia ser dividida com o transporte coletivo? E a gestão municipal do Recife tem essa autonomia, já que a capital responde por 70% do sistema de transporte.
Somando a volta, o trabalhador vai gastar, no mínimo, R$ 6,40) Formas para subsidiar o transporte coletivo não faltam. É só uma questão de prioridade política. É só querer. A taxação da gasolina é uma delas. Acrescentando R$ 0,10 a mais por litro de combustível durante o abastecimento dos automóveis seria possível gerar um recurso de R$ 274 milhões por ano somente para o transporte coletivo da RMR.
E se esse valor fosse transferido para abrandar os custos do setor, poderia fazer a passagem dos ônibus, por exemplo, ter uma redução de R$ 0,80. A taxação sobre o litro dos combustíveis vendidos a varejo vem ganhando força e forma no País através da proposta de criação da Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide) Municipal, que está sendo formatada por uma comissão especial criada na Câmara dos Deputados.
A Cide Municipal foi pensada pela Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), tem o apoio da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) e conta com o suporte técnico da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP).
SUBSÍDIO COMEÇOU A SER DADO PELO ESTADO, MAS É PRECISO OUTRAS FONTES
Muita gente não sabe, mas o transporte da Região Metropolitana do Recife é subsidiado em aproximadamente R$ 200 milhões por mês pelo governo do Estado. É um mérito, é preciso destacar, da gestão PSB. Não era até pouco tempo atrás.
Ainda em 2007, quando o então governador Eduardo Campos atrelou o reajuste das passagens ao IPCA e limitou a majoração a uma vez ao ano (sempre em janeiro), já foi uma atitude de preocupação com o custo do serviço no bolso do passageiro.
Mas é verdade também que o subsídio começou a ser dado na marra, a partir de 2014, porque o governo percebeu que o transporte projetado para a RMR custava caro e que, se fosse repassar esse custo integralmente para a tarifa, a repercussão seria a pior possível.
Em 2016, chegou a R$ 195 milhões. Para 2017, a previsão é de R$ 221 milhões. Sem esse subsídio, segundo cálculos do Grande Recife Consórcio de Transporte (GRCT), a tarifa de ônibus seria aumentada em 20%.
Numa comparação com São Paulo, por exemplo, nosso subsídio é irrisório. São Paulo já está injetando no sistema de transporte, por ano, mais de R$ 2 bilhões para manter o benefício da integração temporal. “O valor é dez vezes maior que o nosso, mas a receita deles também é dez vezes maior do que a nossa. Isso precisa ser considerado”, ressalta.
Enfim, comemoremos a chegada do subsídio via governo estadual. Mas é preciso mais, muito mais. Seja por parte das prefeituras do Recife, Olinda e Jaboatão (que integram o Consórcio de Transporte da RMR), pelo governo federal ou outras fontes. E o automóvel, que transporta menos de 20% dos passageiros e tem à sua disposição 80% do sistema viário, precisa entrar na discussão.