É preciso fazer autocrítica no trânsito

Publicado em 20/05/2019 às 17:15
Foto: NE10


Foto: Heudes Regis/Arquivo JC Imagem

 

Esta postagem do Blog MoveCidade quer tocar a alma dos motoristas. Das pessoas que conduzem automóveis, caminhões, ônibus e motocicletas na maior parte do tempo, mas que às vezes também são ciclistas e sempre, sempre são pedestres – porque todos nós estamos motoristas e/ou ciclistas, mas o que somos mesmo é pedestres. Quer mostrar que o trânsito não precisa ser esse ambiente de disputa e egoísmo que conhecemos. De opressores e oprimidos. Que o fato de estarmos protegidos (ou acharmos que estamos) por um monte de lata não nos dá o direito de intimidar o outro e, principalmente, o mais vulnerável como é o caso de pedestres e ciclistas. E a mudança precisa começar em cada um de nós. Precisamos ter paciência, flexibilidade, autocrítica, bom senso, equilíbrio, humildade e respeito pelo outro. Sempre. É preciso entender que ser motorista é uma situação transitória porque, ao estacionar o carro, todos viram pedestres.

O vídeo abaixo resume a transformação que alguns condutores sofrem quando estão ao volante. Confira!

Por tudo isso, ouvimos psicólogos do trânsito para justificar a necessidade de respeitar os outros, as diferenças individuais e a diversidade de opiniões. Afinal, estamos falando do trânsito, algo que envolve toda a sociedade e que mata, no mínimo, 34 mil pessoas por ano no Brasil e 1 milhão no mundo. E que são números considerados subnotificados por muitos, já que a estatística do setor é extremamente deficitária. Acredita-se que o número de mortos pelo trânsito seja superior. “A mudança de comportamento individual é fundamental para a redução de acidentes. Faz a diferença no todo. É preciso modificar o comportamento e olhar o trânsito de maneira mais solidária, com menos disputa. Ser mais gentil e respeitar os mais frágeis, sempre”, ensina Renan da Cunha Soares Júnior, ex-conselheiro do Conselho Regional de Psicologia do Mato Grosso do Sul (CRP-MS) e um dos criadores da publicação “Referências técnicas para atuação de psicólogos em políticas públicas de mobilidade humana e trânsito”, do Conselho Federal de Psicologia (CFP).

FLEXIBILIDADE As pessoas têm interesses distintos. É preciso saber evitar conflitos e buscar soluções criativas para problemas criados pelos relacionamentos no trânsito. Além disso, as pessoas mais flexíveis têm melhor capacidade de adaptação quando expostas a diferentes situações ou ambientes
BOM SENSO E SABEDORIA Qualquer situação ou problema tem mais de uma maneira de ser interpretado ou resolvido. O controle das situações no trânsito está sempre na mão de quem age com bom senso e ponderação
EQUILÍBRIO Controlar o próprio temperamento é fundamental para quem quer, deseja e necessita desenvolver uma boa capacidade de se comunicar e negociar no trânsito

É preciso, ao volante, olhar mais para si do que para o outro. Por isso a autocrítica e a humildade são tão importantes. “Todo motorista costuma se autoavaliar como um excelente condutor, enquanto avalia o outro como péssimo. Pesquisas comprovam essa percepção. E isso precisa mudar. Outra coisa comum que precisamos acabar é com a categorização da culpa. Achar que uma categoria é responsável pelos problemas do trânsito. Os motoristas de automóveis acham que são os motociclistas, que culpam os condutores de ônibus, que culpam os ciclistas e por aí vai. É preciso entender que há o bom motorista e o mau motorista, independente do veículo que ele conduz. Há o bom pedestre e o mau pedestre. Embora ele sempre tenha preferência no trânsito – o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) determina isso –, nem sempre ele tem razão. Mas todos precisam protegê-lo”, reforça o psicólogo.  

PACIÊNCIA As pessoas pacientes não precisam resolver tudo na hora, não são afobadas, nem tiram conclusões precipitadas. Algo fundamental no trânsito
HUMILDADE Reconhecer os próprios erros, com humildade e simplicidade, permite dissolver os desentendimentos na raiz. A humildade, entretanto, ainda é rara entre os motoristas
RESPEITO Por ser um dos valores mais importantes, o respeito é a viga mestra dos relacionamentos no trânsito. Por isso é importante respeitar os outros, as diferenças individuais e a diversidade de opiniões

 

  A distância natural entre as pessoas que fazem o trânsito é outro fator que pesa e, por isso, é mais uma razão para ser exercido o respeito ao outro. “O desconhecimento do próximo – afinal você não conhece quem está no carro ao lado ou atravessando a rua na sua frente –, a individualidade de cada um e a sensação de isolamento que o carro proporciona contribuem para esse sentimento de disputa. O trânsito é um ambiente de passagem e, por isso, não há elo entre as pessoas. Devido à essa realidade é fundamental que a formação do motorista comece desde cedo. E, não, só quando ele já está adulto, como acontece no Brasil. Precisamos formar o bom pedestre para que ele seja um bom ciclista e, consequentemente, um bom motorista. Só assim teremos um trânsito mais humano”, destaca Renan da Cunha Soares Júnior.

 

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Essas são algumas lições para que possamos ter um trânsito mais seguro e mais gentil. Reflexões ainda mais significativas por estarmos no Maio Amarelo, um mês de alertas para a segurança viária. Afinal, estar ao volante é, talvez, o maior exercício de civilidade a que as pessoas são submetidas diariamente. Por tudo isso, precisamos refletir e mudar.  

Os curiosos atrapalham o trânsito Gentileza é fundamental Não adianta esquentar a cabeça Não precisa avançar no sinal Dando seta pra mudar de pista Ou pra entrar na transversal Pisca alerta pra encostar na guia Para-brisa para o temporal Já buzinou, espere, não insista, Desencoste o seu do meu metal Devagar pra contemplar a vista Menos peso do pé no pedal Não se deve atropelar um cachorro Nem qualquer outro animal Todo mundo tem direito à vida Todo mundo tem direito igual Motoqueiro, caminhão, pedestre Carro importado, carro nacional Mas tem que dirigir direito Para não congestionar o local Tanto faz você chegar primeiro O primeiro foi seu ancestral É melhor você chegar inteiro Com seu venoso e seu arterial A cidade é tanto do mendigo Quanto do policial Todo mundo tem direito à vida Todo mundo tem direito igual Travesti, trabalhador, turista Solitário, família, casal Todo mundo tem direito à vida Todo mundo tem direito igual Sem ter medo de andar na rua Porque a rua é o seu quintal Todo mundo tem direito à vida Todo mundo tem direito igual Boa noite, tudo bem, bom dia, Gentileza é fundamental Pisca alerta pra encostar na guia Com licença, obrigado, até logo, tchau. (Arnaldo Antunes e Lenine, Rua da Passagem)

 

VÍTIMAS DA INTOLERÂNCIA NO TRÂNSITO

As mortes prematuras e violentas do empresário pernambucano Leonardo Henrique Buarque Spinelli, 34 anos, e do taxista paraibano Paulo Damião dos Santos, 42, são razões mais do que fortes para reforçar a necessidade de autocontrole e paciência quando estamos ao volante. Os dois foram praticamente executados após discussões no trânsito. Leonardo ainda foi agredido diante da mulher, em 2017, na Estrada de Aldeia, em Camaragibe, no Grande Recife. E o acusado do crime, o comerciante Adalberto Ferreira da Silva, 67 – preso após ser divulgada recompensa –, foi quem provocou a colisão. Segue preso recorrendo da decisão de ser julgado no Tribunal do Júri por homicídio doloso (intencional).

 

2 - Corretor de imóveis Gustavo Teixeira Correia, 42, no memomento em que mata o taxista
5 - Adalberto Ferreira da Silva, 67, acusado de matar o empresário pernambucano
8 - Família do empresário Leonardo Spinelli assassinado em Aldeia
9 - Família do empresário Leonardo Spinelli assassinado em Aldeia
17 - Taxista paraibano Paulo Damião dos Santos, 42

A morte do taxista foi tão violenta quanto a do empresário. Aconteceu em fevereiro, no Bessa, em João Pessoa (PB). O acusado, o corretor de imóveis Gustavo Teixeira Correia, 42, estava bêbado e se irritou com a demora do taxista em finalizar uma manobra. Desceu do carro de app que o conduzia para casa e disparou três tiros contra Paulo Damião, que morreu na hora, ainda ao volante. Após o crime, o corretor se escondeu na residência até ser preso.

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