Sem dúvida, a atitude do Ministério Público Federal (MPF) de acionar judicialmente o governo federal e a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) para que encontrem soluções de curto, médio e longo prazo para a desumana superlotação do Metrô do Recife nos horários de pico é um acalanto para o passageiro que depende daquele sistema e precisa se expor em meio à interminável pandemia de covid-19. Apesar do descrédito da população de que a Justiça possa dar jeito, não deixa de ser uma atitude provocativa. Mas há uma pergunta que precisa ser feita: por que somente agora, um ano e quatro meses depois do início da pandemia, a Justiça é provocada?
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Nós estamos tentando reverter a situação desde o ano passado. É preciso lembrar que o metrô ficou operando parcialmente no início do segundo semestre de 2020 e teve muitos profissionais afastados por estarem nos grupos de risco. Conseguimos que o sistema voltasse a operar integralmente, que medidas sanitárias fossem adotadas, mas surgiram as dificuldades em relação ao número de funcionários e ao risco de contaminação com o retorno”,
Mona Lisa Duarte Aziz, uma das procuradoras que assina a ação civil pública
O questionamento é feito porque as aglomerações do Metrô do Recife vêm sendo registradas desde que as atividades econômicas começaram a ser retomadas depois da primeira etapa da crise sanitária, ainda nos meses de junho e julho de 2020. Desde então, os passageiros sofrem com um sistema que vem operando com intervalos de quase 10 minutos nos horários de pico da manhã e da noite - 8 e 9 segundos, na verdade. Intervalos enormes para o transporte sobre trilhos e que refletem o sucateamento do metrô. Para se ter ideia da situação, foram 132 falhas, paralisações e evacuações em um ano e meio e 15 dos 40 trens do sistema estão parados por falta de peças para uma operação segura.
Mas há uma razão para que a Justiça só tenha sido provocada agora e quem explica é Mona Lisa Duarte Aziz, uma das procuradoras que assina a ação civil pública. Ela relata que foram muitas tentativas e esforços de promover ajustes junto a CBTU, sem sucesso. Também pondera que é sempre preferível tentar soluções extrajudiciais para evitar o trâmite da Justiça, que pode ser difícil. “Nós estamos tentando reverter a situação desde o ano passado. É preciso lembrar que o metrô ficou operando parcialmente no início do segundo semestre de 2020 e teve muitos profissionais afastados por estarem nos grupos de risco. Conseguimos que o sistema voltasse a operar integralmente, que medidas sanitárias fossem adotadas, mas surgiram as dificuldades em relação ao número de funcionários e ao risco de contaminação com o retorno”, diz a procuradora.
Segundo Mona Lisa, com a retomada da operação, o MPF tenta, desde o início de 2021, chegar a um entendimento com a CBTU no Recife para que soluções como controle de acesso às composições, uso de controladores de filas, disponibilização de mais trens e distribuição de álcool 70% para os passageiros fossem adotadas. Mas não deu certo. “Tentamos de tudo e a companhia sempre alegou que não tinha recursos e mecanismos administrativos para promover as mudanças necessárias. Chegamos a ter a colaboração do governo de Pernambuco na doação de máscaras e álcool, mas não foi suficiente. Até o fato de que o metrô deverá ser repassado à iniciativa privada foi alegado. Foi quando decidimos entrar com a ação civil pública”, reforça.