Mortes no trânsito: Recife bate novo recorde de mortes no trânsito. Aumento foi de 37% em 2023
Dados oficiais apontam que 144 pessoas morreram em sinistros de trânsito em 2023. Desse total, 50% aconteceram em rodovias e 15% em vias urbanas
O trânsito do Recife segue matando muito, principalmente os ocupantes de motocicletas e, em sua grande maioria, nos horários da noite e da madrugada, quando toda a fiscalização eletrônica, inclusive a de velocidade, é desligada na cidade há 17 anos. Esse cenário desolador, inclusive, é oficial e constatado pela própria gestão municipal.
Os dados são referentes ao ano de 2023 e mostram que 144 pessoas morreram em sinistros de trânsito no Recife, o que representa um aumento de 37% em relação a 2022, quando as mortes totalizaram 105 registros. Desse total de óbitos, 50% aconteceram em rodovias que cortam a capital e 15% em vias urbanas.
Os números fazem parte do Relatório Preliminar de Sinistros de Trânsito com Vítimas Fatais 2024, documento elaborado pela Autarquia de Trânsito e Transporte Urbano do Recife (CTTU) em parceria com a Iniciativa Bloomberg de Segurança Viária Global (BIGRS). O relatório 2024 será fechado até o fim do ano, segundo a Prefeitura do Recife.
Os números de mortes oficiais, garante a gestão municipal, incluem os registros feitos não só nos locais dos sinistros de trânsito (não é mais acidente de trânsito que se define, segundo o CTB e a ABNT), mas também os óbitos das vítimas socorridas para os hospitais. São dados do Comitê Municipal de Acidentes de Trânsito (Compat).
VIOLÊNCIA NO TRÂNSITO DO RECIFE NÃO PARA DE CRESCER DESDE 2021
Além do aumento assustador de quase 40% no número de mortos no trânsito do Recife, os dados oficiais também revelam algo ainda mais preocupante: que o crescimento tem sido constante, verificado desde 2021, quando os Relatórios de Segurança Viária começaram a ser elaborados pela gestão, em parceria com a Bloomberg.
Em 2022, houve um aumento de 19% no número de mortes em relação a 2021. O Recife saiu de 88 para 105 óbitos. O ano de 2021 - primeiro ano do relatório, já que a consultoria da BIGRS começou em 2020 -, foi o único a ter reduções: a capital saiu de 109 mortes em 2020 para 88 óbitos em 2021. Foi o primeiro ano, considerando a série histórica desde 2017, que a capital registrou menos de 100 mortes no trânsito.
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E, agora, de 105 mortes em 2022 para 144 em 2023, o que representou o crescimento de 37%. “É um aumento expressivo e preocupante, sem dúvida. Mas é importante ressaltar que é um fenômeno que vem sendo verificado no País e até mesmo em toda a América Latina. É resultado, ainda, do pós pandemia de covid-19, quando houve um crescimento dos serviços de aplicativos de transporte e de delivery com motocicletas”, afirma Gustavo Sales, coordenador executivo da Iniciativa Bloomberg de Segurança Viária Global no Recife.
RELAÇÃO COM A EXPLOSÃO DO UBER E 99 MOTO E DOS SERVIÇOS DE DELIVERY
O Relatório Preliminar de Sinistros de Trânsito com Vítimas Fatais 2024 ainda não faz relação direta entre o aumento das mortes no trânsito e os serviços de delivery e de transporte de passageiros com motocicletas, como Uber e 99 Motos, mas os números indicam a perigosa conexão. Em 2023, os ocupantes de motos responderam por 48% das mortes no trânsito do Recife.
Relato?rio Preliminar Mortes... by Roberta Soares
Desde 2020, exatamente quando os serviços de delivery explodiram no País com a pandemia e, no fim de 2021, quando a Uber criou o serviço de Uber Moto, os ocupantes de motos (incluindo condutores e passageiros) superaram os pedestres como as principais vítimas do trânsito na cidade.
“A gente não gosta de responsabilizar os serviços de transporte de passageiros com motocicletas e de delivery, mas sabemos que a população está usando o Uber e 99 Moto, por exemplo, como alternativa ao transporte público. E isso se reflete na segurança viária porque estamos tirando o passageiro do transporte seguro para o inseguro, de vulnerabilidade maior”, pontua Gustavo Sales.
Segundo o coordenador executivo da Iniciativa Bloomberg, o trabalho realizado em parceria com a CTTU tenta mitigar essa migração do transporte público para a motocicleta. Já que, proibir o Uber e 99 Moto ou regulamentar o serviço, criando regras que promovam mais segurança ao transporte de pessoas com motos, é uma decisão puramente política e, não, técnica.
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“Atuamos nos quatro eixos da segurança viária, que são a fiscalização, a comunicação, a engenharia (implementação de ruas seguras) e a gestão de dados. A CTTU tem sido uma forte aliada e acredito que o trabalho que vem sendo desenvolvido nesses últimos anos, principalmente através da gestão de dados, são uma boa base para a gestão atuar e tomar decisões”, reforça Gustavo Sales.
MORTES ACONTECEM MAIS À NOITE E DE MADRUGADA. MESMO ASSIM, RECIFE SEGUE DESLIGANDO A FISCALIZAÇÃO DE VELOCIDADE
Outro dado assustador do Relatório Preliminar de Sinistros de Trânsito com Vítimas Fatais 2024 é o que confirma que 42% das mortes nas ruas e avenidas da cidade acontecem no período da noite e da madrugada, apesar de o volume de veículos ter uma redução estimada em mais de 60%.
O horário da noite - 18h às 23h59 - responde por 26% das mortes no trânsito, enquanto que a madrugada - 0h às 5h59 - representa 16%. A manhã - das 6h às 11h59 - fica com 28% e a tarde - das 12h às 17h59 - com 30% das ocorrências que resultam em óbitos.
Vale lembrar que há 17 anos o Recife desliga toda fiscalização eletrônica da cidade por determinação da Justiça de Pernambuco, provocada por uma ação do Ministério Público (MPPE). E que, apesar dos números assustadores, a gestão municipal até hoje não tentou reverter a situação judicialmente. Nem mesmo o religamento, ao menos, da fiscalização de velocidade.
“Em primeiro lugar, lamentamos pela perda dessas vidas e nos solidarizamos com os entes queridos dessas pessoas. Esse cenário revela o quanto é importante fortalecer as políticas públicas para a segurança viária. As ações de educação para o trânsito e fiscalização já foram intensificadas neste ano e a necessidade da mudança de comportamentos de todos é fundamental para que possamos ter um trânsito mais seguro”, destaca a presidente da CTTU, Taciana Ferreira.