Um fóssil do dinossauro Ubirajara jubatus, originado da Bacia do Araripe, no Sul do Ceará, foi contrabandeado e depositado em um museu da Alemanha, de acordo com a Sociedade Brasileira de Paleontologia (SBP). O espaço, por sua vez, se nega a devolver o material, que foi transportado para lá em fevereiro de 1995, e afirma ter conseguido autorização para realização do transporte.
O Ubirajara jubatus é datado do período Cretáceo, e teria vivido há cerca de 110 e 115 milhões de anos. Ele se tornou o dinossauro mais antigo da Bacia do Araripe. O fóssil que se encontra no Museu Estadual de História Natural de Karlsruhe, na Alemanha, se trata do holótipo do animal, a peça única que serviu de base para a descrição da espécie.
Até agora, a SBP mantinha conversas com o Staatliches Museum für Naturkunde Karlsruhe (SMNK), museu onde está o espécime, estudando a repatriação do fóssil tombado como SMKN PAL 29241. No dia 1º de setembro, no entanto, um representante do museu informou que o material não seria devolvido ao Brasil e que a instituição tem amparo de uma lei alemã de proteção cultural.
"...o Dr. Frey nos comunicou a existência de uma lei alemã de 2016 (Kulturgutschutzgesetz) sobre proteção cultural que determina que material adquirido pela Alemanha previamente a 26 de abril de 2007 não está sob a égide das convenções da Unesco. Dessa forma, o espécime SMKN PAL 29241, segundo sua interpretação, é parte legal da coleção científica da instituição, não devendo ser devolvida ao Brasil", informa a SBP em comunicado.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Paleontologia, antes desta última informação, o museu alemão chegou a demonstrar interesse em negociar a liberação do fóssil. As negociações teriam sido adiadas somente por conta da pandemia do novo coronavírus.
"É momento para que a comunidade paleontológica não esmoreça e continue a luta pela repatriação não só do espécime SMKN PAL 29241 como também de qualquer material retirado de nosso país de forma escusa, como o Palpimanidae, também do Crato, descrito esse ano pela Journal of Arachnology e que, até esse momento, não se manifestou quanto a ilegalidade do material. Essa luta também deve conter a contestação frequente dos fatos nas redes sociais além da indignação dentro do mundo acadêmico", ressaltou a SBP.
Veja o comunicado da SBP na íntegra:
O servidor aposentado do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPN) José Betimar Filgueira é quem teria assinado a autorização. Ao G1, ele confirmou a informação, mas relatou também que tal autorização era válida apenas junto ao DNPM. “Eles precisavam também da autorização do Ministério das Ciências e Tecnologia (MCT), coisa que eles não obtiveram porque não sabiam ou, porque não foram atrás”, contou.
Uma Portaria de 1990 determina que materiais e dados científicos do Brasil só podem ser estudados fora do país com certas condições, como o intermédio de uma instituição técnico-científica brasileira e a participação de pelo menos um cientista brasileiro na pesquisa. Além disso, a devolução do material é obrigatória.
De acordo com O servidor aposentado, porém, a autorização dada foi em relação à fósseis comuns, dos quais ele mesmo teria vistoriado. “Eram apenas fósseis comuns do nosso dia-a-dia. Se houvesse fóssil incomum eu não teria dado a autorização”, garantiu.
Ele acredita que o fóssil do dinossauro foi colocado nas caixas somente após a sua vistoria e autorização. “As caixas não foram lacradas, mas apenas fechadas, pois, não havia lacre, na época, no escritório”, relembrou.
Quando começou a polêmica?
Apesar de o fóssil estar na Alemanha desde 1995, a polêmica em volta do material começou após a publicação de um estudo em outubro de 2020, na revista científica Cretaceous Research.
No artigo, um grupo formado por dois pesquisadores ingleses, dois alemães e um mexicano, afirma que o fóssil foi encontrado entre os municípios de Nova Olinda e Santana do Cariri, na Formação Crato, e transportado para a Alemanha em 1995, após receber uma autorização do escritório regional do antigo DNPM, no dia 1º de fevereiro daquele mesmo ano.
Quando o estudo começou a ser divulgado, a sociedade brasileira científica começou a questionar a suposta autorização citada pelos pesquisadores. Além deste fóssil específico, outros materiais pertencentes ao Brasil estariam sendo identificados neste mesmo museu.