Renda básica extraordinária paga ao longo de 2020, o Auxílio Emergencial teve o potencial de reconfigurar dados referentes à massa de rendimentos dos domicílios pernambucanos no ano passado. Num cenário de pandemia, com alto nível de desemprego, o pagamento elevou a participação de outros rendimentos na composição financeira das famílias. No ano, o Estado conseguiu até reduzir a concentração de renda no ano passado, mas ainda tem um longo caminho pela frente, já que 1% dos mais ricos ainda ganham 39 vezes mais que os mais pobres, cenário que ainda expõe fortemente desigualdade.
De acordo com os dados da Pnad Cotinua Rendimento de todas as fontes em 2020, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o percentual de domicílios que receberam rendimentos de outros programas sociais, que incluem o auxílio emergencial, teve um salto de 0,9% em 2019 para 30,7% em 2020 em Pernambuco, chegando a quase 3 milhões de pessoas.
No ano passado, 30,2% dos pernambucanos (2,8 milhões) possuíam algum rendimento proveniente de outras fontes, enquanto, em 2019, essa estimativa era de 25,6% (2,4 milhões). Entre as outras fontes estão aposentadorias, pensões, programas sociais governamentais, aluguel ou arrendamento,
mesadas ou doações e aplicações financeiras.
O crescimento fez com que pela primeira vez desde o início da PNAD Contínua, em 2012, o número de aposentados e pensionistas em Pernambuco fosse ultrapassado pela quantidade de beneficiários da categoria outros rendimentos, que engloba os programas sociais do governo, como auxílio emergencial e
Bolsa-Família, seguro-desemprego/seguro-defeso e rendimentos de poupança. Enquanto os aposentados e pensionistas compunham 11,1% da população em 2020, ou pouco mais de um milhão de pessoas, quem se enquadra em outros rendimentos soma quase 1,7 milhão de pessoas (17,7% da população).
"Todo mundo teve perda (na renda do trabalho), alguns mais, outros menos, mas você teve uma política social que segurou (os mais vulneráveis). Houve redução da desigualdade porque todo mundo perdeu, não é porque alguns estão ganhando. É uma notícia que parece boa, mas não é tão boa", afirmou a analista da pesquisa, Alessandra Scalioni.
Para além do crescimento na participação da renda, o avanço dos recursos de programas sociais contribuiu para uma redistribuição melhor da massa de renda no Estado.
A concentração de renda domiciliar per capita, medida pelo Índice de Gini, diminuiu. O indicador passou de 0,574 em 2019 para 0,536 no ano passado (ficando mais próximo de 0, o que indica melhora). Ainda assim, o Índice de Gini pernambucano ainda é alto, estando acima da média nacional, de 0,524 e média do Nordeste 0,526. Pernambuco ainda detém o sexto pior resultado do País.
Embora a massa tenha sido melhor distribuída, a massa total do rendimento médio mensal real domiciliar per capita no estado seguiu em queda em meio à crise. Enquanto ela era de R$ 9 bilhões em 2019, no ano passado passou para R$ 8,4 bilhões em 2020, numa retração de 6,8%. No país, a queda foi menos intensa, de aproximadamente 3,6%.
O reflexo da queda da massa, também reduziu o rendimento médio mensal real per capita por domicílio, que caiu 7,4% entre 2019 e 2020, passando de R$ 953 para R$ 882.
Os 10% mais ricos do Estado ficaram com 41,6% do total da massa de rendimentos. O número é menor do que o de 2019, quando chegou a 46,3%, mas ainda é alto. Em Pernambuco, os 10% da população com menores rendimentos detinham apenas 0,6% de toda a massa de rendimento médio mensal produzida.
O abismo da desigualdade escancara ainda que 1% da população mais rica (com rendimento médio mensal de R$ 11.201) recebeu, em média, 39,3 vezes o rendimento dos 50% mais pobres (com renda mensal de R$ 285). A proporção, ainda muito elevada, ficou menos concentrada do que em 2019, quando a diferença ultrapassava em média 50 vezes mais para os mais ricos.
Ainda com o incremento de renda por meio dos programas sociais, quando se considera o rendimento médio mensal real de todas as fontes, seja por meio do trabalho ou de outras fontes de renda, o valor em Pernambuco foi de R$ 1.570 em 2020, contra R$ 1.648 em 2019. No ano passado, o rendimento habitualmente recebido de todos os trabalhos resultou em uma massa mensal de rendimento de aproximadamente R$ 5,5 bilhões, 7,3% a menos que em 2019. O Estado teve uma redução de 12% da população ocupada no período.
Mesmo com menos pessoas trabalhando, o rendimento médio mensal real per capita de todos os trabalhos aumentou de R$ 1.772 em 2019 para R$ 1.805 em 2020, denotando que os trabalhadores com melhores rendimentos continuaram em situação melhor durante a pandemia em detrimento àqueles mais vulneráveis e com menores remunerações.
“Historicamente, Norte e Nordeste sempre receberam mais Bolsa Família e outros programas sociais do que as outras regiões. Além disso, as ocupações das duas regiões estão mais ligadas aos setores de serviços e comércio e, durante a pandemia, foram esses segmentos que dependem de clientes que mais sofreram. Então elas tiveram o mercado de trabalho muito afetado”, reforça a analista do IBGE.