Com informações da repórter Cinthia Ferreira, da TV Jornal
O ato contra o governo de Jair Bolsonaro que aconteceu na manhã deste sábado (29) no Centro do Recife foi surpreendido pela ação de forças policiais, que usaram spray de pimenta e bala de borracha para dispersar a multidão. O protesto era, até então, pacífico, mas aconteceu em descumprimento ao decreto estadual que proíbe aglomerações de pessoas devido à crise sanitária causada pela covid-19. Por volta das 13h, o grupo de protestantes já estava disperso. Há relatos de militantes feridos e presos.
Pouco tempo depois, o governador Paulo Câmara anunciou que havia determinado o afastamento do oficial que comandou ação da PM e do policial que teria jogado spray de pimenta contra a vereadora do PT Liana Cirne. “A Corregedoria da Secretaria de Defesa Social já instaurou procedimento para investigar os fatos. O oficial comandante da operação, além dos envolvidos na agressão à vereadora Liana Cirne, permanecerão afastados de suas funções enquanto durar a investigação”, disse o governador.
Os policiais montaram uma barricada em cima da Ponte Duarte Coelho, e avançaram contra os manifestantes, que afastavam-se do confronto em direção à Rua da Aurora. Bombas de gás lacrimogênio foram lançadas contra os militantes. Havia cerca de dez viaturas da PM no local. Ainda, um helicóptero da Secretaria de Defesa Social (SDS) rondava a Avenida Conde da Boa Vista.
"Estávamos tranquilos, chegando na Avenida Guararapes, quando fomos confrontados pelo Choque e recebidos com bala de borracha. Foi desnecessário. Você diz que está protegendo a saúde do trabalhador, mas estava ferindo e colocando em risco a integridade física dos manifestantes. A policia agiu de maneira arbitraria e truculenta por mais de 40 minutos. Tivemos companheiros feridos e presos", relatou Antônio Celestino, que integra a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados de Pernambuco (OAB-PE).
A reportagem do JC tentou entrar em contato com a Secretaria de Defesa Social (SDS), com a Polícia Militar de Pernambuco (PMPE) e com o Palácio do Campo das Princesas para obter esclarecimentos sobre o caso, mas, até agora, não teve retorno.
Por nota, a Comissão Executiva da Câmara Municipal repudiou "com veemência os atos violentos ocorridos neste sábado (29), durante manifestação no centro da cidade. Uma das vítimas destes atos foi a vereadora Liana Cirne (PT), covardemente atingida nos olhos com spray de pimenta, quando tentava dialogar com policiais militares na Ponte Princesa Isabel."
Já a OAB-PE exigiu "uma apuração rigorosa e punição por parte do Governo do Estado de Pernambuco dos responsáveis pela atuação da Polícia Militar durante toda a manifestação", também repudiou a violência contra a vereadora Liana Cirne e informou que levará o caso "aos órgãos competentes e estará à disposição para prestar assistência no caso".
O protesto teve concentração na Praça do Derby, por volta das 9h, e contava com a presença de centrais sindicais, movimentos estudantis e sociais e representantes da sociedade civil, que denunciavam ações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de sua equipe principalmente durante a pandemia da covid-19.
O que se observou no ato foi o uso massivo de máscaras - principalmente do tipo PFF2/N95, a mais recomendada para vedação contra o vírus, segundo estudo recente da Universidade de São Paulo - e a tentativa de se manter um distanciamento social e fornecer álcool para higienização das mãos. Mas, mesmo assim, aglomerações foram registradas. Os militantes carregavam bandeiras e cartazes, muitos com os dizeres: "Fora Bolsonaro, Mourão e militares", "Cadê a vacina, Bolsonaro?" e "Não tem vacina? A culpa é dele!". A passeata começou em torno das 10h40.
Além das críticas a Bolsonaro, outras pautas também foram trazidas pelo ato, como detalhou o representante da Central Sindical e Popular (CSP) Conlutas no Recife, Carlos Elias. "A principal reivindicação é derrubar o governo Bolsonaro e Mourão, mas também é pelo auxílio emergencial para todas as pessoas que estão passando por necessidade, contra a reforma administrativa que vai atacar a saúde e a educação, destruindo serviços públicos, contra as privatizações, contra a destruição do meio ambiente e em apoio à luta dos povos indígenas", explicou.
Ainda, denunciou as medidas tomadas pelo Governo de Pernambuco e pela Prefeitura do Recife. [Estamos aqui para] denunciar também o negligenciamento com as medidas sanitárias tanto no governo Bolsonaro, quanto no governo Paulo Câmara, e aqui, no Recife, do governo João Campos", disse Elias.
Segundo levantamento da BBC News, o protesto contra o governo Bolsonaro estaria marcado para este sábado (29) em pelo menos 85 cidades brasileiras. Nessa sexta (28), a 34ª Promotora de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital, com atribuição na Promoção e Defesa da Saúde do MPPE, expediu a Recomendação referente ao Procedimento Administrativo nº 02061.000.268/2020 para a não realização de quaisquer atos que possam vir ocasionar aglomerações de pessoas.
O documento destinava-se aos integrantes das Frentes Povo sem Medo e Brasil Popular, a Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares, o Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a União Nacional dos Estudantes (UNE), bem como as demais entidades e movimentos sociais que estão convocando e convidando a população para o ato em questão.
Ainda assim, muitas organizações decidiram manter a manifestação. "Fizemos um encontro ontem com todas as lideranças que estão hoje nessa atividade, e agora mesmo estamos seguindo todos os protocolos, existe uma equipe que está fazendo o processo de separar as pessoas e higienizar as suas mãos. A princípio, seria uma caminhada até o centro, mas foi abortada. Não vai ter mais a caminhada, mas sim um ato simbólico envolvendo todas as entidades e movimentos sociais que estão aqui", relatou o diretor da Federação Única dos Petroleiros, Luis Lorenzon.
Horas após a concentração na Praça do Derby, contudo, os manifestantes saíram em caminhada pela Avenida Conde da Boa Vista.
A classe dos petroleiros protestou, principalmente, contra as privatizações em curso no país. "Sabemos do compromisso que temos não só conosco, militantes, mas também com a própria população. Dessa forma, queria deixar claro que a gente vem aqui externar a nossa pauta dos petroleiros, e dizer que somos contrários a esse processo de privatização que está em curso no Brasil todo", expôs Lorenzon.
A manifestação também ocorre na Praça Maria Auxiliadora, no Centro de Petrolina, no Sertão do Estado, e vai circular por algumas ruas do Centro da cidade. Segundo os organizadores, há orientações para que os presentes respeitem as medidas sanitárias de proteção à covid-19.
“Estamos organizando três filas, respeitando a distância de 1,5m das pessoas. Temos seis faixas para facilitar a distribuição [dos manifestantes], e durante todo o ato terá distribuição de álcool em gel por nossa equipe de segurança, também estamos distribuindo máscaras PFF2 para pessoas e a equipe de segurança mai estar vigilante para que as pessoas não se aglomerem, retirem ou abaixem a máscara”, explicou Fernanda Vilas Boas, membro da União da Juventude Comunista (UJC).
O ato tem a participação ainda de membros do Diretório Central dos Estudantes da Univasf, União dos Estudantes Secundaristas de Pernambuco (UESPE), Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Educação (SINTEP), Seção sindical dos docentes da UNIVASF (SINDUNIVASF), Sindicato dos Trabalhadores Assalariados Rurais (STAR), Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Energia Elétrica (Sinergia), Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Sintraf), Associação Raízes, Coletivo Cores, Rua Juventude Anticapitalista, União da Juventude Socialista (UJS) e dos movimentos Olga Benário e Luta de Classes (MLC).
“Estamos defendendo a vida do povo brasileiro. Vemos o que o governo federal, desde o começo, não tem tomado nenhuma medida efetiva contra a pandemia e ainda menosprezou a disseminação do vírus. A situação do país está cada vez pior, com preços altos de alimentos, gás e da gasolina, e com o desemprego se mantendo. Também estamos defendemos a vacinação da população. O vírus não é o único culpado [pelo cenário atual], mas também o governo federal”, disse Bruno Melo, membro da Unidade Popular (UP).
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PE), a Câmara de Vereadores do Recife e diversos políticos do Estado repudiaram a violência praticada pela PM para dispersar o protesto contra o governo Bolsonaro no início da tarde deste sábado (29/5), no Centro do Recife. A agressão com spray de pimenta contra a vereadora Liana Cirne foi destacada em todos os posicionamentos. Em alguns casos, o episódio é definido como um “ataque covarde” por parte dos policiais. Também exigem uma investigação rígida por parte do governo de Pernambuco.
Confira:
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PE)
“A OAB Pernambuco, como entidade representativa da advocacia, de defesa do estado democrático de direito e da sociedade civil, vem a público exigir uma apuração rigorosa e punição por parte do governo do Estado de Pernambuco dos responsáveis pela atuação da Polícia Militar durante toda a manifestação ocorrida neste sábado (29/5), na capital pernambucana. Imagens reportam uma repressão absolutamente desproporcional por parte da PMPE, com uso de balas de borracha, gás lacrimogêneo e spray de pimenta, contra grupos que realizavam o ato na área central da cidade.
A OAB Pernambuco também condena e repudia a covarde agressão sofrida pela advogada e vereadora do Recife Liana Cirne por parte de um policial militar até o momento ainda não identificado. A agressão foi filmada e as imagens indicam que a atitude do policial não guarda amparo em qualquer regra ou protocolo sobre o uso legítimo da força. Muito pelo contrário. Tais imagens ressaltam uma agressão gratuita a uma mulher pública no exercício de um ato de cidadania, que não praticava qualquer atitude ao ponto de colocar em risco a integridade do militar.
A OAB Pernambuco, por meio da Comissão de Direitos Humanos e da Comissão de Defesa e Assistência às Prerrogativas Profissionais, irá levar o caso aos órgãos competentes e estará à disposição para prestar assistência no caso”.
Câmara Municipal do Recife:
“Em nome do Poder Legislativo do Recife, a Comissão Executiva da Câmara Municipal repudia com veemência os atos violentos ocorridos neste sábado (29), durante manifestação no centro da cidade. Uma das vítimas destes atos foi a vereadora Liana Cirne (PT), covardemente atingida nos olhos com spray de pimenta, quando tentava dialogar com policiais militares na Ponte Princesa Isabel. Esperamos do governo do Estado uma apuração rígida sobre os responsáveis por estas ações”, afirmou o presidente da Câmara do Recife, vereador Romerinho Jatobá (PSB).
Codeputadas Juntas e vereadora Dani Portela (Psol)
“Autoritarismo, violência e negligência do Governo de Pernambuco marcaram o encerramento do ato pacífico #ForaBolsonaro, em Recife. As mandatas das codeputadas Juntas (PSOL/PE) e da vereadora Dani Portela (PSOL/Recife) estiveram juntas no ato, usando do direito de manifestação por vacina, comida, teto e dignidade, e testemunharam o cumprimento geral de dos protocolos de segurança sanitária estabelecidos pelas autoridades de saúde, até a chegada à Avenida Guararapes. Nessa altura da caminhada, o Batalhão de Choque da polícia aguardava a manifestação com estrutura de guerra, atacando as e os manifestantes com bombas de gás, spray de pimenta e força física, num ato desproporcional, sem motivação e gerador de tumulto, pessoas feridas, pessoas presas sem justificativa. As imagens mostram cenas de terror”.
A Juntas e a vereadora Dani Portela (Psol) presenciaram a violência policial contra o ato desta manhã e formalizarão denúncia contra o governo de Pernambuco. Parlamentares seguem agora para a Central de Flagrantes onde há pessoas detidas pela polícia sem justa causa. O governo precisa responder pela truculência da ação de hoje em Recife”.
Teresa Leitão - Deputada Estadual e líder do PT na Alepe
“O Brasil inteiro foi às ruas neste sábado. Atos ainda limitados em participação, por causa da pandemia, mostraram toda a indignação com o governo Bolsonaro e a solidariedade com as vítimas da covid-19, do desemprego e da fome. Nada mais urgente e pelo bem do povo brasileiro.
Em Pernambuco, o ato pacífico que caminhou em fila indiana pelo trajeto tradicional da nossa luta, foi interrompido pela brutalidade gratuita da Polícia Militar. Bombas de efeito moral, metralhadoras em punho, gás de pimenta foram alguns dos equipamentos exibidos e usados.
Vários manifestantes e a vereadora do PT, Liana Cirne, saíram feridos do ato. Na condição de deputada estadual, líder do PT na Assembleia Legislativa, cobro as devidas explicações ao governador Paulo Câmara. Nosso estado vem sendo vítima de toda política bolsonarista em relação ao tratamento da pandemia. Tem encontrado no governador e sua base aliada, forte voz de denúncia e de reivindicação.
Como se explica um ato pacífico contra isto ser reprimido com tamanha violência pelo aparato policial do Estado? Espero que o governador se posicione e tome as providências cabíveis”.
Rinaldo Júnior - Vereador do Recife e Presidente da Força Sindical em PE
"Repudiamos com veemência as agressões da Polícia Militar de Pernambuco aos trabalhadores e trabalhadoras, aos movimentos sociais e à colega vereadora Liana Cirne que participavam de um ato pacífico e democrático hoje no centro do Recife. Que sejam feitas as apurações e que os responsáveis sejam punidos com o maior rigor da Lei."
Defensoria Pública do Estado de Pernambuco
"A Defensoria Pública do Estado de Pernambuco, através do Núcleo de Defesa e Promoção de Direitos Humanos e do Núcleo Criminal da Capital, vem externar profunda indignação com as manifestações de uso de força por parte de agentes do estado durante manifestação realizada na manhã de hoje, 29/05/2021.
A atuação de todo agente público deve ser pautada nos princípios da legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderação e conveniência.
Nesse sentido, o uso da força pelos agentes de segurança pública deverá se pautar na legislação nacional, nos documentos internacionais de proteção aos direitos humanos e em protocolos internos, considerando em especial que “os funcionários responsáveis pela aplicação da lei só podem empregar a força quando estritamente necessária e na medida exigida para o cumprimento do seu dever.” (art. 3 do Código De Conduta Para os Funcionários Responsáveis Pela Aplicação Da Lei Adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, no dia 17 de Dezembro de 1979, através da Resolução nº 34/169).
Os fatos hoje noticiados indicam contrariedade aos parâmetros acima apontados, expondo uma atuação desproporcional por parte das forças de segurança, que devem estar sedimentadas no respeito aos direitos humanos, incluindo o de manifestação e reunião pacíficas.
Nesse sentido, a Defensoria Pública do estado de Pernambuco coloca-se à disposição para prestar assistência jurídica integral e gratuita às pessoas e organizações cujos direitos tenham sido violados, recebendo as respectivas comunicações através do canal eletrônico: nucleodh@defensoria.pe.gov.br"
Sempre pratiquei na minha condição de governador de Pernambuco, os mesmos princípios que defendo como cidadão e democrata.
— Paulo Câmara 40 (@PauloCamara40) May 29, 2021
Repudiamos todo ato de violência, de qualquer ordem ou origem. pic.twitter.com/rI5L52ypxh
Salvador