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Após repercussão, escola em Aldeia reitera posicionamento de que campanha da Burger King foi "excesso"

Escola Eccoprime foi amplamente criticada após ter se posicionado contra campanha de orgulho LGBTQIA+ da rede de fast food.MPPE informou que irá apurar denúncias contra a instituição

Cadastrado por

Katarina Moraes

Publicado em 28/06/2021 às 17:36 | Atualizado em 28/06/2021 às 22:03
Escola fez publicação no Instagram afirmando que a campanha da Burger King "atacava crianças e famílias cristãs" - REPRODUÇÃO/INSTAGRAM/ESCOLAECCOPRIME

Atualizada às 22h03

A Escola Eccoprime, localizada em Aldeia, Camaragibe, na Região Metropolitana do Recife, foi às redes sociais nesta segunda-feira (28) se posicionar novamente contra a campanha de orgulho LGBTQIA+ da Burger King. A instituição reafirmou que a peça publicitária intitulada "Como explicar?", que traz a visão de crianças sobre as diversas orientações sexuais, foi um "excesso", e pediu que pais cristãos estejam atentos e protejam seus filhos de "campanhas publicitárias promotoras da sexualidade precoce". Nesta tarde, o Ministério Público de Pernambuco (MPPE) informou que irá apurar denúncias contra a escola.

Na recente publicação, a Eccoprime disse repudiar "toda e qualquer violência contra a comunidade LGBTQIA+", e rejeitar "qualquer discurso ofensivo à dignidade humana, ou mesmo qualquer espécie de preconceito ou discriminação". E que, "como cristãos", são contra a homofobia e a transfobia. A instituição afirmou que não houve "intenção alguma de desdenhar quaisquer indivíduos ou grupos", mas que se reserva no direito de "expressar seus limites e crenças dentro dos limites jurídicos".

Tudo começou a partir de uma publicação que critica a campanha da rede de fast food. Nela, crianças tratam a diversidade com naturalidade e pureza. 'Homem pode casar com homem, mulher com mulher. Não tem nada de mais”, disse uma pequena. “Para mim, todo mundo pode amar todo mundo”, expôs outra criança. “Tem problema nenhum”, argumentou um menino. “Na minha casa o T de trans, o G de gay, e essa é a melhor família que eu podia ter”, conclui outra.

No Instagram, a Eccoprime trouxe um card com a foto de uma criança comendo hambúrguer e fritas da rede de fast food e afirmou que a campanha atacava crianças e famílias cristãs. “Nós, como pais, precisamos defender os nossos filhos e nos posicionar”, disse. A unidade educacional anunciou que, por causa da propaganda, criaria o que chamou de “Centro de Treinamento de Pais Cristãos (CT), “com o intuito de nos armarmos contra estas e outras setas inflamadas do inimigo!”.

O site da instituição diz aos pais que o CT é um dia inteiro que eles se preparem "para os ataques que enfrentamos todos os dias na criação de filhos e aumentar massivamente as chances de sucesso e felicidade dos seus filhos em Deus". O evento ocorrerá presencialmente no dia 18 de setembro com a presença do pastor Tedd Tripp e de sua esposa Margy Tripp, e custa R$ 367 à vista ou 12 parcelas de R$ 35,76 para um casal. Como uma das explicações sobre a necessidade de sua realização, a Eccoprime traz o dado de que "52% dos jovens estão confusos com relação à sua sexualidade".

O engajamento da publicação nas redes sociais foi enorme: mais de 24 mil curtidas e 30 mil comentários. “Vocês acham mesmo que trabalham com educação? Realmente acreditam que esse tipo de postura é a mais adequada para lidar com a diversidade do mundo? Que tipo de formação é essa que se diz cristã, mas reproduz um discurso de condenação baseado em dogmas religiosos historicamente violentos e excludentes?”, questionou um internauta. “Maravilhosos!”, disse outro. “Parabéns, @escolaeccoprime. Discurso coerente com o Evangelho”, comentou outro.

 
 
 
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Uma publicação compartilhada por Eccoprime (@escolaeccoprime)

Um abaixo assinado com 746 assinaturas foi protocolado também nesta tarde e pediu que o MPPE e a Secretaria de Educação e Esportes de Pernambuco tomem providências sobre o caso, por considerarem que a instituição feriu “o princípio democrático do respeito às diferenças” e fomentou “a intolerância e a violência”.

“Os danos de uma publicação desse tipo são em várias dimensões e em várias gerações, porque ela sedimenta na cabeça de crianças e adolescentes que se alguém não tem uma orientação sexual dentro da heteronormatividade, ela está errada e pecando, e que não deveria existir. Queremos que a escola repare o dano que tem causado, e que ela tenha o seu credenciamento revisado, porque isso fere direitos da existência de um grupo populacional”, explicou Sylvia Siqueira, conselheira estadual de Direitos Humanos e criadora do abaixo assinado.

A psicóloga infantil Jullia Caldas explica que impedir que a informação sobre a existência da comunidade LGBT chegue às crianças não é uma medida efetiva para moldar a orientação sexual delas. "Temos a impressão de conseguiríamos adestrar totalmente os gostos, escolhas ou decisões tomadas pelos nossos filhos desde que começamos a imaginá-los. A realidade é que, ainda crianças, eles já são pessoas em formação e, mais do que nunca, no mundo e geração em que vivemos, terão acesso às mais diversas possibilidades, sejam elas profissionais, sexuais ou de qualquer outra ordem. Cabe aos pais refletirem sobre como essa informação chegará, com quanta segurança ou veracidade ela chegará", disse.

O Plano Nacional de Educação (PNE), traz como uma de suas diretrizes a “promoção dos princípios do respeito aos direitos humanos, à diversidade e à sustentabilidade socioambiental”. O Marco Regulatório da Educação Estadual de Pernambuco, de 2020, afirma que é dever das instituições de ensino “a observância dos princípios estabelecidos na proposta pedagógica, os quais devem atender à legislação vigente”, o que, para o advogado e presidente Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero OAB-PE, Sérgio da Silva Pessoa, foi descumprido com a publicação.

“A comissão da diversidade entende que a publicação possui elementos de natureza homotransfóbica, feita de forma equivocada e com cunho preconceituoso, enquanto o dever da escola deveria ser de promover um espaço de respeito ao coletivo e à cidadania. Desde 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu as LGBT também como um formato de família, e, em 2019, que atos como o praticado pela escola devem ser enquadrados na Lei do Racismo, que assegura o direito à expressão religiosa, desde que não provoque ou incite a violência contra pessoas LGBT”, explicou.

Em nota, a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos de Pernambuco (SJDH-PE) informou que após o recebimento de denúncias, direcionou o caso para Centro Estadual de Combate à Homofobia (CECH), programa vinculado à Secretaria Executiva de Direitos Humanos (SEDH), "o qual já vem realizando, desde a primeira denúncia recebida, o encaminhamento para o MPPE, colocando-se à inteira disposição do órgão para o acompanhamento e tomada das providências e medidas cabíveis ao caso".

A SJDH-PE também destacou que "repudia todo e qualquer ato de violência, preconceito ou discriminação contra a população LGBTQIA+ e enfatiza que LGBTQIA+fobia é crime inafiançável e imprescritível, punível na forma da Lei nº 7.716/89".

 

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