Há exatos 30 anos, quando a principal notícia do dia deveria ser uma manifestação realizada por trabalhadores do Porto do Recife, que cobravam a rápida apuração do assassinato de um arrumador do terminal, a jornalista Rosália Rangel, pouco após ter encerrado mais um dia de trabalho na redação do Jornal do Commercio, recebeu informações sobre uma notícia que jamais desejara dar: a queda de um avião bem próximo à sua casa, no bairro do Ipsep, Zona Sul do Recife, matando 17 pessoas, entre elas duas que não estavam na aeronave. Horas após o acidente, a esposa de uma das vítimas também havia sido incluída entre os mortos. No dia seguinte, porém, a informação foi desmentida.
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“Como já morava nas proximidades do local onde ocorreu o acidente, lembro de, ainda no ônibus, um garoto correndo do lado do veículo gritando que um avião havia caído na praça. A parada do ônibus era próxima ao local. Fui até lá. Mas, como o acidente havia ocorrido há pouco tempo, havia muita gente, e os policiais não deixavam ninguém passar, até por conta do perigo de explosões”, relembra ela, que foi uma das responsáveis por cobrir o trágico acidente.
“O sentimento das pessoas que moravam perto da praça era de desespero, curiosidade, tristeza e muita agonia por ter vizinhos atingidos pela queda”, conta Rosália, afirmando que, no dia seguinte, na redação, o clima era bem parecido com o sentido na praça: “tristeza e ansiedade”.
‘Cenário de guerra’
Quem também relembra os bastidores daquela agoniante cobertura é o jornalista Rodrigo Barros, à época estagiário do JC. Assim como Rosália, ele já não estava na redação. Havia terminado seu expediente antes do acidente. Quando recebeu a notícia da queda do avião, Barros estava largando da faculdade.
“Eu soube do acidente, ainda na noite em que aconteceu, por uma coincidência: uma amiga que estava comigo e morava no Ipsep, perto do local da ocorrência, recebeu as primeiras informações por telefone. Comecei a pedir mais informações”, conta ele, explicando que apenas no dia seguinte foi ao local do desastre.
“[Quando cheguei lá,] o cheiro era forte, uma mistura de combustível com outros materiais. Tinha fumaça, destroços e muita gente, porque havia Bombeiros, Polícia Científica e outras forças de segurança. Era um cenário de guerra, mas precisei me ambientar rápido para conversar com as pessoas.”
As imagens da tragédia
Diferente de Rosália e Rodrigo, a jornalista Carmen Almeida estava na redação do JC no momento da queda do avião. “Não havia outro assunto na redação. Chocou todo mundo”, rememora ela. “Ficamos todos assustados e querendo informações”, completa Carmen, explicando que, assim como os colegas, apenas no outro dia foi até o local, mas o cenário ainda era devastador.
“São 30 anos, não lembro muito dos detalhes, mas o cheiro sim. Ficou na lembrança, era de querosene e mais outros cheiros, que acredito serem dos corpos, além de todo material da aviação e vizinhança”, afirma ela.
“Quando cheguei na praça senti tristeza, os vestígios do acidente, a vizinhança triste com as mortes, as outras crianças, segundo contaram os vizinhos, ficaram chocadas”, conclui.
‘Quando lembro disso, me arrepio’
Atual diretor de redação do JC, o jornalista Laurindo Ferreira foi um dos primeiros repórteres a chegar na praça onde caiu o Bandeirante, prefixo PT-SCU, que fazia o Voo 115 da Nordeste Linhas Aéreas. À época, Ferreira escrevia para a revista Veja e estava na sucursal da publicação no bairro de São José, Centro do Recife, quando soube do acidente.
“Ouvimos a notícia pelo rádio e saímos correndo, eu e um repórter fotográfico. Quando chegamos lá, aquela cena me impactou. A primeira coisa que vi foi um corpo de uma mulher grávida com a mão sobre a barriga, talvez, na tentativa de proteger o bebê. Quando lembro disso, me arrepio”, diz Laurindo, lembrando que na sua chegada ainda era possível ver as chamas e fumaças saindo dos corpos.
Quem também participou da cobertura foi a jornalista do JC Angela Fernanda Belfort, que à época trabalhava como correspondente da Folha de S.Paulo na capital pernambucana. Ela relembra as cenas daquele dia e define como as “mais tristes” que viu na vida.
“Eu estava esperando somente o Jornal Nacional acabar para largar. No entanto, a última frase do apresentador do JN foi: acabou de cair um avião, no Bairro de Ipsep, no Recife. Fui com um taxista ao local, estava tudo escuro devido à falta de energia. Ao se aproximar do local, o cheiro das pessoas queimadas ficava mais forte”, relembra ela. “Foi uma das cenas mais tristes que vi na vida: tudo carbonizado. O cheiro das pessoas queimadas era insuportável, muito triste e apontava para o tamanho da tragédia”, completa.