MOBILIDADE

Pedestrianização da Mamede Simões: quando e por que proibir carros em ruas do Recife?

Rua já é a 17ª que se tornará exclusiva para pedestres na capital pernambucana. Entenda o fenômeno

Cadastrado por

Katarina Moraes

Publicado em 05/01/2024 às 16:07 | Atualizado em 05/01/2024 às 16:16
O anúncio da pedestrianização da Rua Mamede Simões, localizada na área central da cidade, foi feito no final de 2023 - ALEXANDRE GONDIM/ACERVO JC IMAGEM

A expansão das cidades e a popularização dos automóveis inverteu a lógica da mobilidade nos tempos modernos. A rua, que antes abrigava todos os meios de locomoção, passou a ter os veículos como prioridade e afastou os pedestres para as calçadas. Hoje, Recife e outras capitais aderem ao movimento contrário: o de tornar vias exclusivas para o caminhar — como vai acontecer em breve com a Rua Mamede Simões.

O anúncio da pedestrianização da via, localizada na área central da cidade, foi feito no final de 2023 atendendo a uma demanda antiga dos frequentadores dela, que é tomada por bares e restaurantes. Diariamente, à noite, a passagem dos veículos já era dificultada, acontecendo pelos pequenos trechos que não são ocupados por mesas e cadeiras.

Agora, ela terá o pavimento elevado à altura das calçadas, proibindo completamente a passagem de carros entre a Rua da União e a Rua da Aurora — trecho que ganhará também áreas de convivência, bicicletários e paisagismo. Já entre o Parque 13 de Maio e a Rua da União, vão poder circular somente veículos para carga e descarga dos moradores da rua.

Para garantir isso, sinalizações serão instaladas para informar que quem passar por esse trecho sem esse intuito poderá ser multado.

Projeto gráfico que mostra como a Rua Mamede Simões deve ficar após a pedestrianização - DIVULGAÇÃO
Projeto gráfico que mostra como a Rua Mamede Simões deve ficar após a pedestrianização - DIVULGAÇÃO

CRÍTICAS DOS MORADORES

Essa exceção de tráfego foi dada pela Prefeitura do Recife em resposta aos próprios moradores da rua, mas mesmo com ela alguns se mostram preocupados com a pedestrianização. “Precisam chamar os moradores para serem ouvidos e fazer um projeto que atenda às necessidade de todos, não chegar impondo”, disse Carméria Régia Carlos, 57, síndica do Edifício Alfa, que fica na rua.

Em geral, eles temem que a locomoção - principalmente das pessoas com mobilidade reduzida - seja dificultada, que a rua seja esvaziada pela falta de estacionamentos, atraia pessoas em situação de rua e que cause congestionamento nas ruas próximas. “À primeira vista, acho a pedestrianização um problema porque o projeto não dialoga conosco”, disse o jornalista e morador Bruno Vieira, de 37 anos.

Há, também, os menos pessimistas. André Rosemberg, proprietário do Bar Central, um dos mais tradicionais da via, acha que a mudança “pode ser uma coisa boa ou muito ruim”. “Se não tiver controle urbano, a tendência é que a Mamede decaia ainda mais. E se os bares fecharem, aí piora”, opinou.

Por isso, ele pede que, junto à zona para pedestres, sejam feitas melhorias na rua. “Tem que vir segurança, iluminação. Hoje tem um assédio constante de gente em situação de rua que acaba colocando a Mamede no roteiro por falta de assistência social ativa que resolva o problema deles”, afirmou.

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QUANDO PEDESTRIANIZAR?

A análise do arquiteto e urbanista Silvio Melo é de que o maior problema da pedestrianização da Mamede SImões aparenta ser, na verdade, uma falta de comunicação entre o município e os moradores dela. “Basicamente, falta uma explicação. Acho improvável que eles não aprovem depois que a coisa esteja pronta, porque já é uma via com fluxo reduzido, que as pessoas passam com menos velocidade”, colocou.

Isso porque, para ele, a dinâmica da Mamede já a vocaciona para a priorização do pedestre. "É legítima a preocupação dos moradores, que é fruto da desigualdade [no caso das pessoas em situação de rua]. Sabemos que qualquer coisa no Centro precisa ser muito bem pensada, porque ao mesmo tempo que é fértil para a mudança, é delicada, porque afeta um espectro social muito grande. Mas vejo com bons olhos.

O professor de engenharia civil da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) Maurício Pina pontua que pedestrianizar é uma forma de tornar a rua mais humanizada. "O que importa, acima de tudo, é a segurança da via para o pedestre, por ser o elemento mais vulnerável da corrente de trânsito”, alegou.

No entanto, ele chama atenção para a necessidade disso ser feito a partir de estudos de impacto no trânsito, que garantam que não haja o afogamento de outras ruas. Por isso, a reportagem do JC chegou a perguntar à Prefeitura do Recife se haverá mudança nas ruas vizinhas, mas não foi respondida.

EXEMPLOS PELO MUNDO

Na capital pernambucana, é levado em consideração as vias só para pedestres o fato deles representarem 46% das vítimas fatais em sinistros de trânsito, segundo Relatório Preliminar de dados coletados entre 2017 e 2019.

Além da Mamede, Recife já conta com 16 ruas exclusivas para o caminhar. A escolha tem sido feita em vias com predominância de atividade comercial e turística, como a Avenida Rio Branco, Rua da Moeda e Rua do Bom Jesus, no bairro do Recife, e a Rua da Imperatriz, na Boa Vista.

Essas características seguem as de outros exemplos bem sucedidos ao redor do mundo, como a Times Square, em Nova York, onde circulam em torno de 400 mil pessoas diariamente, a Calle Florida, em Buenos Aires, a Rue Montorgueil, em Paris, entre outras.

“Experiências de outras cidades do Brasil e do mundo são positivas, porque a via se torna mais humana, sem congestionamento, acidentes, situações que nos impactam”, disse Maurício.

Lista das ruas de pedestres no Recife

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