Você conhece alguém com diabetes? É possível que boa parte dos leitores responda positivamente a essa pergunta. A doença atinge 16 milhões de brasileiros, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Mas, além de se preocupar com a produção de insulina e taxas de glicose, os pacientes devem ficar atentos à saúde dos olhos; a retinopatia é uma complicação causada pela diabetes, não tem sintomas em sua fase inicial e é a causa mais comum de cegueira irreversível em adultos.
O analista de crédito Marcos Vila Nova, de 49 anos, descobriu que era diabético aos 30. Demorou muito até procurar um oftalmologista para prevenir ou controlar qualquer complicação ocular que pudesse ser causada pela doença. Até que os sintomas e sinais de uma retinopatia mais avançada começaram a aparecer.
“A visão vai ficando embaçada, você começa a ter dificuldades para enxergar de longe, mas pensa que é um desgaste normal da idade”, conta. Mas não era. E ele não é exceção: após 20 anos de diabetes, quase todos os pacientes do tipo 1 e mais de 60% dos pacientes do tipo 2 apresentam algum grau de retinopatia.
Na foto: retinopatia diabética leve, quadro inicial, onde a visão central não está afetada
Quando o corpo não consegue produzir ou produz pouca insulina, como acontece na diabetes, a glicose não é utilizada da maneira adequada. Órgãos, vasos sanguíneos e nervos podem sofrer danos devido a essa alteração química. Ela interfere, por exemplo, na resistência vascular e no fluxo sanguíneo, afetando os vasos da retina, parte do olho que recebe estímulos luminosos e transforma-os em impulso nervoso para formar imagens no cérebro.
“A retinopatia diabética tem como início microaneurismas, pequenas alterações nos vasos do olho”, explica o oftalmologista e especialista em retina João Lins, do Instituto de Cirurgia Ocular do Nordeste (Ícone). Esses microaneurismas podem aumentar de tamanho, evoluindo para bloqueios ou hemorragias. “A retina fica com menos oxigênio disponível e o organismo começa a produzir substâncias para formar mais vasos sanguíneos, na tentativa de levar esse oxigênio necessário. Mas acaba ficando pior, pois esses vasos não são adequados, nem em número, nem em competência”, continua o médico.
O que geralmente provoca a baixa de visão na retinopatia é o edema macular diabético, um acúmulo de líquidos na mácula – parte responsável pela visão central. É aí que o paciente procura ajuda. No entanto, se a doença ocorrer em regiões periféricas, ela pode existir sem sintomas, o que a torna mais perigosa; a visão central pode estar boa, mas o olho pode estar comprometido.
A boa notícia é que dá para controlar e até reverter a retinopatia diabética com uma substância antiangiogênica, uma injeção aplicada diretamente no globo ocular. Ela atua a longo prazo para ajudar o corpo a perceber que não precisa replicar os vasos. Além da injeção, os oftalmologistas indicam também a aplicação do laser – estudos mais recentes dizem que o ideal é fazer uma combinação dos dois. “O tratamento a laser faz pequenas queimaduras no fundo do olho, na área periférica. A ideia é diminuir a área menos importante da retina e, com isso, diminuir a necessidade total de oxigênio, para que o pouco que tem seja suficiente”, esclarece.
Na foto: retinopatia diabética moderada, mas com edema macular. A visão se altera de forma mais acentuada
Depois de identificar a retinopatia diabética, sofrer um sangramento e fazer os tratamentos necessários com laser e antiangiogênicos, Marcos conseguiu manter 60% da visão em um dos olhos e voltou a enxergar bem com o outro. Hoje, leva uma vida normal. Mesmo assim, precisou se afastar do trabalho. “Eu tinha que preencher fichas e olhar documentações. No computador até consigo aumentar a letra e ver melhor, mas não posso fazer isso com a fonte da carteira de motorista, por exemplo”, lamenta.
Com o tratamento da própria diabetes, muitas vezes você consegue regredir a retinopatia a níveis normais. “Mas existe um ponto em que a doença segue o rumo dela, mesmo que as taxas estejam perfeitas”, alerta o oftalmologista. Marcos aprendeu isso da forma mais difícil. “Se eu tivesse que alertar as pessoas, eu diria: tem que ir para o oftalmologista. É diabético? Vá, mesmo que não tenha nenhum sintoma”, pontua.
A diabetes não é a única doença do corpo que pode trazer complicações para os olhos. A hipertensão também pode provocar a retinopatia, dessa vez, a hipertensiva. “Ela altera o formato dos vasos, o que pode levar a uma situação de derrame”, pontua João Lins. “Você tem uma mangueira e coloca água com muita pressão nela. Ela fica doidinha. Mas quando você diminui a vazão, ela volta ao normal”, exemplifica.
Se houver derrame, o tratamento também é feito com injeções de antiangiogênicos. No entanto, se a doença estiver controlada, a anatomia dos vasos vai melhorando também, diminuindo a possibilidade de derrames. O essencial é cuidar da doença e manter os níveis normais de pressão sanguínea.
“No caso das retinopatias diabética e hipertensiva, é fundamental controlar as doenças. Mas não espere sentir alguma coisa para procurar o médico”, finaliza o João.