A antiga estação ferroviária de Tacaimbó, município a 170 quilômetros do Recife, no Agreste, foi transformada em colégio. O prédio abriga seis salas de aula da Escola Municipal Sagrado Coração de Jesus. Alunos dos anos iniciais do ensino fundamental e de turmas da educação de jovens e adultos (EJA) estudam num espaço improvisado. Em Moreno, na Região Metropolitana do Recife, o cenário de improviso é realidade também na Escola Municipal Josefa Alves, onde o calor atrapalha a aprendizagem. Secretários das duas cidades argumentam que, apesar de investirem acima dos 25% exigidos por lei em educação, faltam recursos para melhorar a estrutura das escolas.
“Pagar o piso do magistério, bancar merenda e transporte escolar com valores insuficientes repassados pelo governo federal e pelo Estado e ainda assegurar manutenção da rede significam um esforço imenso para municípios pequenos como Tacaimbó. Recebemos, em 2018, R$ 6,5 milhões do Fundeb, sendo 91% para pagar salários. Nossas despesas foram de R$ 7,6 milhões, um investimento de 45% só em educação. E ainda assim reconhecemos que é preciso investir mais”, explica o secretário municipal de Educação, Célio Leonel.
“Ficamos impossibilitados de realizar investimentos importantes, como construir ou reformar escolas. Sabemos que a estação ferroviária não é o local adequado para as aulas, mas não temos outra opção”, diz Célio.
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Na Escola Josefa Alves, em Moreno, falta água nos banheiros. No recreio, crianças brincam no pátio pois não há espaço ao ar livre nem parquinho, embora os alunos sejam da educação infantil e dos anos iniciais do fundamental. Nas salas, quase nenhum ventilador funciona. Paredes têm infiltrações e, em dias de chuva, há alagamentos.
Segundo a secretária de Educação, Ana Selma Santos, 84% da verba do Fundeb (R$ 25,5 milhões) foram para pagar salários. “Nossa gestão colocou 34% dos recursos municipais em educação. E sabemos que ainda tem muito a ser feito. Garantir a qualidade e melhorar a aprendizagem são desafios”, afirma. A cidade não paga o piso do magistério.
“Com sacrifício, pagamos as contas. O recurso do Fundeb é indispensável, mas é insuficiente. Não conseguimos, infelizmente, fazer tudo que a comunidade escolar precisa”, reconhece o secretário de Educação de Palmares, Flávio Miranda.
"O Fundeb prevê a valorização do professor, mas só serve para pagar salário. É preciso mais formação e incentivo e melhores condições de trabalho”, diz a professora Sandra Nascimento, 53 anos. Ela leciona nas redes municipais de Tacaimbó e Belo Jardim.
Semana passada houve o primeiro debate, da atual gestão federal, sobre o Fundeb. Promovido pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), autarquia que gerencia o Fundeb, o evento reuniu técnicos e a deputada Dorinha Seabra em Brasília. Pontos críticos do fundo foram apresentados pela coordenadora de Operacionalização do Fundeb, Sylvia Gouveia.
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Um deles é o fato de municípios com alto rendimento receberem verba complementar da União apenas por fazerem parte de Estados que não alcançaram, com arrecadação própria, o valor mínimo nacional por aluno.
“Não há dúvidas de que todos nos preocupamos muito, não apenas em tornar o Fundeb permanente, mas trabalhar na redefinição do modelo, para que se torne um fundo mais eficaz e redistributivo”, diz Sylvia.
O que é o Fundeb
- Foi criado em dezembro de 2006, por meio de uma emenda constitucional. Começou a vigorar em janeiro de 2007 e tem validade até dezembro de 2020
- O fundo financia todas as três etapas da educação básica nas redes públicas: educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. Pelo menos 60% do recurso deve ser usado para pagamento dos salários dos professores
* De onde vem o dinheiro
- É um conjunto de 27 “poupanças” estaduais nas quais cada um dos 26 Estados e o Distrito Federal depositam parcela de seus impostos e transferências constitucionais vinculadas à educação básica (são cerca de 20 impostos diferentes, como IPVA e ICMS)
- Essas poupanças são redistribuídas para as redes de ensino municipais e estadual, de acordo com o número de alunos matriculados
- Com essa distribuição, cada Estado passa a ter um valor de referência por aluno e, em seguida, o governo federal define um valor mínimo nacional por aluno
- Os Estados que não conseguirem atingir esse valor mínimo recebem complemento da União. Em 2019 recebem esse complemento sete Estados do Nordeste e dois do Norte: Pernambuco, Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Piauí, Amazonas e Pará
- Após a definição do valor de cada aluno é feita uma ponderação que considera a etapa do estudante, se a escola dele é urbana ou rural e se o ensino é regular ou integral. Um aluno de creche e que fica o dia todo na unidade de ensino, por exemplo, custa mais que um estudante do ensino médio que permanece apenas um turno na escola
* Pagamento
- Os recursos do Fundeb são distribuídos de forma automática (sem necessidade de autorização ou convênios) e periódica, mediante crédito na conta específica de cada governo estadual e municipal
- O dinheiro do Fundeb só pode ser usado para salários de professores (no mínimo 60%) e outros profissionais da educação ou em ações da educação básica
- O montante arrecadado por cada Estado é redistribuído apenas entre os municípios e a rede estadual dessa unidade da Federação
Fontes: FNDE e Movimento Todos pela Educação