Gaúcho radicado em Pernambuco, o empresário Paulo Magnus não imaginava que sua vida mudaria após conhecer Maria Rita Lopes Pontes, a Irmã Dulce, aos 27 anos, quando saiu do Recife no seu carro, um Corcel 2, e percorreu mais de 800 quilômetros até Salvador para ajudar a freira em suas obras sociais. Segundo Paulo, desde o encontro com a beata, em 1988, a energia de Irmã Dulce, a quem sempre chamou de “minha santa”, o acompanha em sua trajetória. Essa relação começou quando o empresário recebeu de uma irmã da caridade do Colégio Vera Cruz, em Olinda, no Grande Recife, o convite para ajudar ‘Dulce dos pobres’ a manter de pé seus projetos de caridade na capital baiana.
Na época, ele prestava serviços de tecnologia ao Hospital Tricentenário, também em Olinda, quando a Irmã Teolina lhe contou que sobre Irmã Dulce. “Eu não tinha nem ideia de quem era Irmã Dulce, nem o que se passava com ela, mas quando recebi o convite para conhecê-la, fui disposto a ajudá-la”, conta Paulo Magnus, que, de tanto ir a Salvador ao encontro da primeira santa brasileira, se tornou amigo dela. Ele que sempre que visitava a freira, ela o guiava pelo local onde acontecia seu projeto. “Todas as vezes que eu ia lá, ela segurava no meu braço, por ser bem pequena e magrinha, e me mostrava todo o espaço”, lembra o empresário.
Amante da sanfona, Irmã Dulce sempre tocava o instrumento quando se encontrava com o empresário Paulo Magnus. Segundo ele, ouvir a beata, que será canonizada pelo Papa Francisco neste domingo (13), no Vaticano, tocando lhe trazia uma sensação indescritível, sobretudo, porque ele conhecia as condições de saúde da freira. “Quando conheci Irmã Dulce ela só tinha pleno funcionamento de 30% de um dos pulmões. Ela era muito frágil, mas ao mesmo tempo muito forte, capaz de nos trazer uma paz, uma sensação indescritível quando tocava”, fala Magnus.
Em um dos encontros com Irmã Dulce, Paulo testemunhou uma conversa por telefone entre a religiosa e o então presidente José Sarney. “Eu estava almoçando com ela, quando alguém chegou dizendo que havia um telefonema para ela. Ela me convidou à sua sala e atendeu, era Sarney”, relata Paulo Magnus. De acordo com ele, Irmã Dulce, com sua voz rouca, disse ao presidente que não tinha dinheiro para pagar a folha de funcionários daquele mês. O presidente decidiu, então ajudá-la. Foi a partir daí que o empresário percebeu que o ‘Anjo bom da Bahia’, como era conhecida a religiosa, precisava de mais ajuda para atender mais gente. Por isso, Paulo se uniu a outros empresários a fim de convencer a freira a credenciar seu hospital, que nasceu em um galinheiro, no Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social (Inamps).
“A irmã tinha aversão a qualquer tipo de financiamento governamental. Ela vivia de doações, mas diante da situação, me uni ao presidente do Banco Econômico, Ângelo Calmon de Sá, e ao empreiteiro Norberto Odebrecht, e conseguimos convencer Irmã Dulce de credenciar o hospital no Inamps”, conta Paulo, que relembra o apoio que recebeu do então presidente da Câmara dos Deputados, o pernambucano Inocêncio Oliveira em todo o processo de credenciamento, em 1989.
Para conseguir o apoio do Inamps, os empresários desenvolveram um projeto de sustentabilidade e governança para o Hospital Santo Antônio, atualmente chamado de Obras Sociais Irmã Dulce (Osid). Após a morte da religiosa, em 1992, as Osid passaram por um trabalho de profissionalização e atualmente contam com 21 núcleos que prestam assistência à população de baixa renda, se tornado um dos maiores complexos de saúde com atendimento 100% gratuito do Brasil, com mais de 3,5 milhões de atendimentos ambulatoriais por ano a usuários do Sistema Único de Saúde (SUS).
“A gente conseguiu credenciar 400 leitos, mas ali já abrigava o dobro dessa capacidade, por isso ela sempre continuava em busca de mais ajuda e ninguém conseguiu dizer ‘não’ aos seus pedidos”, diz o empresário. “Ela encantava as pessoas, ela dizia que queria algo de uma forma que era impossível negar algo àquela mulher”, completa.
O empresário, que participará da cerimônia de canonização da primeira santa do Brasil, no Vaticano, afirma que este momento é especial e emocionante, principalmente para os devotos da freira, que já a consideravam santa. “Ver a Irmã Dulce ser canonizada é, para mim, algo muito especial, muito emocionante. É o reconhecimento a essa serva de Deus, que, para nós que somos devotos dela, já é nossa santa há muito tempo”, fala.
Para ele, a sociedade precisa abraçar o legado de amor e caridade deixado pela santa que está eternizada em um quadro na sala do empresário. “Eu lembro de uma expressão dela: ‘como posso estar feliz se meus amigos não estão felizes?’. A gente tem que seguir o exemplo de amor e caridade que ela nos legou e cuidar de muita gente como Irmã Dulce”, pediu o empresário que, emocionado, resumiu em uma frase a principal característica de Santa Dulce dos Pobres. “Se alguém precisava de alguma coisa, não interessava o quê e onde, ela ia atrás de alguma forma de atender essa necessidade.”
O Arcebispo de Olinda e Recife, Dom Fernando Saburido, celebra às 19h30 deste domingo (13), uma missa em ação de graças pela canonização de Irmã Dulce, na Paróquia de Santa Isabel, no bairro de Casa Amarela, Zona Norte do Recife. Segundo o religioso, a celebração está sendo organizada pela comunidade do entorno da igreja, que é muito devota de Irmã Dulce, e contará com a apresentação de algumas crianças em homenagem à primeira santa brasileira.
“A Paróquia de Santa Isabel é em uma comunidade de muita periferia, simples, que tem uma veneração por ela muito grande e é a comunidade que está organizando a missa e algumas crianças vão se apresentar homenageando Irmã Dulce”, disse Dom Fernando, que afirmou ter ficado feliz com o convite dos fiéis para a celebração. “Me convidaram para essa missa e eu fiquei muito feliz, porque eu não poderei estar presente lá em Salvador, nem na canonização, lá em Roma, devido aos meus compromissos aqui, falou.
Para Dom Fernando, Irmã Dulce é um patrimônio religioso e espiritual para o Brasil e que sua canonização motiva a igreja a ter um olhar voltado aos pobres. “Irmã Dulce é um patrimônio religioso e espiritual para o país, que desde cedo teve uma sensibilidade para com os pobres muito bonita. Ela, com a sua canonização, motiva toda a igreja a ter um olhar mais voltado para os pobres, como tanto vem falando o Papa Francisco”, disse.
O Arcebispo também ressaltou não ter tido dúvidas de que a canonização de Irmã Dulce aconteceria. Segundo ele, todos reconheciam o valor da Santa Dulce dos Pobres. “Não conheço ninguém que fosse contrário ao processo de canonização de Irmã Dulce. Todo mundo era muito consciente do valor dessa religiosa, que era pequenininha, mas grande em tudo aquilo que acreditava e vivia.”