O dia 7 de fevereiro de 1988 estará eternamente no imaginário da torcida do Sport. Há três décadas (o 30º aniversário da conquista será na próxima quarta-feira), o Leão da Praça da Bandeira passou a rugir não apenas em Pernambuco, mas no Brasil. Contra o Guarani, numa Ilha do Retiro abarrotada de rubro-negros, o clube pernambucano levantou a taça da tão falada Copa Brasil de 87. Colocou a faixa no peito e mostrou quão arretado o nordestino é. Mas se engana que 87 acabou ali, na cabeçada de Marco Antônio para o fundo das redes da trave defendida por Sérgio Neri, aos 19 minutos do segundo tempo. Muito pelo contrário. Aquele campeonato começou em 1986 e, três décadas depois, ainda suscita discussões.
Para explicar o Brasileirão de 1987 é preciso entender o que aconteceu em 1986. Ali, a CBF tomou a decisão de profissionalizar a competição, até então extremamente bagunçada. Ficou decidido que 44 equipes disputariam o campeonato, classificando as 24 melhores para a Primeira Divisão de 1987. Mas, com o passar das fases e as viradas de mesa na Justiça, esse número foi deixado de lado.
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Para aumentar o caos, a CBF anunciou que não teria condições financeiras de organizar o Nacional de 87, provocando o surgimento do Clube dos 13, que seria, ali, responsável por pensar o Brasileirão. A nova organização era composta pelos principais times do Rio, São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, além do Bahia.
Inicialmente com 16 clubes, o Campeonato de 87 ignorou a tabela final do ano anterior. O vice-campeão Guarani, por exemplo, não foi incluído. Com o apoio comercial da Rede Globo e da Coca-Cola, os 13 clubes queriam disputar o Brasileirão (Copa União) apenas na companhia dos convidados Coritiba, Santa Cruz e Goiás. Foi aí que a CBF voltou atrás, duas semanas depois de afirmar que não teria condições de organizar o campeonato, graças à pressão de diversos clubes e Federações. Um dos líderes dessa revolta foi Fred Oliveira, da Federação Pernambucana. O outro foi Homero Lacerda, então presidente do Sport.
Após muito impasse e muita luta dos pernambucanos, no dia 8 de setembro de 1987, três dias antes da primeira rodada, foi feito o regulamento prevendo o cruzamento entre os melhores dos Módulos Verde e Amarelo, como conta o livro "1987 - de Fato, de Direito e de Cabeça". A reunião, realizada na sede da CBF, contou com a presença de representantes dos dois módulos. O verde foi representado por Eurico Miranda, que assinou pelo Clube dos 13. Foram 32 equipes na disputa do Nacional, sendo 16 em cada módulo, com o cruzamento final previsto no regulamento.
O Sport teve uma campanha avassaladora no Módulo Amarelo. Perdeu apenas um dos 14 jogos que fez na 1ª fase. O único revés foi para o Bangu, mesmo adversário da semifinal. O próprio Guarani foi presa fácil para os leoninos, perdendo por 2x0 na Ilha do Retiro. Equipes como Náutico, Ceará, Atlético-GO e Portuguesa também atravessaram o caminho rubro-negro. Nenhum conseguiu derrotar o time comandando por Emerson Leão à beira do gramado e por Ribamar, Robertinho e Nando dentro dele.
Chegada a final do módulo, mais um fato inusitado no regulamento. Não havia critérios de desempate. Ou seja, se cada time vencesse um dos dois jogos (como aconteceu), a decisão seria nos pênaltis. O Bugre venceu na ida por 2x0. O Leão venceu na volta por 3x0. Foram 24 cobranças ao todo. Aí surgiram as figuras de Homero Lacerda e Leonel Almeida Martins (presidente bugrino), que, em comum acordo, resolveram encerrar a disputa ali, já que o título pouco importava para o quadrangular. Depois, os pernambucanos acabaram ficando com a taça graças a melhor campanha na 1ª fase.
O quadrangular, contra Flamengo, Internacional e Guarani, seria disputado apenas em janeiro de 1988. Por isso, o elenco rubro-negro recebeu férias. O técnico Emerson Leão, que acabava seu contrato em dezembro, deixou o clube. Jair Picerni chegou.
No dia do primeiro jogo, em 24 de janeiro, contra o Internacional, na Ilha do Retiro, o Colorado não apareceu, caracterizando W.O. Mesma situação do Guarani, que não viu o Flamengo aparecer em Campinas. O mesmo cenário ocorreu na segunda rodada, com o Urubu não viajando ao Recife para enfrentar os pernambucanos. A primeira partida do quadrangular foi disputada apenas na terceira rodada. Guarani e Sport ficaram no 1x1. Os dois jogos seguintes, com mandos de gaúchos e cariocas, foram cancelados.
A grande decisão foi disputada numa Ilha do Retiro lotada. Foi um jogo com os nervos à flor da pele. Melhor para o rubro-negro, que viu o zagueiro Marco Antônio subir mais alto que todo mundo e estufar as redes. O 1x0 inflamou a Ilha, que pulsou como nunca. Ao apito final, a festa foi levada pelos torcedores ao campo, já que milhares de pessoas invadiram o gramado.
Acabava ali (pelo menos por ora) o Campeonato Brasileiro que traduziu a bagunça do futebol nacional à época, mas que, ao mesmo tempo, reafirmou a força do nordestino. A força do rubro-negro valente, que lutou contra o Brasil para poder conquistá-lo.