O Brasil prestou homenagens, nesta quinta-feira (14), com flores, missas e atos públicos, à vereadora Marielle Franco, assassinada há um ano, cuja figura já inspira defensores dos direitos humanos no mundo inteiro.
Manifestantes no Rio de Janeiro, Brasília e outras cidades exigiram que os mandantes do crime sejam identificados, sem se dar por satisfeitos com a detenção, na terça-feira, do suposto executor e do motorista do carro do qual foram feitos os disparos que em 14 de março de 2018 abateram Franco e seu motorista, Anderson Gomes, em pleno centro do Rio.
"Infelizmente hoje estamos aqui lembrando a morte de uma companheira negra, lésbica, da periferia, ativista dos direitos humanos. Não temos nada para celebrar, devemos reivindicar para conseguir nos manter vivas", disse à AFP Rosângela Castro, de 62 anos, uma das milhares de pessoas que se reuniram na Cinelândia, em frente à Câmara de Vereadores, no centro do Rio.
A escadaria da Assembleia foi enfeitada com girassóis e frases comemorativas, numa das várias homenagens realizadas desde o amanhecer em homenagem à vereadora.
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"Marielle se tornou um símbolo mundial, era uma mulher com muita força, que queria mudar este país (...) O Brasil precisa saber, o mundo precisa saber [quem foi o mandante do seu assassinato]", afirmou sua mãe, Marinete Silva, ao final de uma missa celebrada também no centro da cidade.
A vereadora, do Partido Socialismo e Liberdade (Psol), era uma firme defensora dos direitos dos jovens negros, das mulheres, da comunidade LGBT, e crítica com a violência policial nas favelas do Rio. Ela tinha 38 anos.
Em Brasília, legisladores do Psol prestaram homenagem a ela no Congresso, e um grupo de mulheres "rebatizou" uma das pontes da capital colocando um adesivo gigante escrito "Ponte Marielle Franco" no lugar do nome do militar Costa e Silva, segundo presidente do regime militar (1964-1985).
Após seu assassinato, Marielle passou de ser uma figura conhecida apenas no âmbito da política local a um símbolo mundial de resistência.
Os grafites com seu rosto se multiplicaram, seu nome aparece em todas as manifestações de rua vinculadas à esquerda e sua figura foi homenageada no desfile da escola de samba Mangueira, campeã do carnaval do Rio em 2019.
No mesmo ano em que 55% dos eleitores escolheram Jair Bolsonaro para a presidência do Brasil, várias mulheres negras, algumas delas assessoras próximas a Franco, conquistaram cargos eletivos, como as deputadas regionais do Rio de Janeiro Mônica Francisco e Dani Monteiro e a deputada federal Taliria Petrone.
"Marielle não vive mais porque o corpo dela foi interrompido. Nenhuma de nós é Marielle. Mas as pautas dela (...) estão mais vivas que nunca. Foi despertado um senso de urgência de continuar com essas lutas", afirmou Petrone, de 33 anos.
As autoridades prenderam na terça-feira dois ex-policiais suspeitos de emboscá-la e assassiná-la quando ela estava saindo de um evento sobre empoderamento de mulheres negras.
A Polícia Civil, encarregada da investigação, afirma não ter determinado ainda se Ronnie Lessa, autor dos disparos, e seu cúmplice e motorista Élcio Vieira de Queiroz, agiram por conta própria ou cumprindo uma ordem. Mas os investigadores consideram "indiscutível" que o assassinato tem relação com a atividade política de Franco em favor das minorias.
Seus correligionários asseguram que Marielle não recebia ameaças de morte.
Esclarecer se existe um mandante será a prioridade da segunda parte da investigação, que também indagará se os detidos têm vínculos com milícias.
A demora para apontar responsáveis fez crescer as suspeitas de que existem grupos que tentam obstaculizar as investigações.
Isto motivou uma "investigação da investigação" pela Polícia Federal, que ainda está em curso e sobre a qual não se conhece detalhes.