Aumenta pressão na Venezuela pela saída de Maduro

Milhares de pessoas foram às ruas em várias cidades da Venezuela nessa quarta-feira (26) para exigir que seja feito um referendo revogatório contra o presidente do país
AFP
Publicado em 27/10/2016 às 6:36
Milhares de pessoas foram às ruas em várias cidades da Venezuela nessa quarta-feira (26) para exigir que seja feito um referendo revogatório contra o presidente do país Foto: Foto: STR / AFP


A oposição venezuelana convocou uma greve geral e uma marcha até o Palácio presidencial de Miraflores, após as grandes manifestações desta quarta-feira contra o governo do presidente Nicolás Maduro, que deixaram um policial morto e mais de 20 civis feridos.

Ao final da marcha de centenas de milhares de pessoas, que ativistas estimaram em 1,2 milhão de manifestantes, os principais dirigentes da oposição anunciaram sua ofensiva para conseguir destituir Maduro, diante da suspensão do referendo revogatório.

"No [dia] 3 de novembro (...) vamos notificar Nicolás Maduro que foi declarado pelo povo venezuelano em abandono do cargo. Vamos fazê-lo em manifestação pacífica que vai chegar ao palácio de Miraflores", afirmou nesta quarta-feira, da tribuna, o presidente da Assembleia Nacional, de maioria opositora, Henry Ramos Allup.

"Iniciamos o processo para declarar a responsabilidade política deste vagabundo que temos no Miraflores", disse Ramos Allup.

A coalizão opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD) também convocou uma greve geral de 12 horas para a próxima sexta-feira (28).

O número dois do governo, o deputado Diosdado Cabello, respondeu afirmando que as forças armadas e os trabalhadores ocuparão as empresas que aderirem à greve geral.

"Conversei com o presidente, empresa que parar, será empresa tomada pelos trabalhadores e pelas forças armadas". "Não há mais volta, vamos ver como ficam as coisas (...). Aqui não vamos permitir tumulto e você decidirá, senhor empresário, se segue com estes loucos ou trabalha com o governo por esta pátria".

A Assembleia Nacional - dominada pela oposição - resolveu esta semana iniciar um procedimento para acusar Maduro de "abandono do cargo", algo previsto na Constituição, quando o presidente deixa de exercer suas atribuições, e convocou o chefe de Estado a participar de uma sessão na próxima terça-feira.

Mais cedo nesta quarta-feira, Maduro instalou o Conselho de Defesa da Nação para avaliar o "golpe parlamentar" no país.

Em seguida, dirigiu-se a milhares de seus seguidores, que se concentraram nos arredores do Palácio de Miraflores para apoiá-lo.

"A Assembleia Nacional infelizmente tomou o caminho do desacato à Constituição", disse Maduro aos manifestantes, criticando a ausência de Ramos Allup em uma reunião do Conselho de Defesa.

"Entramos em outra fase"

"Roubaram de nós o direito de votar e eu digo: se roubam nosso direito de votar, entramos em outra fase na Venezuela", afirmou o líder opositor, Henrique Capriles, durante a marcha.

"Hoje estamos dando um prazo ao governo. Eu digo ao covarde que está em Miraflores (...) que em 3 de novembro todo o povo venezuelano virá a Caracas porque vamos pro 'Miraflores'", advertiu Capriles.

Vestidos em sua maioria com camisas brancas e bonés com a bandeira da Venezuela, vários manifestantes saíram de sete pontos de Caracas e se encontraram na autoestrada Francisco Fajardo (leste), tomada pela multidão. Os participantes carregavam cartazes escritos à mão. "Não vamos nos render. Revogatório já".

Na região de Caracas, um policial morreu e outros dois agentes ficaram feridos quando tentavam liberar uma estrada bloqueada por manifestantes, informou o ministro do Interior e Justiça, general Néstor Reverol.

"Lamentavelmente, temos um oficial da polícia do estado de Miranda morto, José Alejandro Molina Ramírez, e há dois oficiais feridos, um por arma de fogo e outro por objeto contundente".

O incidente ocorreu quando os agentes desbloqueavam uma estrada entre Caracas e San Antonio de los Altos, cidade satélite da capital, e foram atacados por manifestantes.

Também foram registrados confrontos em cidades de alguns estados, como Táchira, Mérida e Sucre.

Segundo a ONG de defesa dos direitos humanos Foro Penal, mais de 80 pessoas foram detidas e 20 ficaram feridas durante os protestos desta quarta-feira.

Em um post no Twitter, a ONG reportou que as detenções ocorreram em sete dos 24 estados do país, a maioria em Nueva Esparta e Sucre, enquanto entre os 20 feridos, três foram baleados em Maracaibo, capital do estado de Zulia (noroeste).

"Boletim de detidos: Guárico: 5. Nueva Esparta: 32. Táchira: 7. Barinas: 4. Miranda: 6. Sucre: 21. Lara: 5", informou o Foro Penal.

Segundo a ONG, outras 60 pessoas foram detidas em Aragua, mas libertadas logo em seguida.

A chamada "Tomada da Venezuela" ocorre no que deveria ser o primeiro de três dias para a coleta de quatro milhões de assinaturas (20% do colégio eleitoral), último passo antes da convocação para referendo.

Ao cumprir este requisito, a oposição queria evidenciar a rejeição majoritária ao governo de Maduro, ao qual seis em cada dez venezuelanos está disposto a revogar, segundo a empresa de pesquisas Datanálisis.

Mas o processo foi suspenso na semana passada por tribunais penais regionais, que acolheram denúncias de fraude apresentadas pelos governistas em uma primeira etapa da coleta de assinaturas.

Em dezembro de 2015, a oposição venceu amplamente nas eleições legislativas e pela primeira vez em 17 anos de chavismo conquistou a maioria parlamentar.

Diálogo

Governo e oposição, que se acusam mutuamente de "golpismo", exploram ao mesmo tempo a possibilidade de um diálogo com a mediação do Vaticano, em meio a uma aguda crise econômica que se traduz em escassez de alimentos e remédios e uma inflação calculada pelo FMI em 475% para este ano.

O governo culpa pela crise econômica "empresários de direita" que buscam desestabilizá-lo, mas a oposição responsabiliza o modelo socialista e sustenta que o revogatório era a última "válvula de escape" de uma população cansada de fazer longas filas para conseguir os poucos produtos a preços subsidiados.

Cogitado para domingo em Ilha Margarita (norte), o início do diálogo foi desmentido em um primeiro momento pelos mais importantes dirigentes opositores, mas posteriormente eles disseram estar dispostos a participar da mesa se as negociações forem realizadas em Caracas.

"Temos a possibilidade de ter um árbitro com alcance planetário, como é o Vaticano. Sugerimos que o encontro seja em Caracas, teremos que entrar em acordo", afirmou Torrealba.

Mas Maduro insistiu nesta quarta-feira em que "a mesa de diálogo nacional está convocada e eu vou assistir porque eu quero o diálogo pela paz do país".

"Que Maduro nos mande fotos da praia, porque no domingo não vamos para [a ilha] Margarita", afirmou Capriles.

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