Fogueira, comida de milho, bandeirinhas e um colorido que é a cara de Pernambuco. A festa mais tradicional do Nordeste, que em muitos municípios é planejada o ano inteiro, já começou a movimentar o Estado desde o início do mês. A expectativa da Secretaria de Turismo e Lazer é que, neste ano, a festa consiga superar os 650 mil turistas que vieram a Pernambuco no ano passado. De acordo com a Empresa de Turismo de Pernambuco (Empetur), em 2018, os municípios pernambucanos foram os principais destinos dos turistas nesta época do ano, com um tíquete médio diário de R$ 290,72. Mas garantir a festa e, ao mesmo tempo, manter equilibradas as contas municipais têm sido um desafio para os gestores.
Neste ano, o Ministério Público de Contas (MPCO) lançou uma recomendação coletiva para todos os 184 municípios de Pernambuco. O motivo? Evitar despesas com as festas, principalmente com a realização de shows, caso a folha de pessoal esteja em atraso. Segundo a Associação Municipalista de Pernambuco (Amupe), não há um levantamento sobre quantas prefeituras estão com os salários dos servidores atrasados.
De acordo com a procuradora-geral do MPCO, Germana Laureano, como a maioria das cidades só publica os extratos de contratações muito perto da realização de seus eventos, o órgão fica impossibilitado de notificá-las com tanta antecedência.
Segundo ela, uma das formas encontradas pelas prefeituras para realizar o evento, sem que comprometa a sua receita, é buscando patrocinadores. “Existe um argumento de que, quando se realiza uma festa, existe aumento na receita do município. Você pode conseguir esse efeito sem estar movimentando seus próprios recursos. Quando seus recursos são escassos, a ponto de você não conseguir honrar com suas obrigações legais – como o pagamento do funcionalismo –, você obtém junto a outros entes, como a União, o Estado ou a própria iniciativa privada. É a tarefa de casa do gestor”, alerta.
A origem das festas juninas remonta ao período da colonização portuguesa, segundo explica o pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco César Mendonça. “Aqui em Pernambuco foi ponto forte. Se juntou com a cultura negra e a cultura indígena, que juntas dão o que nós temos hoje no São João. Também tem a questão da celebração da colheita de milho, em junho, e, por isso, tem essa participação maior da população do interior”, afirma.
Em 2019, 47 municípios de Pernambuco receberão aporte do governo estadual, por meio de investimentos da Secretaria de Cultura/Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco, para realizar as suas festividades. De acordo com a secretaria, com um orçamento de R$ 3 milhões, “esse investimento visa o pagamento de cachês de artistas e grupos que passam a integrar a grade de atrações artísticas em cada município. Cada cidade recebe de R$ 30 mil a R$ 100 mil e a previsão é que cerca de 250 artistas e grupos culturais sejam contratados”.
É assim, com recursos público e privado, que Caruaru é conhecida como a Capital do Forró. De acordo com a prefeita Raquel Lyra (PSDB), o investimento deste ano está na casa dos R$ 14 milhões. Desse valor, a prefeitura arca com R$ 3,5 milhões e os outros R$ 10,5 milhões vêm da captação de recursos com os 27 patrocinadores. O Estado ainda entra com uma fatia de R$ 400 mil.
Em Caruaru, a festa tem início antes de qualquer outra: vai de 18 de maio, dia do aniversário da cidade, até 29 de junho. “Tem sido impactante para a economia local. O São João é mais importante que o final de ano. São cerca de seis a sete mil empregos diretos e indiretos gerados”, diz Raquel. A perspectiva é de haja movimentação financeira de R$ 200 milhões.
Arcoverde também possui investimento milionário. Para este ano, serão R$ 2,5 milhões. “Fizemos um esforço enorme para poder montar uma grade a altura da nossa população e também dos nossos turistas”, comemora Madalena Britto (PSB), prefeita de Arcoverde.
Mas na contramão dos grandes investimentos, há cidades que não possuem receita para arcar com as festividades. É o caso de Moreno. “Nós não conseguimos ter absolutamente nenhuma contribuição do governo para as festas tradicionais. Mas a gente não pode ficar de lamentações nas esquinas, a gente busca com a energia que nós temos, com os recursos, que são poucos, fazer do tamanho que a gente pode”, lamenta o prefeito Vavá Rufino (PTB), lembrando que Moreno já foi “um dos principais polos de São João da Região Metropolitana”.
Paudalho, Carpina e Limoeiro são cidades vizinhas da Zona da Mata Norte, que valorizam a festa de São João cada uma à sua forma. Seja com o financiamento predominante de empresas privadas, com ajuda do poder estadual ou com recursos exclusivos do município, o que vale é garantir a festa. Comerciantes, ambulantes, hoteleiros, artistas locais e, claro, os festeiros, agradecem o esforço. Em Limoeiro, o São João foi aos poucos se transformando na festa mais importante, ao lado da festa de São Sebastião, padroeiro da cidade. No município, tem festa para todos os gostos, como na Rua da Alegria, com os festejos tradicionais; e no Parque de Exposições, polo onde são realizados os maiores shows.
No Parque de Exposições, a estimativa de público é de 450 mil pessoas, entre 22 e 28 de junho. O evento é patrocinado pela iniciativa privada, que investe em torno de R$ 2,3 milhões. Também há uma preocupação com o resgate cultural através da festa na Rua da Alegria, bancada principalmente com recursos do governo do Estado. Segundo a Empresa de Turismo de Pernambuco (Empetur), são investidos R$ 350 mil. Na rua há forró pé-de-serra, ciranda, coco, quadrilhas, casamentos “matutos” e o clássico pau de sebo.
Nesses dois polos da festa junina, a prefeitura de Limoeiro desembolsa cerca de R$ 650 mil. De acordo com o prefeito Joãozinho Ferreira (PSB), neste ano, o município procurou atrair mais investimentos privados para aliviar os cofres municipais. “Neste ano, a gente vai conseguir fazer [O SÃO JOÃO]gastando três vezes menos do que a gente conseguiu investir no ano passado”, explica.
Toda essa movimentação agrada comerciantes e hoteleiros. Segundo Gérson Buregio, um dos donos da loja de utilidades Casa Primor, a expectativa em 2019 é de “crescimento de 10% em relação ao ano passado”. “O São João é uma data muito importante para a gente, porque temos na loja toda a parte de ornamentações”, afirma.
“O São João da cidade sempre movimenta a economia não só da rede hoteleira, mas também do comércio. Todos os anos lotamos o hotel”, conta Márcia Estela de Lima, uma das sócias do Hotel das Oliveiras.
Em Carpina, algumas ruas já estão decoradas e barracas já vendem as tradicionais comidas de milho e os fogos juninos. O palco principal, com capacidade para receber 30 mil pessoas, fica no Parque de Eventos Jota Cândido, onde haverá shows entre os dias 21 e 29 de junho. Há também polos descentralizados, como o de pé-de-serra, no centro da cidade. A ambulante Taciana Karla trabalha no pátio há 20 anos e começa a comprar a mercadoria um mês antes. “É um investimento muito grande para a gente trabalhar, ganhar o trocado da gente. Se não tivesse o São João de Carpina, como é que a gente ia trabalhar?”, questiona.
Segundo o secretário de Cultura, Turismo e Desporto do município, Samuel Higino, apesar do prazo apertado, a busca por apoio da iniciativa privada ainda continua. “A dificuldade financeira está em todo o País, não só em Carpina. Mas nosso gestor se sacrificou, está economizando uma coisa aqui, outra ali, não vamos deixar de fazer o que já fizemos”, garante.
Neste ano, a novidade é o projeto Cultura na Rua. “A gente está incentivando os moradores a enfeitar suas ruas. Vamos premiar as três primeiras colocadas [consideradas mais bonitas] com uma festividade”, diz Higino.
A manicure Edna Costa reuniu os vizinhos na rua Gersina Carneiro, no bairro do Cajá, para mobilizá-los com a decoração. O resultado foi uma rua decorada do início ao fim, com tecidos de chita, bandeirolas e cada casa com um colorido diferente. “Vamos dar o melhor de nós. Foram duas semanas fazendo o que a gente mais gosta. É muito bom o São João de Carpina”, garante Edna.
Em Paudalho, apesar do Carnaval ser considerado a festa mais importante do ano, o São João do município não fica para trás. A festa, realizada no Parque de Eventos Beira-Rio, no centro da cidade, dura oito dias, dos quais três deles são reservados para a apresentação das tradicionais quadrilhas juninas. É de Paudalho, inclusive, a quadrilha mais antiga de Pernambuco: a Rosa Linda, fundada em 1976. “Na brincadeira, a gente inventou uma quadrilha. Mesmo com as maiores dificuldades, a gente continua colocando a quadrilha na rua”, diz orgulhosa a fundadora do grupo, Elvira Gusmão.
Não há investimento privado ou do Estado em Paudalho. A prefeitura chega a desembolsar R$ 480 mil. Segundo o secretário de Cultura, Jobson Oliveira, há pessoas trabalhando em cerca de 120 barracas vendendo comidas e bebidas. “Por isso, sabemos que esse investimento terá retorno, através desses munícipes que comercializam e ganham o seu dinheiro durante a festa”, afirma.