Toda a sessão legislativa que levou ao impedimento do prefeito contou com a presença maciça da população de Camaragibe. Às 9h, horário marcado para o início do debate, várias pessoas já ocupavam o plenário da Câmara. Por volta das 10h30, o espaço já estava lotado e muitos dos que acompanharam a discussão portavam cartazes e gritavam palavras de ordem contra o prefeito e vereadores que se mostravam contra o processo em votação. Focos de confusão foram registrados e um dos presentes precisou ser retirado do local pela Polícia Militar.
“Camaragibe entra para a história por afastar um prefeito diante de todos esses desmandos. Esse Parlamento exerceu o seu papel, o que era o desejo da população. (...) Espero que agora a prefeita interina também passe a exercer seu papel, e nós teremos que continuar exercendo a função de fiscalizadores”, declarou o vereador Délio Júnior (PSD), relator do processo de impeachment, sobre a prefeita em exercício Nadegi Queiroz (DC). A Secretaria de Imprensa de Camaragibe foi procurada para comentar o afastamento de Meira, mas informou que a administradora não se pronunciaria sobre o caso.
Nadegi foi eleita vice-prefeita na chapa que elegeu Demóstenes Meira prefeito, nas eleições de 2016. Poucos dias após a posse, em janeiro de 2017, os dois romperam politicamente. Ela assumiu a Prefeitura de Camaragibe após a prisão de Meira, em junho deste ano.
Apesar do clima geral de satisfação, não foi a totalidade dos presentes que sentiu-se feliz com o resultado da votação. Membro do Fórum de Mulheres de Camaragibe, Ysolda Coutinho, de 45 anos, disse acreditar que a decisão dos vereadores não passou de encenação. “Depois que ouvi a defesa do advogado de Meira, fiquei com a sensação de que isso tudo não passou de um circo. Os próprios vereadores armaram para que isso não servisse de nada. Eles queriam que o povo achasse que tirou o prefeito, que eles fizeram a nossa vontade, mas, na realidade, judicialmente isso não vale de nada”, pontuou.
Ysolda refere-se aos argumentos dos defensores de Demóstenes Meira, que afirmaram que o processo aberto contra o petebista possui vícios que podem acabar por anulá-lo na Justiça. “O decreto que rege o impeachment municipal dá um prazo de 90 dias para que ele transcorra. Se esse prazo for ultrapassado e o processo não for concluído, ele obrigatoriamente tem que ser arquivado. Hoje (ontem) faz 91 dias desde a intimação do denunciado, que foi por edital”, comentou a advogada Adriana Albuquerque Lins.
“O regimento interno diz também que o presidente (da Câmara) não pode fazer parte da comissão especial e ele foi relator desde o início, isso é uma nulidade. Se ele fez parte dessa comissão, todos os atos deles são nulos. Você não pode dar andamento a um processo em que os atos da comissão são nulos. Embora esta seja uma casa legislativa, eles não estão cumprindo a lei”, concluiu Adriana. Toninho Oliveira (PP), presidente da Câmara de Vereadores de Camaragibe, foi relator do processo de impeachment de Meira por um período, mas renunciou ao posto, que foi repassado, através de sorteio, para o vereador Délio Júnior.
Outra irregularidade apontada pelos advogados do prefeito trata dos crimes supostamente cometidos pelo gestor preso. De acordo com a legislação em vigor, membros do Executivo só podem sofrer impeachment se cometerem infrações político-administrativas, os chamados crimes de responsabilidade. O problema é que, da lista votada pela Câmara ontem, apenas a quebra de decoro se enquadraria como crime político, os demais seriam delitos comuns, que não poderiam ser julgados pelo Parlamento. Entre os exemplos, as investigações sobre assédio sexual e moral envolvendo servidoras da prefeitura contra o gestor afastado.
Após o término da votação, um Decreto Legislativo com o resultado da deliberação dos parlamentares foi editado na Câmara. O documento deve ser encaminhado à Justiça Eleitoral, a quem cabe a homologação da cassação. A defesa do petebista disse aguardar a ata da sessão que decidiu pelo afastamento do prefeito para entrar com um mandado de segurança e tentar reverter o quadro.
Em 13 de agosto deste ano, a Câmara aprovou a abertura do processo de impeachment contra Meira que é votado nesta segunda. O processo se baseia em uma denúncia protocolada na Câmara de Vereadores no dia 25 de junho pelo advogado Gladstone Freitas Cordeiro. A denúncia cita as investigações da Operação Harpalo, que apura suspeitas de fraudes na licitação para a reforma do prédio da prefeitura, além de corrupção e lavagem de dinheiro. O denunciante também aponta suposta quebra de decoro de Meira e investigações sobre assédio sexual e moral envolvendo servidoras da prefeitura contra o gestor afastado, preso desde o dia 20 de junho.