Trânsito, transportes e mobilidade urbana, com Roberta Soares

Mobilidade

Por Roberta Soares e equipe
TRANSPORTE PÚBLICO

Pandemia, transporte público e veto

Ainda sobre o veto inesperado do presidente da República aos R$ 4 bilhões de ajuda ao transporte público brasileiro

Cadastrado por

Roberta Soares

Publicado em 15/01/2021 às 19:44 | Atualizado em 15/01/2021 às 19:52
Decisão de manter uso obrigatório nos ônibus, mas liberar nos terminais não vai ter eficiência na prática - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

* Por Otávio Vieira da Cunha Filho

Em mais de 30 anos de altos e baixos, o setor de transporte público - em especial o de ônibus coletivo urbano - jamais vislumbrou, nem no pior dos cenários, uma situação tão caótica como a atual. Quando se acreditava que o setor seguiria em frente, novamente engata-se a marcha à ré.

O recente veto presidencial ao auxílio emergencial de R$ 4 bilhões teve um impacto tão devastador quanto a enorme queda de passageiros que ameaça a sobrevivência do serviço de ônibus no país, da forma como funciona hoje. Definitivamente, jogou uma pá de cal sobre expectativas e planos de reabilitação desse serviço, reconhecido na Constituição Federal como um direito social, tal qual saúde, educação e segurança.
Atividade indutora da economia, que vive o pior momento da história, o transporte público vem levando há anos a culpa por não atender às expectativas da sociedade por eficiência e qualidade. Mas isso pode mudar, a partir do momento em que cada ente assuma, de fato, suas obrigações e responsabilidades na gestão desse serviço.



O setor de transporte público sempre amargou a fama de vilão, basicamente por estar condicionado às obrigações definidas nos contratos de concessão. Cabe ao contratante, o poder público local, dizer qual o valor da tarifa a ser aplicada, de que forma o serviço deve funcionar e qual o nível da qualidade ofertada pelas contratadas, as empresas operadoras. É do poder público a responsabilidade da gestão, não do empresário.

Perspectiva de ajuda para o transporte público - ARTES JC


Enquanto se aguarda que o Governo Federal reveja a decisão de vetar o socorro financeiro ao transporte público - que não se enquadra na condição de favor, já que as empresas têm o compromisso de manter a oferta do serviço mesmo operando com prejuízo - é importante que se entenda a gravidade da situação.
O transporte coletivo é, reconhecidamente, um dos segmentos mais afetados pelo impacto da pandemia. A atividade, que responde por 405 mil empregos diretos e 1,2 milhão indiretos, já perdeu 27.697 postos de trabalho somente no primeiro semestre deste ano.

Otávio Vieira da Cunha, presidente da NTU - NTU/DIVULGAÇÃO


O setor, que já vinha sofrendo com uma queda de quase 30% de passageiros nos últimos anos, tem agora que manter uma oferta média de serviço superior ao número de passageiros transportados para reduzir aglomerações e atender às necessárias medidas sanitárias de combate à proliferação do coronavírus, o que agrava ainda mais o enorme desequilíbrio econômico-financeiro dos operadores.
Essa equação não fecha. Se nada for feito, na virada do ano teremos inúmeras empresas sem fôlego para operar, no momento em que o país mais precisa assegurar empregos e adotar medidas para a retomada da economia.

Para os que ainda acreditam que os fatos citados não passam de “chororô” de empresário, recomenda-se que procurem conhecer as políticas robustas de proteção do transporte público adotadas por outros países durante a pandemia, países que enfrentaram os mesmos desafios, mas que, diferentemente do nosso, escolheram o caminho do fortalecimento de seus sistemas de transporte coletivo.  

Não se trata de ameaça, muito menos de espalhar o medo sobre o risco de interrupção ou mesmo do fim da oferta do serviço de ônibus no Brasil com esse quadro de “morte lenta”, mas sim de imputar a quem de direito as responsabilidades envolvidas.

As regras para a ajuda ao transporte público - ARTES JC


Ainda dá tempo de virar esse jogo e fazer de 2021 o ano histórico da grande mudança do transporte público no Brasil, com uma profunda reforma em seu marco legal. É o que se espera daqueles que têm o poder de decisão. A sociedade merece e as empresas operadoras têm capacidade de oferecer um transporte público eficiente e de qualidade. Basta que dêem as condições para isso.

Otávio Vieira da Cunha Filho – presidente-executivo da NTU – Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos.

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