A mobilidade urbana não tem o que comemorar em 2022. Ao contrário, só lamentar. Nacional e localmente. O setor nunca teve um ano tão apático, sem grandes projetos e, o que é pior, sem grandes perspectivas.
Infelizmente.
Em nível nacional, ainda há esperança para o transporte público diante da força que a Tarifa Zero (ou Passe Livre) adquiriu no País devido às Eleições 2022. Ao menos para ser adotada em algumas datas especiais e situações. Não deverá ir muito além disso, apesar dos esforços de alguns políticos e da sociedade civil organizada.
A perspectiva de um Marco Legal para o Transporte Público foi outro aspecto positivo, mas que não avançou como deveria. A infraestrutura do País e a mobilidade ativa também não tiveram a atenção devida nacionalmente. O governo federal estava muito ocupado com as sequelas econômicas e financeiras da pandemia de covid-19 e a tentativa de reeleição do presidente Jair Bolsonaro.
Por tudo isso, 2022 já vai tarde. Que passe. E que em 2023 a mobilidade urbana, em suas mais variadas faces, tenha mais vez e voz entre as gestões públicas do Brasil.
O movimento a favor da Tarifa Zero ou Passe Livre, que explodiu em 2013 e marcou o início da fritura pública da então presidente Dilma Rousseff (PT), ganhou nova força no fim de 2022 graças à exploração política. Mesmo sendo usado estrategicamente pelos apoiadores do presidente eleito Lula (PT), o transporte público ganhou.
PASSE LIVRE: equipe de LULA promete debater gratuidade no transporte público em 2023
O argumento de que o Passe Livre estimularia o voto do cidadão foi um sucesso e reforçou o caráter de inclusão social da medida, indo além da estratégia política. A adesão das cidades foi grande: 378 cidades ofereceram transporte público gratuito no segundo turno das Eleições 2022, beneficiando quase 100 milhões de pessoas.
Em Pernambuco, a gratuidade nos ônibus da Região Metropolitana do Recife provocou um aumento da demanda de passageiros de 115% em relação aos domingos comuns, e de 59% na comparação com o primeiro turno, quando o Estado não ofereceu o benefício.
Os constantes aumentos dos combustíveis que o Brasil enfrentou em 2022 - subiu, em média, 40% - complicaram ainda mais a situação dos aplicativos de transporte individual de passageiros, como Uber, 99 e Indrive.
Depois de sofrer com a queda do movimento em aproximadamente 80% devido aos lockdowns do auge da pandemia, as plataformas tiveram que lidar com a fuga dos motoristas parceiros devido ao aumento da gasolina e, consequentemente, com uma onde de cancelamento de corridas.
Os motoristas de Uber e 99 começaram a agir como agiam os taxistas - escolhendo viagens. Sem falar na ampliação do tempo de espera por um veículo, deixando a marca da agilidade dos apps de lado.
Além disso, em 2022 também ganhou força a discussão sobre a criação de vínculos trabalhistas entre as plataformas e os motoristas parceiros. Com previsão, inclusive, de avançar em 2023, como já sinalizado pelo novo presidente Lula.
Um Projeto de Lei (PL 1471/2022) tramita na Câmara dos Deputados e propõe a criação de uma espécie de salário mínimo para os motoristas. A quantia deveria ser calculada considerando a média de alguns custos que os motoristas têm, diários e mensais, para operar o serviço.
Com a crise econômica potencializada pela pandemia de covid-19, as plataformas de transporte individual por aplicativo agiram e começaram a diversificar os serviços oferecidos. E apostaram na motocicleta para fazer o transporte privado de passageiros, mesmo ele sendo proibido em muitas cidades - como no Recife.
Uber e 99 Moto: os perigos do serviço de aplicativo que está crescendo no País
E mesmo sendo as motos responsáveis por 50% das vítimas do trânsito brasileiro. Assim, 2022 foi o ano da consolidação de serviços como Uber e 99 Moto. Principalmente no Nordeste Norte do País, com destaque para as cidades de interior ou metropolitanas.
O ano de 2022 também foi marcado por bloqueios antidemocráticos nas rodovias federais do País, realizados por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro contrários ao resultado das eleições para Presidência da República. Além de irritar muita gente, criar situações perigosas e gerar altas multas de trânsito e judiciais, os bloqueios também provocaram a exoneração do então diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Silvinei Vasques, investigado por improbidade administrativa e uso indevido do cargo para pedir votos para a reeleição de Bolsonaro.
BLOQUEIOS NAS ESTRADAS: confira a lista de condutores multados pelo ministro Alexandre de Moraes
Vasques também responde pela operação da PRF nas estradas no segundo turno das eleições, que teria interferido no deslocamento de eleitores, principalmente na região Nordeste, pólo eleitoral do presidente eleito Lula (PT). A revolta de bolsonaristas também se voltou contra o transporte público e pelo menos cinco ônibus foram totalmente incendiados em Brasília.
VANDALISMO EM BRASÍLIA: quem PAGA a CONTA do estrago para o TRANSPORTE PÚBLICO?
Depois da visibilidade que o Passe Livre ganhou no País em 2022, talvez essa seja a melhor notícia para o transporte público do ano. Os ônibus, metrôs e trens, que respondem por 80% dos deslocamentos da população nos centros urbanos, ganharam, pela primeira vez, um auxílio financeiro.
O Auxílio Transporte Público foi uma compensação criada pelo governo federal - também com fins eleitoreiros, como aconteceu com a Tarifa Zero nas Eleições 2022 - para cobrir a gratuidade dos idosos nos sistemas regulares de transporte público coletivo urbano, semiurbano ou metropolitano.
Críticas à parte, os R$ 2,5 bilhões distribuídos com dezenove estados, 535 municípios brasileiros e o Distrito Federal foram simbólicos. Pernambuco, por exemplo, recebeu R$ 130 milhões para serem divididos com os ônibus do Grande Recife e alguns sistemas municipais. O Metrô do Recife ficou com R$ 10 milhões.
Se o ano de 2022 foi ruim para a mobilidade urbana como um todo, foi infinitamente pior para o Metrô do Recife. O sistema definhou como nunca, diante da inércia do poder público: federal, estadual e municipais. O déficit de R$ 300 milhões do sistema só aumentou, enquanto a demanda de passageiros caíam na metade.
Futuro do Metrô do Recife é decidido. Sistema será concedido à iniciativa privada. Confira detalhes
O Metrô do Recife chegou ao fim de 2022 transportando menos de 200 mil, com intervalos desumanos de até 10 minutos mesmo nos horários de pico, quebras semanais e com um cemitério de trens velhos exposto nacionalmente pelo Sindicato dos Metroviários de Pernambuco (SindMetro).
Metrô do Recife: conheça o "cemitério dos trens" quebrados do sistema pernambucano
E ninguém fez nada. O governo federal, com acompanhamento técnico do governo de Pernambuco, chegou a elaborar uma proposta de concessão público para o sistema, mas sob pressão das Eleições 2022, a proposta foi engavetada pelo governo de Pernambuco - fundamental no processo.
Enquanto isso, o Metrô de Belo Horizonte, que também faz parte da CBTU, foi privatizado por R$ 25.755.111,00 e num lance único, quase no encerramento do ano de 2022.
Alguns dos equipamentos urbanos mais criticados pela população, e que geram transtorno administrativo-financeiro para o governo de Pernambuco, ganharam uma nova perspectiva em 2022 com o início, efetivo, da gestão privada.
No pacote de concessão pública estão os 26 terminais integrados de ônibus e metrô, e as 44 estações de BRT da Região Metropolitana do Recife (serão 46 quando as duas estações pendentes forem concluídas).
No fim de 2022, o Estado também deu início à concessão pública de 3.650 dos 7 mil abrigos e pontos de parada de ônibus do Grande Recife. Nesse caso, o modelo é uma concessão simples e, não, uma Parceria Pública Privada (PPP), como as realizadas com os terminais integrados de ônibus e estações de BRT. Nesse caso, não há contrapartida do Estado.
Depois de muitos anos de promessas, o governo de Pernambuco iniciou e quase finalizou o alargamento e urbanização de sete quilômetros da BR-232 na saída do Recife, na altura do bairro do Curado, Zona Oeste da capital. A obra, que custará R$ 100 milhões, tem previsão de ser concluída entre abril e maio de 2023.
O ano também foi bom para a malha rodoviária do Estado. O governador Paulo Câmara, que deixa o comando de Pernambuco após oito anos, elevou em 172% os investimentos em estradas e acessos rodoviários. Até o mês de outubro, tinha reservado e empenhado mais de R$ 2 bilhões, dos quais R$ 1,8 bilhão já tinham sido liquidados.
Pernambuco virou exemplo para o Brasil com a realização, em 2022, do julgamento da chamada Tragédia da Tamarineira, uma forte colisão provocada por um jovem que dirigia embriagado e em alta velocidade, na Zona Norte do Recife, em 2017.
O estudante João Victor Ribeiro de Oliveira, 29 anos, foi condenado a 29 anos, 4 meses e 24 dias de prisão em regime fechado por homicídio com dolo eventual e tentativa de homicídio, ambos qualificados.
Na colisão, ficaram feridos o advogado Miguel da Motta Silveira Filho e a filha dele, Marcela, à época com 5 anos. Marcela ficou com sequelas gravíssimas até hoje. E morreram a esposa do advogado, Maria Emília Guimarães, 38, o filho mais novo do casal, Miguel Neto, 3, e a babá Roseane Maria de Brito Souza, 23, que estava grávida.
Veja o momento em que o réu se desespera e pede perdão às vítimas: