Matéria atualizada no dia 13/6 com mais informações técnicas
A cidade que já carrega o peso de ter sido apontada por plataformas de georreferenciamento como a que tem o trânsito mais congestionado do Brasil e um dos piores do mundo, segue sem introduzir os chamados semáforos inteligentes, que poderiam promover melhorias na circulação, principalmente, dos grandes corredores viários da capital.
Os semáforos inteligentes são chamados assim porque são equipamentos que controlam em tempo real a abertura e o fechamento dos sinais, considerando o volume de tráfego de veículos em cada via e programando o tempo de verde e vermelho dos sinais de acordo com essa quantidade de carros. Para isso, usam sensores no solo que fazem a leitura em tempo real do tráfego.
E o reflexo disso é a sensação de que está cada dia mais difícil ir e vir no Recife, seja nas Zonas Norte, Sul ou Oeste da capital. Para potencializar essa sensação de que está tudo travado, a cidade que tem avançado na implantação de ciclofaixas esqueceu as Faixas Azuis dos ônibus e ainda sofre com uma frota de automóveis que continua crescendo anualmente depois do fim da pandemia de covid-19.
“Sinto que está mais difícil ir e vir. Sabemos que a quantidade de veículos interfere diretamente na circulação, mas os semáforos também impactam. O tempo de verde e vermelho dos sinais faz toda a diferença. Assim como a qualidade deles”, reclama o desenvolvedor de TI Cláudio Henrique Santos, que todos os dias sai de carro de Piedade, em Jaboatão dos Guararapes, para o Bairro do Recife, na área central da capital.
“Já tentei todos os caminhos. Desisti da Avenida Mascarenhas de Morais faz tempo. A melhor rota ainda é a Via Mangue, exatamente porque ela tem mais tempo semafórico. Depois, vem a Avenida Conselheiro Aguiar, um pouco mais beneficiada por causa da Faixa Azul. E, por último, a Avenida Boa Viagem”, recomenda.
Em março deste ano, a Prefeitura do Recife anunciou um investimento de R$ 30 milhões para ser gasto até o fim de 2023 em soluções para potencializar e dar confiabilidade ao sistema de semáforos da cidade, inclusive de olho no rigoroso inverno previsto para este ano.
Com os recursos, o município adquiriu 200 novos controladores semafóricos, equipamentos de onde se opera o funcionamento dos sinais de trânsito e que serão utilizados para os semáforos inteligentes, além de 200 novos nobreaks, que atuam como fonte auxiliar de energia.
Foi o maior investimento em tecnologia de engenharia de tráfego realizado no Recife até hoje e, como foi dito pelo próprio município, o start no processo dos semáforos inteligentes. Além disso, representou a triplicação do número de nobreaks na cidade, que atualmente conta com apenas 60.
Mas, até agora, os semáforos inteligentes não chegaram. O JC tentou conversar com algum representante da Prefeitura do Recife, especialmente da Autarquia de Trânsito e Transporte Urbano do Recife (CTTU), mas não conseguiu. O município optou por se posicionar, mais uma vez, via nota oficial.
Nela, a CTTU apenas repete o que já tinha divulgado em março. Diz que toda a rede semafórica do Recife terá a comunicação por cabos extinta, funcionando exclusivamente pela rede GPRS 4G, mas não dá prazos.
“Esse sistema proporcionará uma maior estabilidade na sincronização da rede, sendo possível à CTTU identificar, praticamente em tempo real, possíveis instabilidades. Com isso, a atuação remota para normalização dos equipamentos é facilitada”, afirma na nota.
A CTTU explica que a rede semafórica do Recife é composta por 709 equipamentos, dos quais 134 são considerados obsoletos (ainda de 1994). E que todos serão substituídos até o final de junho. Garantiu, ainda, que não existem dispositivos de funcionamento mecânico - os mais ultrapassados porque permitem apenas a programação fixa.
Sobre o impacto das chuvas na rede semafórica, a autarquia informou que a cidade registra uma média de 20 ocorrências diárias, que triplicam quando chove. Mas que, com os novos investimentos, a expectativa é de uma redução nos casos já no inverno deste ano.
“A modernização permitirá que a CTTU esteja conectada 24 horas por dia com os equipamentos e os técnicos sejam acionados automaticamente para as ocorrências que não puderem ser resolvidas de forma remota”, finalizou por nota.
Embora permitam a programação dos semáforos em tempo real, os controladores que estão sendo adquiridos pela Prefeitura do Recife não têm sensores para fazer a leitura do volume dos veículos. É o que explica uma fonte do setor ouvida pela reportagem.
A identificação da quantidade de carros é feita a partir da previsão comercializada pelo Google. Por isso, existe um delay que reduz a eficiência da solução. “Eles funcionam no modo adaptativo, mas não trabalham com o sensor de tráfego, que faz a leitura e ajusta o tempo do semáforo automaticamente. Esse delay pode dar uma informação que não é tão precisa quanto à repassada pelos sensores de fluxo”, explica.
“O fato de a solução utilizada no Recife não possuir sensores faz com que a informação, além de chegar com retardo, não seja precisa como a repassada pelo sensor. Veja um exemplo: se não tiver carros numa via transversal, o sensor é capaz de dar essa informação em tempo real, possibilitando que o controlador interrompa o tempo de verde ou até prolongue o tempo de acordo com a necessidade. Já o sistema sem sensores não é capaz de fazer isso, pois a informação que ele recebe não é precisa e nem instantânea”, segue explicando.
Segundo o mesmo especialista, os sensores de tráfego no pavimento já estão obsoletos, antes mesmo de o Recife pensar em utilizá-los. Atualmente, o volume de veículos é detectado por câmeras (veja foto como exemplo nesta reportagem).
O custo de incluir esses sensores de tráfego seria na ordem de R$ 50 mil por cruzamento.
O engenheiro Stênio Cuentro, presidente da Associação Brasileira de Engenheiros Civis (Abenc) e conselheiro do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-PE), alerta que a capital pernambucana precisa, urgentemente, avançar na modernização semafórica.
Stênio Cuentro lembra que o prefeito do Recife João Campos (PSB) precisa repetir a coragem que demonstrou ao ampliar a malha de ciclofaixas e de Faixas Azuis da cidade, além do investimento de R$ 6 milhões na Ciclovia da Agamenon Magalhães.
“Estamos no caminho certo e já começamos a ver esses investimentos nas ruas da cidade. Mas há pelo menos 12 anos falamos da importância disso. Tecnologia para modernizar e tornar a rede semafórica mais eficiente não falta. Agora, é apenas decisão política”, diz.