Dias atrás escrevi sobre a Shein e como essa marca chinesa de moda se tornou a que mais cresce no mundo. Gigantes como Nike, Adidas, Zara e H&M aparecem atrás da Shein em pesquisas de interesse na web. O app da empresa, inclusive, chegou a liderar as lojas de apps dos Estados Unidos, à frente até da gigante Amazon.
Comentei ainda sobre a origem da empresa e algumas das estratégias que ela explora para vender para as jovens no mundo todo. Mas, provavelmente, o grande “segredo” são os preços imbatíveis da marca.
Mas a indústria da moda é um dos mercados mais competitivos do mundo. Conquistar uma posição de destaque, e com preços ainda menores que gigantes multinacionais de fast fashion (a moda barata) como Zara, H&M, C&A e até mesmo a brasileira Renner, é uma tarefa quase impossível.
Então como a Shein consegue? Ao navegar na área de Responsabilidade Social do site da marca, há parágrafos inteiros sobre a eficiência do uso de tecido, dos armazéns e até da reciclagem (todas atividades que otimizam custos, vale lembrar). Mas não há nada, por exemplo, sobre onde as peças vendidas pela empresa são produzidas.
Trabalho escravo, o motor da moda global
“Todos os nossos escritórios e fábricas parceiras devem cumprir nossos padrões, bem como as leis ambientais locais”, afirmam no site. Porém, não há menção sobre quais seriam esses padrões, se a Shein segue leis trabalhistas ou impõe qualquer condição de trabalho nas fábricas terceirizadas. Poderia ser somente um lapso no site da empresa ou apenas uma maneira de defender sua cadeia de produção dos concorrentes?
Segundo o City.AM, publicação de negócios baseada em Londres, “O Fashion Transparency Index, compilado pelos ativistas do Fashion Revolution, deu a Shein uma pontuação geral de 1 em 100 em um relatório compilado no início deste ano. Em rastreabilidade, uma das principais métricas do Índice, a Shein marcou zero”.
A Good on You, um diretório de moda que também avalia as principais marcas da moda, é igualmente condenatório. A avaliação sobre trabalho e meio-ambiente da Shein é "muito ruim".
“Não há evidências de que haja iniciativas de empoderamento do trabalhador, como negociação coletiva ou direito de reclamar. Sua fase final de produção é proveniente de países com risco extremo de abuso de mão de obra. Não há evidências de que garanta o pagamento de um salário mínimo em sua cadeia de abastecimento. Ela audita parte de sua cadeia de suprimentos, mas não especifica qual porcentagem ”, afirma o sumário da Good on You.
Shein, Nike, Apple e os uigures
Nos anos 80, a Nike saltou na frente dos concorrentes ao levar sua produção para a China e reduzir drasticamente seus custos. O problema, descobriu-se anos depois, é que as condições de trabalho de muitas das fábricas chinesas que produziam para a Nike eram análogas à escravidão.
Ano passado, a Nike, assim como outras multinacionais americanas, incluindo a Coca-Cola e a Apple, estariam entre as principais empresas que faziam lobby no Congresso americano para derrubar um projeto de lei que proíbe produtos importados feitos com trabalho forçado da região de Xinjiang, na China, de serem comercializados nos Estados Unidos.
Xinjiang seria um polo de produção de bens feitos com trabalho forçado de minorias muçulmanas perseguidas na China, os uigures. O governo chinês nega a acusação.
O Center for Global Policy estima que cerca de meio milhão de residentes da minoria étnica na região foram coagidos a colher algodão. No ano passado, uma coalizão de grupos de direitos humanos disse que "virtualmente toda a indústria de vestimentas [global] está contaminada pelo trabalho forçado de uigures e muçulmanos turcos".
A BBC estima que cerca de 85 por cento do algodão chinês e 20 por cento do algodão global são cultivados lá.
Os preços das peças da Shein realmente são incríveis. A questão é: a que custo?