Fernanda Young sempre foi amiga de Maria Ribeiro. Primeiro, sem nem mesmo a autora saber. Amizade surgiu a partir da identificação de pautas que Fernanda levantava em debates e personagens de ficção. Mas, além da inspiração, essa relação das duas realmente veio se entrelaçar a partir da montagem da peça "Pós-F", inspirada no livro homônimo da autora que foi vencedor do Prêmio Jabuti 2019, na categoria "Crônica". Antes de receber o prêmio e realizar o espetáculo, Fernanda Young faleceu naquele mesmo ano, mas o seu legado e filosofia permaneceram. Com direção de Mika Lins, "Pós-F" foi apresentada de maneira virtual, com plateia vazia, e agora chega ao Recife no palco do Teatro Santa de Isabel, nestes sábado (19) e domingo (20).
Em seu primeiro monólogo, Maria Ribeiro interpreta Fernanda Young na sua autobiografia, apontando para o público do teatro as visões da autora do feminino e masculino. Mas, sobretudo, sobre o feminismo. É Justamente este tema que foi a primeira conexão entre a atriz e a dramaturga. "Fernanda sempre foi muito importante para mim. Ela foi daquela primeira geração do Saia Justa, foi quando o programa fez sentido para mim. Ninguém falava sobre feminismo naquela época, e Fernanda sempre foi muito autêntica e corajosa. Ela é a com quem mais me identificava e mais aprendia. Ela foi minha amiga durante muito tempo sem ela mesma saber", conta Maria Ribeiro, em entrevista ao JC.
O contato realmente aconteceu com o livro "Pós-F, para além do masculino e do feminino", que inspirou Maria a entrar em contato com Young para realizar a peça. "Quando eu li o 'Pós-F', fiquei apaixonada pelo texto e consegui o WhatsApp dela. Falei para ela que queria montar um monólogo, que eu achava o texto incrível e achava corajoso. Que era incrível que uma mulher no meio do caminho, com 47 anos, fazer uma autobiografia que era o 'Pós-F', falando de feminismo de uma maneira muito franca e corajosa, sem tanta preocupação com o que pegava bem, num momento que estava tudo bacana e muito higiênico. E aí ela ficou muito feliz e empolgada em fazer parte do projeto. Primeiro ela quis dirigir e depois quis atuar junto comigo. E ficamos amigas por causa do projeto", revela Ribeiro.
Quando estavam prestes a ensaiar o projeto, Fernanda Young faleceu em agosto de 2019. Um pouco depois, ganhou o Jabuti póstumo. O espetáculo estreou em setembro de 2020, 12 de setembro de 2020, marcando a retomada das atividades culturais do Teatro Porto Seguro, reunindo mais de 8 mil pessoas em apenas oito apresentações frente a um palco virtual. A peça tem direção de Mika Lins e iluminação de Caetano Vilela, trazendo uma linguagem contemporânea e poética para o palco.
"Ela foi feita para o online, mas a essência era a mesma do teatro, que era contar histórias e se comunicar. A gente fez uma adaptação, eu, a Mika Lins e o Caetano Vilela - que faz a iluminação. Foi num teatro vazio, foi muito doido, porque eu nunca tinha feito um monólogo e ainda mais num teatro vazio. Foi muito forte, fomos vistos por mais de 10 mil pessoas na época. Nunca pensei que o teatro me desse um retorno tão bonito", aponta Maria.
Espetáculo
A peça chega em um momento oportuno para o feminismo, segundo Maria Ribeiro, e aponta visões muito corajosas para o movimento. "Eu acho que a gente está vivendo um momento importantíssimo para o feminismo, a quarta onda está muito forte e espero que seja definitiva. Temos muito caminho ainda, mas antigamente tínhamos medo em dizer em que éramos feministas, falavam que o movimento era contra os homens, mas só queremos igualdade. Então a peça vem dizer que somos feministas, mas também somos machistas, porque somos frutos do nosso tempo. A gente está sujeito a contradições. Eu acho que a Fernanda fazia isso lindamente e não só falar 'ah, eu sou bacana, não tenho'. Não, a gente ainda erra, porque podemos ser machistas na criação de nossos filhos e em outras situações", conta Maria Ribeiro.
É nessa possibilidade do erro e do contraditório que a peça chega ao Recife, levantando questões sobre o que é ser mulher e o homem, em contato com o público. Maria "Está sendo muito emocionante. Os artistas estavam com saudade do público e o público com saudade dos artistas. Está sendo muito bonito voltar a ver teatro, ver show e ir ao cinema. Nós fomos muito maltratados, não só pela pandemia, mas também pelo governo. Os artistas estão sendo colocados num lugar de aproveitadores de incentivos fiscais. É um estigma que colou na gente através do Bolsonaro de uma forma muito triste. Está sendo muito importante ter essa conexão com o público e demonstrar que a arte é um item essencial", afirma a atriz.
A montagem acontece em duas sessões neste fim de semana, no Teatro de Santa Isabel. Um no sábado, às 20h, e outra no domingo, às 18h.
Serviço:
Pós-F
Dias 19 e 20 de março de 2022
Teatro Santa Isabel (400 lugares)
Praça da República, 233 – Recife / PE
Telefone: (81) 3355-3323
Vendas: https://bileto.sympla.com.br/event/71757/d/128558
SÁBADO, ÀS 20h, E DOMINGO, ÀS 18h
Ingressos: R$ 80
Duração: 50 minutos
Recomendação: 14 anos